Polícia



Mudança de política

Número de registros de armas de fogo cai quase 60% no Rio Grande do Sul em 2023

Ainda assim, Estado é o que mais anotou cadastros no país no ano passado

04/01/2024 - 10h59min


Anderson Aires
Anderson Aires
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André Ávila / Agencia RBS
Redução foi de 59,53% em 2023 ante o ano anterior.

Com a mudança na pauta armamentista na virada do governo de Jair Bolsonaro para a terceira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, o número de registros de armas no Rio Grande do Sul entrou em queda livre. O cadastro de novas armas recuou 59,53% em 2023 ante o ano anterior. Além disso, apresentou o menor patamar desde 2014. Os dados são da Polícia Federal (PF). A volta de políticas restritivas é a principal explicação para esse movimento, segundo especialistas. 

O tema gera visões divergentes. Enquanto parte dos analistas defende que o aperto no processo aumenta a insegurança, outra parcela afirma que a alteração faz parte de uma política mais responsável.

Em 2023, foi anotado o registro de 5.396 novas armas — 7.937‬ a menos do que o montante observado em 2022 —, segundo relatório da PF. No país, o movimento é parecido, mas a queda é maior, com retração de cerca de 82% na comparação entre os dois anos.

O chefe da Delegacia de Controle de Armas e Produtos Químicos da PF no Estado, Cicero Costa Aguiar, atribui a queda no número de registros a mudanças nos critérios para acesso a armas no país. Atualmente, é necessário comprovar a efetiva necessidade para adquirir o armamento. Além de diminuir o número de aprovações, a alteração na regra afasta da tentativa candidatos que não se encaixam nas regras, segundo Aguiar:

— A pessoa que quer uma arma tem um limite, vai conseguir no máximo duas armas. E para adquirir está mais difícil porque ela tem que comprovar a necessidade.

O delegado afirma que o cenário mais restrito para acesso a armas no país também afetou o trabalho da PF no RS. O setor responsável pelo processo relatou uma diminuição no ritmo de requerimentos no último ano ante períodos anteriores, segundo Aguiar.

Avaliações distintas 

O pesquisador em Segurança Pública e coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), Fabricio Rebelo, critica a política restritiva do atual governo no âmbito do armamento. Rebelo avalia como ilegal as mudanças promovidas, porque transfere a comprovação de efetiva necessidade, um critério que era exclusivo para o porte, para acesso a posse de arma. O pesquisador cita problemas na segurança pública diante desse cenário menos flexível para as pessoas que querem comprar arma para defesa pessoal:

— A longo prazo, isso vai reforçar a sensação de fragilização da sociedade, porque as armas que são tiradas de circulação no mercado legal são exclusivamente aquelas armas utilizadas para defesa pessoal. As armas dos criminosos continuam sendo por eles acessadas livremente.

Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, sociólogo, professor da Escola de Direito da PUCRS e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também atribui a redução nos cadastros à reversão das políticas de flexibilização do governo anterior. Azevedo afirma que a retração nos registros é positiva para o controle de armamento no país e no Estado. Além de diminuir casos de disparo de arma de fogo em situações domésticas, acidentes e de briga, maior controle e fiscalização do armamento tem efeito estrutural na segurança pública, segundo Azevedo. Isso ocorre com a diminuição no número de armas em circulação, reduzindo a transferência desses itens para o crime:

— A ideia do estatuto do desarmamento lá no início era, com o controle maior, fosse restringindo cada vez mais as possibilidades do acesso ilegal a esse armamento.

RS lidera número de registros no país

Apesar da queda observada em 2023, o Rio Grande do Sul segue liderando com folga o ranking nacional de registros de armas. Após o Estado, Espírito Santo (3.897) e Goiás (1.456) completam a parte de cima da lista (veja no gráfico abaixo). Fontes ouvidas pela reportagem afirmam que é difícil elencar dados que justifiquem a dianteira dos gaúchos no ano passado.

O chefe da Delegacia de Controle de Armas e Produtos Químicos da PF no Estado reforça a dificuldade em achar motivos mais técnicos para explicar esse cenário. Aguiar afirma que questões culturais são alguns dos fatores que podem ajudar a entender a colocação do RS:

— Conversando com colegas e por morar aqui no Rio Grande do Sul vejo que existe uma questão mais cultural. O cidadão gaúcho culturalmente tem o costume de querer ter a arma. Pessoal que mora em zona rural também busca muito a posse da arma para se defender.

Autorização para CACs

Suspensa pelo governo Lula desde janeiro de 2023, a autorização para novos Caçadores, Atiradores Esportivos e Colecionadores de Armas (CACs) deve ser retomada a partir deste mês de janeiro, conforme portaria publicada no fim do ano passado.

O documento do Exército estipula uma série de especificações sobre o acesso de civis aos chamados produtos controlados. Uma das principais mudanças ocorre no prazo de validade dos Certificados de Registro (CRs). Na gestão de Jair Bolsonaro, o prazo era de 10 anos. Agora, os documentos precisarão ser renovados a cada três anos.

A fiscalização de CACs será transferida do Exército para a PF ao longo de 2024 com data limite prevista para janeiro de 2025, conforme planejamento firmado em acordo de cooperação técnica entre os dois órgãos ainda no ano passado.

Principais mudanças

Como era

  • Até quatro armas de uso permitido, sem necessidade de comprovação da efetiva necessidade, com possibilidade de ampliação do limite;
  • Até 200 munições por arma, por ano (chegou a 600 munições).

Como é

  • Até duas armas de uso permitido, com comprovação de efetiva necessidade;
  • Até 50 munições por arma, por ano.

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