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Relojoeiro de 81 anos trabalha na Galeria do Rosário, em Porto Alegre

Um dos últimos especialistas no conserto de relógios mecânicos em Porto Alegre, Ivo Carvalho, 81 anos, não fala sobre aposentadoria. Ele tem o tempo como companheiro inseparável.

01/10/2014 - 08h03min

Atualizada em: 01/10/2014 - 08h03min


Mateus Bruxel / Agencia RBS

Alheio aos ponteiros ininterruptos dos relógios espalhados pelas paredes, o tempo parou na sala 413 do quarto andar da Galeria do Rosário, no Centro de Porto Alegre. É ali que o relojoeiro Ivo Carvalho, 81 anos, atua desde 1973 como consertador de relógios mecânicos. Especialista no assunto há 68 anos, ele é um dos últimos da cidade a trabalhar apenas com os aparelhos que necessitam de corda para continuar funcionando.
Entrar na loja é uma volta ao passado. Cucos de fabricação americana, datados de 1900, misturam-se a grande relógios de mesa, protegidos por madeira maciça. Boa parte deles, revela Ivo, foi abandonada no estabelecimento pelos donos. Cada um carrega um pedaço de papel com a identificação do antigo proprietário, o valor do conserto e a data de entrega.
- Eles trazem os relógios para uma avaliação e contratam o serviço. O problema é que não voltam mais para buscá-los. Este aqui (apontando para um na parede) está comigo desde 2010, mas não posso revendê-lo porque não é meu - conta.
 
Clientes de décadas

Diferente dos clientes que aparecem por ocasião, há quem seja cativo na loja. O ex-jogador do Grêmio Juarez Teixeira, o Tanque, é cliente de Ivo há pelo menos 49 anos. São décadas comprovadas nos livros de registros de páginas amareladas, estocados numa das prateleiras da loja. O primeiro relógio de pulso levado por Tanque ao relojoeiro foi em 1965. Ele voltou à loja para consertar o aparelho na década de 90. Em julho deste ano, retornou para fazer uma limpeza no mesmo relógio.
- Nos conhecemos no futebol, mas o relógio nos aproximou e somos amigos até hoje. Isso é comum ocorrer com outros clientes - comenta Ivo, que pelos registros calcula já ter consertado quase 50 mil relógios.
O mesmo deve acontecer com a dona de casa Antônia Anderloni, 65 anos, do Bairro Glória, de Porto Alegre, que ontem entrou na loja preocupada com o velho relógio de pulso parado. Alertada por Ivo, ela descobriu que o único problema do aparelho era a pilha velha. No lugar do conserto esperado, pagou apenas R$ 10 pela nova pilha.
- Isso se chama honestidade, coisa difícil de encontrar nos dias de hoje. Ele poderia ter dito que estava estragado. Voltarei sempre - garantiu Antônia, que soube do relojoeiro por indicação de uma filha.

"Isso aqui é uma terapia"

Casado com a funcionária pública aposentada Maria Helena Carvalho, 78 anos, morador do Bairro Teresópolis, pai de dois filhos e avô de quatro netos, o apaixonado pela profissão não pensa em deixá-la tão cedo. Pelo contrário, Ivo garante que há prazer em passar os dias usando uma lente de aumento para mexer em antigos relógios de bolso fabricados na União Soviética e nos Estados Unidos e nos pequeninos de pulso. Há, ainda, os badalos de parede e de mesa. O amor é tanto que há quatro décadas não almoça em casa de segunda a quinta-feira, quando dá expediente na loja que um dia já teve outros três funcionários. As sextas e os finais de semana são dedicados aos amigos e à esposa, com quem divide o mesmo teto há 56 anos.
- Enquanto estou com vida ativa, estou vivendo. Também mantenho o meu padrão de vida. Mas o mais importante: isso aqui é uma terapia - garante.

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