Entretenimento



Entrevista

Alessandra Negrini sobre a chegada aos 50 anos: "Me sinto mais feliz do que era antes"

Mais segura de si e de suas escolhas, a atriz prepara novos projetos e pede mais espaço para as histórias de mulheres maduras na TV: “Temos um longo caminho pela frente”

25/06/2021 - 08h58min


William Mansque
Enviar E-mail
Pablo Saborido / Divulgação
Repleta de projetos na vida profissional, Alessandra Negrini vive sua melhor fase: segura de si e de suas escolhas

Aos 50 anos, Alessandra Negrini nunca esteve tão bem consigo mesma quanto agora. Ela garante: sente-se mais feliz do que era antes. Aliás, quando a atriz completou cinco décadas de vida, em agosto de 2020, sua idade pegou alguns internautas de surpresa, mas ela não gostou da repercussão. Alessandra observa que existe um preconceito grande nas entrelinhas. Que peso é esse que sua idade tem? Ela prefere viver o agora, com mais responsabilidade em suas escolhas. O que se estende para a profissão: a atriz percebe uma mudança ao espaço dado a mulheres de diferentes idades na TV e no cinema:

— Com o tempo, você fica com mais poder para decidir o que quer, para bancar aquilo que acredita. 

Mãe de Antônio, de 24 anos, de sua relação com Murilo Benício, e de Betina, 16, do relacionamento com o cantor Otto, ela acumula quatro décadas como atriz. Seu mais recente longa, Acqua Movie, estreou neste mês nos cinemas. No filme dirigido por Lírio Ferreira, Alessandra vive a personagem Duda, mãe de Cícero (Antonio Haddad), que parte com o filho rumo ao sertão pernambucano, apresentando a paisagem nordestina alterada pela transposição do Rio São Francisco. Na viagem, Duda busca reconstruir o afeto com Cícero. Neste ano, a atriz brilhou também no papel de Inês, a Cuca da série Cidade Invisível, da Netflix, que resgata personagens folclóricos da cultura brasileira. 

A trama chegou à lista de conteúdos mais assistidos da plataforma de streaming por pelo menos um dia, em mais de 40 países, e foi renovada para uma segunda temporada. Na pandemia, Alessandra aproveitou o tempo em isolamento e desenvolveu o projeto A Árvore, um híbrido de cinema e teatro lançado online. O monólogo de Silvia Gomez aborda a história de uma mulher que vê seu corpo transformar-se em estrutura vegetal. Neste período, a artista também encontrou seu equilíbrio na meditação e nos exercícios físicos. Tem vezes que é difícil manter a disciplina, mas trata como sua superação diária: 

— Procuro ser uma pessoa que encara as coisas conforme vão acontecendo. É preciso ser resiliente, encarar as coisas com verdade.

Em um bate-papo com Donna por telefone, a atriz falou sobre seus novos projetos, contou como está a vida na quarentena e refletiu sobre o espaço das mulheres no audiovisual. 

Acqua Movie é rodado no sertão pernambucano e na região do Médio São Francisco. Como foi trabalhar nessas localidades?

Incrível! Foi uma aventura. Uma experiência inesquecível. Não conhecia o sertão. É um lugar lindo. A luz do sertão é um negócio que você se apaixona quando vê. Ficamos um mês sem voltar para casa. Os hotéis eram todos em beira de estrada. Por um lado, foi um pouco difícil, as temperaturas muito altas durante o dia. Lembro que nunca passei tanto calor na minha vida, doía o corpo, sabe. Mas era de uma beleza... O povo é muito acolhedor, generoso e divertido. 

Acqua Movie / Divulgação
Em “Acqua Movie”, a personagem de Alessandra parte para o sertão pernambucano ao lado do filho

Você sente falta de ver mais mulheres retratando suas questões ou contando suas histórias na TV e no cinema? 

Sim. Estamos começando a tomar um espaço maior do que já houve, mas ainda é pouco. Ainda é um mundo muito machista. O poder do homens no próprio audiovisual continua maior, e as histórias contadas seguem sendo muito masculinas. Temos um longo caminho pela frente. Não estamos nem perto daquilo que podemos fazer. Mas, comparado a quando comecei, melhorou bastante. Porém, é um meio bastante machista, principalmente as histórias que se contam, com ponto de vista excessivamente masculino. As histórias contadas e feitas pelas mulheres trazem outra vibração para o mundo, justamente o que estamos precisando agora.

Em entrevista de 2018, você já disse que “não tem idade para fazer mocinha”. Como você vê o espaço dado a histórias de mulheres maduras no audiovisual?

No Exterior já mudou. Lá, você vê isso muito forte. O Brasil está começando a engatinhar. Na gringa, você vê as séries sendo estreladas por atrizes mais velhas, no caso, não garotinhas ou jovens iniciantes. Com o tempo, você vai ficando com mais poder para decidir o que quer, para bancar aquilo em que acredita. Há grandes atrizes produzindo suas coisas. Acho que o caminho no Brasil também será esse. O mundo está mudando, ainda bem. O Brasil precisa ficar mais adulto. Deixar de ser um país infantilizado, de meninos (risos). Tem que ser de homens e mulheres.

Como foi a chegada aos 50? Como tem sido essa nova fase para você?

