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Como é a rotina dos catadores de marisco no Litoral Norte

Pelo menos oito pescadores de Tramandaí vivem a rotina árdua de catar o sustento nas areias do Litoral Norte. Eles são tiradores de marisco, ou marisqueiros, como gostam de ser chamados

23/10/2014 - 08h07min

Atualizada em: 23/10/2014 - 08h07min


Marisqueiros trabalham em Tramandaí

Quando emergem da areia molhada as primeiras bolhas de água, que logo se tornam pequenos orifícios, mãos ágeis cavoucam em sintonia com as ondas do mar. São os tiradores de mariscos, profissionais com rapidez necessária para tirar dali o sustento de famílias que vivem no Litoral Norte do Estado. Em Tramandaí, pelo menos oito pescadores vivem profissionalmente da função. Entre eles, Valdir Duarte, 35 anos, e a sobrinha Andresa Duarte, 34 anos.

A rotina é árdua e não distingue final de semana ou feriado. Todos os dias, faça calor ou frio, chuva ou sol, os dois estão cedo na beira da praia à procura dos pequenos seres escondidos em conchas. Dependendo da quantidade encomendada por restaurantes e peixarias, a rotina pode começar no meio da madrugada, por volta das 3h. Para conseguirem mariscos maiores, é preciso percorrer mais de 500km, rumo ao Litoral Sul do Estado. Lá, garantem, pegam peças que podem pesar mais de 100g cada.

- Estou nesta vida de marisqueiro desde os dois anos de idade, quando vinha para a beira da praia ver o meu pai pegar mariscos. Conheço cada canto deste litoral gaúcho - garante Valdir.

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Sem conversa

No dia em que o Diário Gaúcho acompanhou o trabalho de tio e sobrinha, na Praia das Cabras, entre Cidreira e Tramandaí, os dois precisavam catar 40kg de mariscos frescos para um comércio em Torres - distante 90km. Cada um deles carregava um vasilhame plástico que comportava 4kg do molusco por vez. Chegaram à praia por volta das 7h e pretendiam concluir a tarefa até o meio-dia.

- Tem que voltar à tarde para pegar uma nova remessa. A gente não para, mas gosta do que faz. Do contrário, não estaríamos aqui de cabeça baixa e com as mãos nesta água gelada - comentou Andresa.

Distantes menos de dois metros um do outro, os dois não se falaram por quase duas horas - tamanha a concentração para desempenhar a tarefa. Mais rápida, Andresa encheu duas garrafas em menos de 40 minutos. Valdir foi mais lento, mas pegou mariscos maiores nos primeiros punhados.

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Técnica e agilidade

Engana-se quem pensa que os dias ensolarados são os melhores para a prática.

- É na chuva que gostamos de trabalhar. A areia fica macia e os mariscos ficam fáceis de pegar. Se estiver frio, colocamos roupas de neoprene e seguimos o trabalho - garante Andresa.

Quando a onda vem se espraiando pela areia, Valdir e Andresa começam a cavoucar com os pés para sentir onde podem estar os mariscos. Marcham juntos. Mas basta a água voltar ao mar para os moluscos espocarem na areia. É a hora de tio e sobrinha ajoelharem-se e enterrarem os braços até os cotovelos. Para evitar os cortes nas conchas afiadas, ambos usam tocos de luvas de borrachas nas pontas dos dedos.

- Não dá para usar a luva inteira porque a gente acaba não sentindo os mariscos, mas nem sempre consigo evitar um ferimento - conta Valdir, mostrando o corte recente aberto no dedo anelar direito.

Os mariscos são levados como estão para o comprador. O pegador ensina que não se pode lavá-los para não retirar o sal do mar. É preciso entregá-los brutos.
 
Profissão ameaçada

Segundo o experiente Valdir, cada quilo de marisco é vendido a R$ 6. Por dia, dependendo da época do ano, chega-se a tirar até 100kg das areias. No verão, quando as encomendas aumentam, o ritmo de tio e sobrinha amplia-se também. Casado, Valdir sonhava ver um dos filhos seguindo na profissão árdua.

- Queria manter um marisqueiro na família, mas não vai dar. O guri tem 18 anos e é metalúrgico. As gurias (de 12 e 14 anos) nem vem à praia para não estragarem as unhas - conta, às risadas.

Já Andresa ainda tem esperança de ver na lida a filha Erica, dois anos, a mais nova de quatro filhos - com idades entre dez e 18 anos.

- Antes, ela precisa estudar. Mas viver assim, todos os dias na beira da praia, é bom. Isso não dá para negar - garante.
 
 


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