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RS que é Exemplo 

"Cavalos mecânicos" substituem veículos de tração animal na coleta de lixo em Tapes

Trabalhadores de cooperativa receberam em setembro da prefeitura micro tratores adaptados

24/10/2022 - 09h04min

Atualizada em: 24/10/2022 - 09h06min


Isabella Sander
Isabella Sander
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Lauro Alves / Agencia RBS

Impasse há anos em muitos municípios gaúchos, o uso de veículos de tração animal para a coleta de lixo chegou ao fim em Tapes, no sul do Estado. A solução para retirar as carroças de circulação se deu com a compra, pela prefeitura, de 18 “cavalos mecânicos” — micro-tratores, normalmente usados na agricultura, adaptados com reboques. 

A ideia vinha sendo alimentada pelo atual prefeito, Luiz Carlos Coutinho Garcez, há mais de 10 anos. Nas eleições de 2012, chegou a lançar essa proposta em seu plano de governo, mas não venceu a disputa. De volta à prefeitura para um terceiro mandato (o primeiro foi nos anos 1990 e o segundo nos anos 2000), conseguiu pôr em prática. 

— Como a nossa cidade é plana, não precisamos de um trator de grande porte para esse trabalho, então compramos esses. Felizmente está agradando a todos. Foi uma saída salomônica: resolvemos o problema da sujeira dos animais nas ruas, os maus tratos deixaram de existir e o trabalho do pessoal da cooperativa continuou — relata Garcez.

Os recicladores contemplados fazem parte da Cooperativa Mista de Carroceiros e Recicladores de Tapes (Coopercare), que atua por meio de convênio com a prefeitura desde 2008 na coleta de lixo da área urbana da cidade. Segundo o presidente da entidade, Flávio Luiz Ribeiro Ferreira, a mudança reduziu o custo e o tempo gastos com manutenção. 

— Com o cavalo, a gente levantava às 6h para pegar às 7h30min para trabalhar, porque tinha que ir lá no campo buscar o animal. Com o tratorzinho melhorou pra gente, porque a gente só se levanta de manhã, pega o tratorzinho e sai trabalhando. Fora a economia. Com o cavalo, a gente gastava o dobro — destaca o presidente. 

A estimativa de Ferreira é de que o gasto com o animal, que envolvia alimentos e ferraduras, por exemplo, era de cerca de R$ 400 por mês. Com o cavalo mecânico, basta o diesel e uma eventual troca de pneus, com custo que gira em torno de R$ 120 mensais. A troca gera a expectativa, entre os cooperativados, de que o lucro seja maior. 

A economia é ressaltada também por Robison da Silva, que trabalha há nove anos na coleta e faz a supervisão dos recicladores: 

— Gostei. Cavalo eu não quero mais, Deus o livre. A gente gastava bastante com o cavalo. Para cuidar do cavalo em dia de chuva, é tudo ruim. 

Com a mudança, 36 cavalos foram aposentados. A prefeitura não requisitou a entrega dos animais, como já foi feito em outros municípios — muitos dos recicladores os venderam ou os levaram para propriedades rurais. O investimento municipal foi de aproximadamente R$ 200 mil, entre a compra dos tratores e dos reboques. Dois veículos foram adquiridos no ano passado, para serem testados, e os outros 16 foram entregues em setembro deste ano. Também foi feita uma capacitação com os 18 trabalhadores que fazem a coleta para dirigir os veículos. 

— Houve uma autoescola, demos a orientação. Com cada um que ganhou o tratorzinho, ia alguém que já sabia usar, para eles irem se adaptando, porque eles têm rotas fixas. Todos se adaptaram muito bem — comenta o cooperativado. 

Uma das recicladoras é Luciara Ribeiro Ferreira, que já vendeu um de seus cavalos e pôs o outro também à venda. Considera que a substituição pelas tobatas, como também são conhecidos esses micro-tratores, deve ajudar as 34 famílias que trabalham na cooperativa a melhorarem de vida. 

— Está sendo muito bom, a gente já se adaptou bastante. É melhor para se locomover e é mais rápido. A tendência é só melhorar — comemora Luciara. 

Organizada, a trabalhadora possui um grupo de WhatsApp com moradores da região da cidade em que faz a coleta. O grupo é usado para avisar, em caso de algum imprevisto, e também para pedir que eles recolham em um saco materiais como grama e galho, depois da poda — os recicladores recebem um valor extra da prefeitura para fazer esse serviço. 

— Quando tem lugar suficiente na caçamba, faço toda a minha rota, passo de volta e pego os sacos com as podas. Se é grama, já enrolo ou coloco numa bag. A gente se comunica bastante, eu e os moradores. São umas pessoas bem boas, bem queridas — conta a recicladora, lembrando que, no primeiro dia em que saiu com o trator, demorou a voltar para a cooperativa, pois todos a paravam para ver de perto como era o veículo. 

Beleza e limpeza 

Com uma população de cerca de 17 mil habitantes, Tapes tem o tamanho perfeito para o uso dos cavalos mecânicos na área urbana — na rural, são utilizados caminhões da prefeitura. No entanto, cidades maiores, como Montenegro, já teriam buscado informações com o município para saber se a implementação seria possível em outras realidades. No entendimento do prefeito de Tapes, em cidades de porte médio ainda seria viável o uso do veículo. 

— Uma cidade de grande porte teria seus problemas, mas em uma de médio porte, principalmente nas vilas, isso é interessante. Em uma cidade com declive, talvez fosse necessário colocar um trator com mais força. Foi uma feliz ideia. Em uma cidade pequena e com poucos recursos, temos que ser criativos — comenta Garcez. 

Quem comanda a implementação da mudança é o secretário de Meio Ambiente, Eliézer Munhoz. O gestor salienta que a possibilidade é debatida há anos com os recicladores e veio como parte de um projeto para gerar renda para os catadores. 

— Desde 2008, quando a cooperativa foi fundada, a ideia sempre foi trazer renda para o pessoal das carroças e os recicladores, e isso tem acontecido cada vez mais. Agora, o projeto continua, para estabelecer na comunidade esse senso ambiental, de separar o lixo e cuidar dos animais — pontua o secretário. 

O próximo passo deve ser dado no ano que vem: implementar a coleta seletiva em Tapes. Para isso, a prefeitura já tem, com os tratores, a infraestrutura necessária. O que falta é um trabalho de conscientização da população, que está sendo iniciado nas escolas. 

— Vemos que os alunos estão educando os pais. Eles veem na escola como deve ser feito e depois cobram que o mesmo seja feito em casa. É um processo ostensivo para disciplinar a população — afirma Garcez. 

Além do fim do uso de veículos de tração animal e da implementação da coleta seletiva, o município tem criado hortas comunitárias em comunidades que demonstram interesse em ter um espaço como esse, e premiações para quem cuida de seus jardins e os mantém limpos. 

— Quando entramos em uma cidade com jardins bem cuidados, é outro visual. É comum irmos para a Serra e ficarmos maravilhados com a beleza de cidades como Nova Petrópolis, Gramado, Canela. Por que não fazer o mesmo aqui? — questiona o prefeito. 

Os cavalos mecânicos foram adquiridos através de recursos provenientes do Fundo Municipal de Proteção ao Meio Ambiente e com verbas próprias da prefeitura. 


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