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Palavras que emocionam

Em plena era tecnológica, crianças da Capital aprendem a escrever cartas

O Diário Gaúcho propôs a uma turma de alunos que escrevessem uma carta ao estilo tradicional

29/11/2013 - 10h19min

Atualizada em: 29/11/2013 - 10h19min


Quando foi a última vez que você recebeu uma carta? Daquelas que trazem notícias de alguém que mora longe, por exemplo? Abrir a caixa de correspondências e curtir a emoção de ter nas mãos o envelope contendo uma mensagem com bem ou mal traçadas linhas, então, nem pensar? É, muita gente só encontra contas a pagar quando abre a caixa de cartas.


Aqueles que nasceram na era digital possivelmente também não devam receber alguma correspondência das mãos do carteiro.


Foi por isso que o Diário Gaúcho fez uma proposta aos estudantes de uma turma do quarto ano da Escola Municipal Wenceslau Fontoura, no Bairro Mario Quintana. Com idades entre nove e 11 anos, os alunos da professora Denise Cerqueira Devilla - assim como boa parte da gurizada da geração online - não têm o costume de escrever cartas. A pedido do DG, a turma elegeu os destinatários e encarou o desafio.


As 16 cartinhas foram postadas numa agência dos Correios da Zona Norte.


Acompanhe o passo a passo da tarefa e como foi a entrega da correspondência produzida pela aluna Amanda Santos Borges, dez anos.


Bastidores da tarefa


A professora Denise conta que já havia proposto atividade semelhante em outras turmas, aproveitando o fato de o irmão dela trabalhar como carteiro. Mas para a B13, o trabalho era novidade. Segundo ela, a produção da carta é importante para desenvolver a escrita.


- Eles percebem que não existe só a internet, o e-mail. Na carta, a escrita é mais pensada, mais pessoal - observa a professora, que aproveitou para trabalhar conteúdos de Língua Portuguesa como o parágrafo, vocativo, pontuação e ortografia.


Temas decididos pelos alunos


- Falamos que na carta é necessário constar a data em que estamos, que se pergunta como a pessoa está e que deve ter a assinatura de quem escreve - esclarece.


O tema da carta e o destinatário foram decididos pelas crianças.


MIL E UM MOTIVOS PARA ESCREVER


Cada estudante encontrou um motivo para escrever. Márcio Ferreira Fagundes, por exemplo, resolveu mandar notícias para a avó Romilda Ferreira, que mora em Santa Cruz do Sul:


"Querida vovó! Espera que nós iremos na tua casa. Estamos só esperando um troquinho... Vocês estão bem de saúde? Quando chegarmos na tua casa, quero tomar bastante chimarrão. Aqui nós todos estamos bem. Assim que der, nós vamos aí. Deus abençoe vocês."


"Vou falar o que sinto por vocês"


Já Iago da Silva Araújo, dez anos, preferiu limpar a barra com a avó:


"Estou escrevendo essa carta por todas as coisas que fiz à senhora. Por não ir ao mercado às vezes. Meus cadernos vão ficar sempre arrumados. Te dou minha palavra. Beijos do neto Iago."


Guilherme Zuketta Ribeiro, nove anos, fez uma declaração:


"Estou escrevendo para vocês esta carta porque são os melhores pais do mundo. Eu nunca vou deixar vocês sozinhos, amo muito vocês. Hoje é um dia especial, vou falar o que sinto por vocês. Eu sinto amor, amizade... Guilherme"


A carta de Amanda a sua mãe


Foi para dar notícias à mãe, que passa boa parte do dia envolvida com os dois empregos, que Amanda decidiu escrever. Mesmo morando junto, as duas pouco se veem.


- Primeiro pensei em escrever para uma prima que não vejo faz tempo. Depois, pensei na minha mãe porque ela tem dois serviços e quase não nos vemos. Mas ela está sempre me telefonando, querendo saber como estou. Acho que ela vai ficar feliz! - disse a menina.


O que ela escreveu


"Querida mãe: Você sabe que eu te amo mas nós não conseguimos nos falar direito porque você sai de manhã e só volta de noite, quando eu já estou dormindo. Então, queria te dizer que você é uma pessoa muito especial pra mim. Porque mesmo você trabalhando em dois serviços, sempre liga para ver se eu estou bem. Você é uma ótima mãe que sempre se preocupa com os seus filhos. Fica com Deus. Te amo. Assinado: sua filha Amanda"


O caminho da carta


Na quarta-feira passada, Amanda saiu da aula acompanhada da professora Denise. O destino era um lugar onde nunca havia entrado: uma agência dos Correios. Tímida, percorreu com os olhos os detalhes do ambiente.


Com a carta feita por ela e as correspondências elaboradas pelos colegas, Amanda colou os envelopes e foi para a fila da postagem. A estudante recebeu a ajuda do funcionário Itamar Reis, que tem 13 anos de trabalho nos Correios:


- Tu sabes qual é o lado que vai o selo? - questionou Itamar.


- O lado que coloca é esse aqui? - devolveu a menina, mostrando o verso do destinatário.


Um por um, a menina colocou todos os envelopes na caixa de coleta.


VOU GUARDAR PARA O RESTO DA VIDA!


Perto das 10h do sábado passado, a reportagem encontrou o carteiro Luis Felipe Moura no Centro de Distribuição Domiciliar Protásio Alves. Ele tinha em mãos a cartinha escrita por Amanda para a mãe, Aline. A entrega foi combinada previamente com a menina no único dia livre da mãe.


Chegou a pensar que fosse cobrança


Quando o carteiro chegou ao endereço, Aline estava na casa da irmã, na mesma rua do Bairro Mario Quintana. Atravessou correndo e foi ver o que era. Surpresa, chegou a pensar que se tratava de alguma cobrança. Quando viu o envelope com a letrinha caprichada da filha, comemorou:


- Nunca recebi uma carta. Eu esperava que ela me escrevesse pedindo algum presente, não pedindo que eu ficasse mais com ela. Mas eu tenho que trabalhar, não quero que ela passe pelo que eu passei. É uma filha de ouro, uma ótima aluna! Isso que recebi é muito valioso, vou guardar para o resto da vida! - disse a mãe, emocionada.


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