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Crítico e ácido

Gregório Duvivier fala sobre governo Bolsonaro: "Os velhos corruptos a gente já conhece"  

Em entrevista a GaúchaZH, comediante antecipa detalhes do episódio especial de "Greg News", que vai ao ar na sexta-feira, e disse que novos ministros são um "manancial infinito de piadas"

13/12/2018 - 07h18min


HBO / Divulgação
Episódio especial de "Greg News" vai ao ar às 22h da próxima sexta-feira (14)

A crítica ácida de Gregório Duvivier retorna nesta sexta-feira (14) à televisão para o especial de fim de ano de Greg News, programa a la late-night show que mistura humor e política. Em sua volta, o comediante abordará as perspectivas para o cenário brasileiro no próximo ano, quando terá início o governo Bolsonaro e, para isso, não dispensará piadas e irreverência. 

O episódio inédito de Greg News vai ao ar às 22h no HBO, e também será disponibilizado na íntegra no canal do YouTube da HBO Brasil. A emissora já anunciou que o programa foi renovado para uma terceira temporada, com estreia prevista para 2019. 

Em entrevista exclusiva a GaúchaZH, Duvivier contou um pouco sobre o episódio especial, falou sobre suas expectativas em relação ao governo Bolsonaro e à cultura no Brasil e definiu a nova safra de ministros como um "manancial infinito de piadas". 

No especial de fim de ano, você vai falar sobre o novo governo que começa em 2019. O que você pode adiantar sobre esse programa? Será um episódio focado no presidente eleito Jair Bolsonaro?
Exatamente. A ideia é falar desse presidente eleito aí, desse novo governo que já está se formando, e não só fazer um prognóstico do ano que vem, mas, também, entender quem são eles. O que a gente já pode deduzir que vai acontecer, sem ser muito catastrofista, sendo realista mesmo? O que é que a gente já tem hoje, de fato? Não só sobre o presidente eleito, mas também sobre aqueles que foram eleitos junto dele, e mapear um pouco quem são essas pessoas e quais são os seus setores. 

Tem, por exemplo, o setor militar, a que as pessoas dão muita atenção, mas não é o único. Tem o setor evangélico, fundamentalista, a que também dão muita atenção. E tem a família Bolsonaro, se estendendo a todos aí que têm o sobrenome Bolsonaro, como o deputado do Rio que é o filhote do Bolsonaro, o Hélio Negão ou Hélio Bolsonaro, e a família dele. Então, a gente quer dar uma mapeada nesse caos que é o PSL, que nem eles entendem direito quem é que tá mandando ali

Você é impedido de fazer um programa de humor político ao mesmo tempo em que o Bolsonaro não é impedido de faltar ao debate.

GREGÓRIO DUVIVIER

Comediante

A gente resolveu chafurdar esse universo pra tentar mapear esse que é um universo muito novo pra gente. Os velhos corruptos a gente já conhece. O Jucá (Romero), o Renan (Calheiros), o Eduardo Cunha, a gente já conhece bem o perfil deles. Os novos, a gente ainda não conhece bem. Onyx (Lorenzoni), Damares (Alves), Ernesto Araújo são pessoas muito novas no universo brasileiro, então (no episódio), é analisando essa nova temporada aí, que tá vindo com tudo, com grandes personagens, prometendo muito vexame pra todo o Brasil.

Da última temporada para cá, muita coisa que estava indefinida na política se definiu a partir da eleição. Como essas definições impactam o programa?
É isso o que a gente tá falando agora nesse episódio de final de ano. Desde as eleições, já se concretizaram algumas coisas que antes eram só especulações. Antes, falavam "Ah, ele vai fazer um governo tão corrupto quanto antes", mas eram só vaticínios. Hoje, a gente já tem motivos de sobra para criticar o governo sem ser necessariamente chauvinista ou pessimista, pois ele já nos deu material antes de "nascer". É um governo que já está se expondo prematuramente. Nem nasceu, tá dentro da barriga ainda, e tá passando vergonha.

E tá todo mundo perguntando "cadê o programa?", porque tá muito necessário, e eu acho que tá mesmo. O humor que não muda nada, esse programa não tem a pretensão de mudar nada nem a cabeça de ninguém nem governo nenhum nem pressionar. Não é isso o que a gente faz. Mas ele tem a missão, sim, de fazer a gente rir um pouco do absurdo que nos cerca. E tem muito material, realmente. Uma coisa é certa, tem muito material cômico. 

A comédia, ao contrário do que muita gente pensa, não é incompatível com a reflexão.

GREGÓRIO DUVIVIER

Comediante

Falando da eleição, ela já atingiu Greg News antes, durante a campanha, quando a transmissão da série foi vetada pela Lei Eleitoral por tocar diretamente na pauta política. Você se sentiu censurado quando isso aconteceu?
É muito complicada a Lei Eleitoral no Brasil. É uma lei que impede você de fazer um programa de humor político durante as eleições, mas não impede um candidato de praticar caixa 2 para disparar milhões de mensagens por WhatsApp. O mesmo TSE que permite uma coisa, impede a outra. A Lei Eleitoral favorece muito as práticas corruptas, tanto que impede muito o debate. Então, você é impedido de fazer um programa de humor político ao mesmo tempo em que o Bolsonaro não é impedido de faltar ao debate. É uma lei que privilegia, na verdade, a ausência de debate, ao invés de incentivá-lo. Acho que a Lei Eleitoral, pra mim, devia obrigar as pessoas a falar de política, obrigar o Bolsonaro a ir ao debate, devia incentivar o debate, não inibi-lo. E acho que é isso o que a Lei Eleitoral faz um pouco no Brasil. 

