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Luta contra drogas

Ator de "Cidade de Deus", Rubens Sabino desabafa: "Virei um morador de rua famoso"

Intérprete de Neguinho no filme, ele sonha em voltar a atuar

02/10/2022 - 15h47min

Atualizada em: 02/10/2022 - 15h48min


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Globo Filmes / Reprodução Globoplay
Rubens Sabino tinha 18 anos quando interpretou Neguinho em "Cidade de Deus"

Duas décadas após o lançamento de Cidade de Deus, o ator Rubens Sabino da Silva, intérprete de Neguinho, vive nas ruas do Rio de Janeiro. Em entrevista ao jornal Extra, ele refletiu sobre sua trajetória após o filme que inclui uma prisão, a luta contra as drogas e o afastamento da carreira artística.

Quanto tinha 18 anos, Rubens participou de uma das cenas mais icônicas do longa. É ele que, de arma em punho, se dirige ao personagem de Leandro Firmino e pergunta:

— Porra, Dadinho, como é que tu chega assim na minha boca, meu amigo?

— Dadinho é o caralho, meu nome agora é Zé Pequeno, porr*! — responde o traficante. 

Veja a cena

Na entrevista ao jornal, o ator disse que recebeu R$ 5 mil pelo trabalho em Cidade de Deus:

— Esse diálogo virou música e tudo. E o filme é um dos mais vendidos até hoje, foi indicado quatro vezes ao Oscar. Eu virei um morador de rua famoso, mas não rico, enquanto Cidade de Deus arrecadou milhões.

Rubens conta que vivia nas ruas desde os oito anos, quando fugiu da casa onde morava com a mãe e três irmãs. Ele ficou sabendo dos testes para o filme quando fazia parte de um grupo de meninos de rua, na Lapa.

— Eu me inscrevi e consegui passar. Fiz laboratório com (os preparadores de elenco) Fátima Toledo e o Guti Fraga. Quem ia no ensaio ganhava vale-transporte e um lanche — lembrou ele, contando que já havia tido outras duas experiências anteriores no audiovisual. — Participei dos clipes da Deborah Blando (Unicamente) e do Rappa (Minha Alma).

Em junho de 2003, quase um ano depois do lançamento do filme, o ator ganhou mídia novamente ao ser preso após roubar a bolsa de uma mulher dentro de um ônibus no Rio. Hoje, Rubens disse que se arrepende:

— Denzel Washington falou para Will Smith depois da última cerimônia do Oscar (quando ele deu um tapa em Chris Rock ao ouvir piadas sobre a sua mulher): “No seu momento mais alto, tenha cuidado, é quando o diabo vem até você”. Foi o que aconteceu comigo. Depois que eu fui preso, a produção de Cidade de Deus me embarcou para Belém do Pará e fiquei três anos internado num centro de recuperação. Como é que um ator assiste à premiação do Oscar de um filme de que ele é um dos principais dentro de uma clínica de reabilitação? Eu vi pela TV a festa acontecendo num hotel aqui do Rio, todos reunidos, e eu afastado. Era pra ser o auge da minha vida. Eu me fechei pra tudo, não tenho contato com mais ninguém do elenco.

Rubens Sabino / Reprodução Facebook
Ator de "Cidade de Deus", Rubens Sabino sonha em apresentar um monólogo com obra de Michel Foucault

Em 2012, Rubens participou do documentário Cidade de Deus: 10 Anos Depois:

— Fiquei muito exposto. Contei toda a minha história, me levaram na Central do Brasil, compraram uns quatro sacos de amendoim pra eu revender e me deixaram na rodoviária. Fui ingênuo, continuei na mesma, pedindo esmola na rua. Não quero mais ser visto como coitadinho.

O diretor Cavi Borges, no entanto, afirmou ao Extra que pagou pela participação do ator na obra.

— A gente tirou dinheiro do próprio bolso para bancar o documentário. Eu avisei aos atores que eu tinha R$ 300 para dar por entrevista. Estive com Rubinho três vezes e dei R$ 1 mil. Aí ele sumiu por um tempo e voltou me cobrando mais R$ 1 mil, senão não autorizaria o uso de imagem. Quando conseguimos um patrocínio da Secretaria de Cultura para finalizar o filme, demos mais R$ 1 mil. Um filme que custaria R$ 600 mil, a gente fez com R$ 200 mil. Eu, como diretor e produtor, não ganhei nada. Tenho todos os documentos assinados aqui por ele com o nosso acordo — relatou. — Rubinho é um cara muito inteligente, articulado, um super ator. Mas tem o problema do vício em drogas. De tempos em tempos ele reaparece dizendo que eu e Fernando Meirelles o exploramos. É triste, porque Fernando tentou, inclusive, pagar reabilitação, e ele fugiu da clínica.

Três anos depois do lançamento do documentário, o carioca virou notícia novamente ao ser encontrado na cracolândia de São Paulo.

— Já usei drogas pelo Brasil inteiro, como qualquer morador de rua, mas consegui superar. Hoje, eu sou isso aqui, cigarro e cerveja — afirma. — Eu ando por várias cidades do Rio, São Paulo, Minas, Sul do país. Vou pedindo esmola e que me paguem passagens. Às vezes, vou para lugares distantes, achando que ninguém vai me reconhecer. Eu não tenho casa, minha morada é o mundo. Ainda quero conhecer o Nordeste.

Apesar de não ter expectativas de que vá ser chamado para atuar novamente, Rubens disse que vontade não falta:

— Outro dia, eu estava vendo um outdoor com as fotos de várias personalidades. Um professor, um médico, um garçom... E estava escrito assim: “Esse é o meu jeito de revidar”. O meu jeito de revidar seria fazer um monólogo ou um curta-metragem com a obra de Michel Foucault (filósofo francês). Li e me encantei por Microfísica do Poder. Todos os livros dele já são roteiros prontos, eu decorei alguns deles. Queria poder revidar tudo o que me aconteceu nessa vida com arte. Se um dia eu tiver essa força, eu vou fazer.


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