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123 anos de pena 

Filha, genro e ex-mulher são condenados por assassinatos de agricultor e de peão no Vale do Rio Pardo

Calinca Maria Lopes de Souza, 26 anos, a mãe dela, Hulda Maria Lopes de Souza, 43, e João Ricardo Prestes, 29, foram sentenciados na madrugada desta terça-feira

27/09/2023 - 14h05min


Leticia Mendes
MP-RS / Divulgação
Júri foi presidido pela magistrada Camila Oliveira Maciel Martins (ao centro)

Após mais de 18 horas de julgamento, três réus foram condenados na madrugada desta terça-feira (26) por dois assassinatos que ocorreram em maio de 2020 no Vale do Rio Pardo. O agricultor José Darício de Souza, 43 anos, e o peão da propriedade dele Mazonde Rodrigues de Nepomuceno, 64, foram mortos a tiros no município de Segredo.

Foram sentenciados a filha do produtor, Calinca Maria Lopes de Souza, 26 anos, a ex-mulher dele, Hulda Maria Lopes de Souza, 43, e o genro João Ricardo Prestes, 29. Somadas, as penas chegam a 123 anos.

Por volta das 4h, a sentença foi lida pela juíza Camila Oliveira Maciel Martins. Calinca foi condenada a 45 anos de prisão, a mãe dela, Hulda, foi sentenciada a 43 anos de reclusão — as duas pelos dois homicídios qualificados. Já João Ricardo teve pena estabelecida em 35 anos e seis meses, pelos homicídios qualificados e também por furto qualificado. Os três já estavam presos pelo crime, sendo mantida a prisão e o regime inicial fechado.

Da pena recebida por Calinca, 25 anos foram pelo assassinato do pai e 20 pela morte de Mazonde.

"Calinca articulou previamente toda a empreitada criminosa, contratando um executor, levando-o ao local do fato e o auxiliando para a morte cruel de seu próprio pai", detalhou a juíza na sentença, ao justificar o tempo de condenação.

No caso de Hulda, além da contratação do executor, foi apontado que ela emprestou o próprio veículo para deslocamento durante o crime e a fuga dos outros réus. Ela recebeu 23 anos pela morte do ex-marido e 20 anos pelo assassinato do peão.

Em relação a João Ricardo, a juíza considerou que ele "retirou a vida de seu próprio sogro, conduzindo o veículo automotor que levou os corréus ao local e, inclusive alcançando a corda e amarrando a segunda vítima para sua execução".

O réu foi condenado a 15 anos pela morte do sogro e a 18 anos pelo assassinato do peão, que auxiliou a amarrar. Ele foi condenado ainda a dois anos e seis meses por furtos de objetos, como uma televisão e um celular.

O julgamento 

O júri teve início por volta das 9h30min da segunda-feira (25), no Fórum de Sobradinho, também no Vale do Rio Pardo, com o sorteio dos sete jurados. Três homens e quatro mulheres formaram o Conselho de Sentença.

Logo depois, foi dado início aos depoimentos das testemunhas. No total, estavam previstas nove para serem ouvidas, mas houve desistência por parte das defesas, e somente quatro falaram no plenário.

Pela acusação, a delegada da Polícia Civil Graciela Foresti Chagas e outro policial detalharam como se deu a investigação do caso. Quando José Darício e Mazonde foram mortos, a suspeita inicial era de que eles pudessem ter sido vítimas de um latrocínio (roubo com morte), mas o comportamento da filha fez a polícia suspeitar da situação.

Calinca acabou confessando que havia planejado a morte do pai. Ela, o marido e a mãe acabaram presos durante a apuração do crime, além de um homem que teria sido levado até a propriedade para executar as vítimas. Dois familiares foram ouvidos como testemunhas de defesa.

Filha confessa crime 

Os três réus foram interrogados durante o julgamento e apresentaram suas versões. Calinca confessou ter planejado o crime, mas apresentou outra versão sobre a motivação. A ré alegou que sofreu abusos sexuais entre a infância e a adolescência por parte do pai e que isso teria levado a planejar a morte dele. Não há registro policial desses episódios alegados pela filha em relação ao pai.