Não sei se é uma nova fase. Você vai indo, vai vivendo. Hoje me sinto mais feliz do que era antes. Me sinto mais em paz com as coisas, comigo mesma. Consigo reconhecer melhor a mim mesma, o que é importante. Quando se é mais jovem, você vive, mas não se reconhece. Você não se afirma muito. Quando fica mais velha, começa a se tornar mais forte, a ter mais poder consigo mesma. Aumenta mais a responsabilidade com você. Sente-se mais responsável pelas suas escolhas, pois você já não tem mais a vida inteira pela frente. Tudo ganha uma importância maior. Você pensa: “Não vou perder o meu tempo com isso, pois não me interessa”. São escolhas responsáveis em relação a si própria. 

Você já comentou que gostou de ficar em sua própria companhia durante o isolamento. Esse sentimento veio com a maturidade?

Sempre tive isso, desde criança. A quarentena, no começo, trouxe mais tempo para mim. Depois foi enchendo o saco (risos). Já deu, não quero mais! Tem gente que não gosta de ficar consigo mesma. Eu gosto. 

No geral, como tem sido a pandemia para você? 

Tempos difíceis, que exigem que você seja forte. São tempos em que você tem que mostrar a sua força para você mesma, enfrentar e resistir. E atravessar, como se fosse uma guerra. Eu atravessei, como todo mundo atravessou. Procuro ser uma pessoa que encara as coisas conforme vão acontecendo. É preciso ser muito resiliente neste momento, encarar com verdade. Quem é importante para você? Quem não é? Quais relações você quer manter? Esses questionamentos vinham naturalmente durante a pandemia. Espero que esteja acabando essa fase. A pandemia já era difícil, mas estar no Brasil, com tudo o que a gente está passando, faz a coisa ser ainda mais complicada. 

O que te ajuda a se manter forte?

Manter a saúde mental e física passa a ser um grande desafio. Eu medito bastante. Mas passei por momentos assim, mais difíceis. “E agora? Estou de saco cheio...” Não! Levanta, vamos fazer exercícios. Fazer exercícios é superação (risos), é difícil para todo mundo.

As atividades físicas ganharam mais importância neste período?

Sempre foram importantes para mim. Esse período é mais difícil para manter saúde mental e física. Por não ir à academia, em tese, tem que ser mais disciplinado. Então, é uma fase que exige mais força. Você está numa guerra? O necessário é sobreviver. Então, vamos fazer o necessário para isso. Procuro ser forte. Nem sempre estou feliz, mas acredito que as pessoas precisam se manter fortes.

Pouco antes da pandemia, você esteve no centro de discussões sobre cancelamento e apropriação cultural por conta de sua fantasia no Carnaval no desfile do bloco Baixo Augusta, de São Paulo, que continha referências indígenas. Hoje como você avalia esse episódio?

Foi um episódio muito fugaz porque as pessoas perceberam rapidamente que foi um equívoco. Estava apoiada por entidades indígenas, tanto que fui autorizada a fazer isso. Talvez as pessoas não soubessem que eu não estava lá pulando bloquinho de Carnaval. Não foi isso. O Baixa Augusta é um bloco ativista. O tema do bloco era Viva a Resistência. A resistência indígena era uma grande questão. Ainda é. Só piorou de lá para cá. Eu, como rainha do bloco, os convidei para estarem comigo. Chamei um indígena que fez o trabalho gráfico no meu corpo. Não estava nem fantasiada de indígena, mas foi esse trabalho que gerou a repercussão. Foi tudo muito rápido, como um sopro. 

Não se sentiu cancelada?

Para falar a verdade, me senti bastante acolhida na época. Eu ia no mercado e todo mundo falava: “Ai, amei o que você fez”. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) escreveu uma carta pública dizendo: “Ela é nossa parceira, estava conosco”. Houve um esclarecimento. As pessoas são muito superficiais na leitura, muito imediatistas. A internet é assim. Vem rápido e passa logo. Fiquei bem tranquila.

Falando em Carnaval, a festividade não pôde ser realizada este ano por conta da pandemia. Você tem expectativas para a volta da festa?

Não. Minha única expectativa é que o povo brasileiro seja vacinado. Só isso. Que a gente posso alimentar o povo brasileiro, e as pessoas tenham emprego. Carnaval, sinceramente, pode esperar. Todo mundo está com saudade, a gente quer voltar para as ruas. Mas nós só vamos ter razão para comemorar quando tivermos todo mundo bem. Pelo menos vacinados. No momento, não estou pensando no Carnaval.

Cidade Invisível traz questões como pressão do setor imobiliário sobre as áreas naturais e as comunidades que vivem na floresta. O meio ambiente também é assunto em Acqua Movie e é um tema frequente nas suas redes sociais. Qual é a sua relação com essa causa?

Para qualquer pessoa que está conectada com a contemporaneidade, isso passa a ser uma questão fundamental. Uma causa mais urgente. Isso foi entrando na minha vida aos poucos. Por acaso, as obras que fui fazendo e curtindo, tratavam disso. 

Alisson Louback / Netflix
Sucesso na Netflix, “Cidade Invisível” traz a atriz como a personagem Inês, uma versão da Cuca. Renovada para uma segunda temporada, a série é inspirada no folclore brasileiro

Quais são os seus próximos projetos? 

Tenho A Árvore, que é um projeto belíssimo que fiz na pandemia. Era uma peça e acabou sendo um produto audiovisual. Vou fazer a segunda temporada de Cidade Invisível e depois tem uma série da Globo chamada Fim, da Fernanda Torres, que a gente interrompeu as gravações na metade.


MAIS SOBRE

Últimas Notícias