Greg News é um programa de humor que fala de assuntos sérios. Existe um limite até onde esses dois elementos se atravessam, uma dosagem entre comédia e debate?
A comédia, ao contrário do que muita gente pensa, não é incompatível com a reflexão. Muito pelo contrário, ela fica ainda mais engraçada quando é combinada com o pensamento crítico. Eu acho que a piada  ajuda a pensar, ela torna as coisas mais claras. E eu acho isso muito bom. Através do humor, a gente consegue entender um pouquinho melhor o mundo, eu acredito nisso. A gente consegue ler melhor, é uma espécie de óculos de seleção pra enxergar o mundo. 

Eu acho que eu entendo muito através de humoristas. Foram eles que me ajudaram a entender o mundo. Desde Monty Python, nos Estados Unidos, até, hoje em dia, o Jon Stewart e o John Oliver e, no Brasil, Millôr Fernandes, Pedro Cardoso, Fernanda Torres, Luis Fernando Verissimo. Eu aprendi muito a enxergar a realidade através do humor. Quando eu digo o Verissimo, a parte do jornal que eu corria pra ler era o Verissimo, e foi a partir dele que eu comecei a me interessar pela política, pela realidade, pela sociedade. Eu devo muito aos humoristas e, pra mim, um pouco, é tarefa do humor entregar uma leitura do mundo que não seja sisuda nem pretensiosa nem arrogante, mas que comunique até com aquele tá no outro campo e que não se interessa pelo seu campo. 

A cultura sempre foi considerada uma esmola, supérflua, e não a centralidade da construção de um país.

GREGÓRIO DUVIVIER

Comediante

Com a decisão do novo governo de extinguir o Ministério da Cultura, qual é a sua expectativa em relação a essa área?
Eu acho uma pena que não entendam até agora que a cultura é um setor estratégico. Entendem a cultura como esmola, assim como entendem o meio ambiente como uma chatice, como uma coisa ideológica, "coisa de esquerda se preocupar com o meio ambiente". Acho que é parecido nesse sentido, pois tanto a cultura quanto o ambiente são coisas vitais. Um país sem cultura, um país que não lê, que não se entende, ele vai continuar pra sempre vendendo commodity, vendendo soja, banana, a preço de banana, com o perdão da redundância. É a cultura que conseguiria nos tirar dessa escravidão do extrativismo. 

A cultura sempre foi considerada uma esmola, supérflua, e não a centralidade da construção de um país. É a cultura que nos une como país. Sem cultura, nós somos um bando de animais cercados, como um rebanho. É a cultura que nos faz ler, e nos lê, e faz de nós um ambiente coeso, com um projeto comum. Infelizmente, é isso o que nos falta, um projeto comum. E ele se construiria com uma política cultural. 

Certamente, não é algo que o Osmar Terra vai resolver. O Osmar Terra, vamos lembrar, entre muitas vergonhas, foi aquele que passou vergonha no Uruguai, tentando convencê-los a não legalizar a maconha. O que ele fez foi exportar o vexame pra fora do Brasil e virou piada mundial e não só brasileira, como ele já era. Ele será o nosso ministro da Cultura, entre outras coisas (Osmar Terra foi nomeado ministro da Cidadania, que engloba pasta da Cultura). Perguntado sobre o que entendia de cultura, ele disse que tocava berimbau, obviamente fazendo uma piada, já que certamente não toca, e não sabendo que é instrumento difícil a beça de tocar. Então, já mostrou que ele não entende nada, nada, nada. 

Mas é isso o que têm em comum todos os ministros do Bolsonaro, né. Nenhum deles é especialista ou entende realmente daquilo que faz. Nenhum. São ou indicações do centrão fisiológico, como Osmar Terra, ou são indicações do Olavo de Carvalho, que não entende nada de coisa nenhuma. Ernesto Araújo, nosso ministro das Relações Exteriores, falou que a Revolução Francesa foi influenciada pelo marxismo, tendo Marx nascido pelo menos uns 30 anos depois da Revolução Francesa. Então, esse é o nosso ministro das Relações Exteriores, é o intelectual do governo. O que tem em comum em todos os ministros é que eles não sabem do que estão falando. Mas a sorte é que eu trabalho com humor e eles são um manancial infinito de piadas.

Você sempre grava o programa na semana em que vai ao ar. Isso acelera a dinâmica de trabalho? Como você faz para analisar as pautas com profundidade em tão pouco tempo?
A gente grava na semana, mas, na verdade, a gente tem três semanas de script. Desde o resultado das eleições, a gente já vinha escrevendo o programa. E a gente tem uma equipe muito grande também, uma equipe muito boa, com jornalistas muito experientes e sérios. 

Não existe democracia sem jornalismo, sem investigação, sem apuração de fatos.

GREGÓRIO DUVIVIER

Comediante

A gente ainda acredita no jornalismo, é o que nos une a todos. A gente acredita em fatos, em pesquisa. Não é um programa de opiniões e piadas só. Claro, tem piada, mas o fundamental com o que a gente trabalha, nossa matéria-prima é o fato, e pra isso a gente tem pesquisadores, jornalistas, e acompanha veículos que a gente gosta, como a Piauí, a Folha (de S.Paulo), El País, o Globo, Estadão, nos jornais, porque a gente acredita nos jornalistas, sobretudo, e acredita que ainda faz sentido apurar, cobrir, pesquisar, entrevistar. A gente ainda acredita nessas ferramentas e que não existe democracia sem jornalismo, sem investigação, sem apuração de fatos, publicações e liberdade de expressão. 


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