— Dali para a frente, ela conviveu com esse trauma, esse ódio com relação ao pai. Quando estava acontecendo o divórcio, a separação, o pai vinha ameaçando não entregar parte do patrimônio que seria delas, parte dos frutos da plantação também. Ela deu a entender que com a morte do pai esperava conseguir se vingar dos abusos. Contudo, agravou mais ainda a situação dela. Até então, ela não tinha revelado a verdadeira motivação e também não tinha confessado o crime na íntegra. Ela esclareceu a participação de todos os acusados — afirmou um dos advogados de defesa de Calinca, José Felipe Lucca.

Sobre a participação dos demais, Calinca alegou que a mãe não teve envolvimento no planejamento e na execução do crime. Hulda também negou que tenha ajudado a arquitetar o plano.

Já sobre João Ricardo, a ré alegou que o ex-companheiro sabia do planejamento desde o início e que foi o responsável por fazer o contato com o homem contratado para executar as vítimas. Quando interrogado, João Ricardo confessou que ajudou a amarrar Mazonde. 

Calinca apontou ainda que além de um quarto réu, que será julgado em novembro, outro homem teria participado do crime. Ela não soube apontar, no entanto, quem seria essa pessoa. 

Debates

MP-RS / Divulgação
Promotor Renan Loss e promotor Eugênio Amorim foram responsáveis pela acusação

As versões dos réus foram rebatidas pelo Ministério Público durante a fase dos debates. A acusação alegou que o agricultor não era violento, como foi apontado pelas rés.

— Elas mentiram, mãe e filha. A filha, por exemplo, mudou a versão algumas vezes desde o inquérito policial. Tentaram dizer que ele abusou da filha e que batia na ex-mulher — disse o promotor de Justiça Renan Loss, primeiro a falar nessa etapa do júri, que teve início no começo da noite.

O promotor Eugênio Amorim, segundo a apresentar os argumentos do MP, enfatizou que Mazonde também foi vítima do crime. Ressaltou ter visto a filha e a mulher do peão chorarem. 

— Aquele homem que trabalhava de sol a sol, para sustentar o seu filho, a sua filha. Essa que chora de verdade aqui, que chora pela perda definitiva — afirmou Amorim.

O promotor pediu pena máxima aos réus e lembrou de um post realizado pela ré após a morte do pai. Em 27 de maio, às 18h05min, Calinca publicou no Facebook a mensagem: "Descanse em paz meu amor que deus te receba de braços abertos pai .... Luto eterno...". Na postagem, ainda havia uma foto de José Darício assassinado a tiros na noite anterior.

— Tem como acreditar em uma pessoa que publicou nas suas redes, logo após o crime, que seu paizinho estava no céu, ela que admitiu aqui que pagou para matar o mesmo pai? —  indagou aos jurados.

Novo júri

Está agendado para 20 de novembro, às 9h, também em Sobradinho, o julgamento de um quarto réu. O homem é apontado como matador contratado para executar as vítimas.

Contrapontos

O que diz a defesa de Calinca Maria Lopes de Souza

O advogado José Felipe Lucca, um dos responsáveis pela defesa, afirmou que avaliará junto com a cliente se vão ingressar com recurso em relação ao resultado. 

O que diz a defesa de João Ricardo Prestes

O advogado Maurício Batista da Silva enviou posicionamento no qual afirma que a decisão é contrária às provas apresentadas e que a defesa pretende recorrer da decisão. Confira:

"A decisão é manifestamente contrária à prova dos autos e a defesa irá apelar, visando a cassação do veredito perante o TJRS e, subsidiariamente, a readequação da pena porquanto excessiva. A defesa do João, o réu que teve a menor pena, ainda irá discutir a pena base aplicada. Ao demais, só agradecer aos jurados, promotores e colegas advogados que estiveram presentes na sessão plenária."

O que diz a defesa de Hulda Maria Lopes de Souza

GZH entrou em contato com o advogado Michel França da Silva e aguarda manifestação. 


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