Uma década de bolsas de estudo
Prouni ajudou a triplicar o número de brasileiros com nível superior
Especialistas, no entanto, afirmam que é preciso melhorar a qualidade do ensino ofertado em algumas das instituições privadas que oferecem bolsas
Nos últimos anos, quase 400 mil pessoas no país conquistaram um diploma de Ensino Superior graças ao Programa Universidade para Todos (Prouni), que completa uma década de existência neste ano. A Região Sul é a segunda colocada no ranking com quase 80 mil formados com bolsas de estudos (parciais e integrais) em instituições privadas. A maioria dos contemplados é ex-aluno da rede pública e vem de família com renda de um salário mínimo e meio por pessoa.
Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), o Prouni concedeu cerca de 1,4 milhão de bolsas desde o seu surgimento, mas a quantidade disponibilizada no período - somando as vagas ofertadas por ano - foi maior: 2,2 milhões. A diferença se deve, conforme o MEC, ao fato de que as vagas remanescentes de um processo seletivo podem ser reofertadas no semestre seguinte.
Embora tenha colaborado com o aumento do percentual de brasileiros com nível superior completo, que passou de 4,4% em 2000 para 12% em 2012, o Prouni também é alvo de críticas de especialistas, principalmente no que diz respeito à falta de qualidade no ensino e de transparência nos dados do programa.
O sociólogo Wilson Mesquita de Almeida acompanhou, durante quatro anos, a trajetória de 50 bolsistas para sua tese de doutorado na Universidade de São Paulo (USP). Uma das conclusões do seu estudo foi que a formação de parte dos alunos do Prouni é precária, o que pode afetar o ingresso no mercado de trabalho. Isso ocorre, segundo Almeida, porque o programa foi criado não apenas para promover a inclusão, mas como forma de socorrer instituições que visam ao lucro e que estavam à beira da falência.
- Visando a uma maior eficácia, o Prouni precisaria ficar restrito somente às instituições sérias, preocupadas em prover educação de qualidade. Isso aponta para o controle sério e rigoroso - que infelizmente ainda não temos - dessas universidades privadas lucrativas. Seria preciso desenvolver mecanismos mais efetivos de controle estatal e social para evitar muitos descaminhos - avalia.
Desde a criação do programa, instituições privadas de Ensino Superior deixaram de pagar R$ 5,5 bilhões em tributos federais, em valores corrigidos pela inflação, de acordo com informações da Receita Federal. As 1,2 mil faculdades que hoje participam do Prouni recebem isenção sobre quatro impostos e contribuições federais: Imposto de Renda, PIS, Cofins e CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).
Deficiências que vêm da escola
Diretor-executivo da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Sólon Caldas rebate as críticas afirmando que "qualidade é um termo subjetivo e depende de quem avalia". Conforme ele, as faculdades recebem alunos com "grande deficiência de conhecimento" e os transformam, capacitando-os para o mercado de trabalho.
- O programa nasceu de uma parceria entre a iniciativa privada e o governo federal, com o objetivo de inserir o jovem de baixa renda, e teve um resultado positivo para todos os envolvidos, principalmente para a sociedade.
Esforço pessoal para chegar à formatura
Filho de um técnico em telefonia e de uma empregada doméstica, Adriano Fontoura Rodrigues, 24 anos, foi o primeiro membro de sua família a conquistar um diploma universitário. Sempre incentivado a estudar pelos pais Maria e Valter, que não tiveram a mesma oportunidade, Adriano se formou em Direito, há dois anos, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), graças ao Prouni.
Não fosse a bolsa de estudos, é provável que o jovem porto-alegrense jamais pisasse na instituição, onde a mensalidade do curso era equivalente ao dobro do salário da doméstica, a principal fonte de renda da família na época, já que o pai estava desempregado.
A oportunidade de ingressar na faculdade pavimentou um caminho de esperança para o futuro de Adriano e sua família. Durante a faculdade, o jovem fez estágios no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e no Ministério Público Federal, o que despertou o desejo de atuar no serviço público.
Em junho de 2010, aos 20 anos, ele passou no primeiro concurso que fez, o de oficial escrevente no TJ. E não parou por aí. Dois anos depois, foi chamado para ocupar uma vaga de técnico judiciário no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, onde atua desde então.
Adriano, que mora com sua família no bairro Agronomia, zona leste da Capital, enquanto junta dinheiro para financiar um apartamento, agora sonha mais alto: quer ser juiz do trabalho. Difícil duvidar de sua capacidade.
- Sempre acho que não fiz mais do que a minha obrigação. Eu apenas estudei e fui atrás do que eu queria.
Entrevista
"Precisamos ampliar cada vez mais o acesso ao Ensino Superior"
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Na avaliação do ministro da Educação, Henrique Paim, o Prouni é um programa de "grande relevância social" e que ajudou a pavimentar o caminho para a redução das desigualdades educacionais. Leia a entrevista concedida a ZH por telefone.
Quais as principais conquistas do Prouni?
O programa teve um aspecto de inovação fundamental para construir políticas de inclusão educacional. Aproveitou o uso da isenção fiscal para fins educacionais, e transformou isso em um programa de grande acesso àquelas pessoas que mais precisam, que são de baixa renda e de escola pública. Permitiu que construíssemos uma política de redução das desigualdades educacionais.
Especialistas questionam a qualidade do ensino oferecido em instituições que fazem parte do programa. O bolsista sai da academia preparado?
Os dados demonstram que o desempenho dos bolsistas do Prouni se equivale - e muitas vezes é superior - ao dos não bolsistas. Os cursos têm de ter uma avaliação positiva na lei do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Se um determinado curso tiver duas avalições negativas, ele está excluído do programa.
Faz sentido incluir isenções fiscais do Prouni na meta de 10% do PIB para a educação pública, já que o programa dá bolsas em instituições privadas?
A meta 12 do PNE diz que o país precisa fazer grande esforço de ampliação de matrículas. No Brasil, 25% das matrículas são públicas e 75%, privadas. Fica difícil atingir metas se não houver parceria com as instituições privadas. Temos de ter um fortalecimento do sistema de regulação e de avaliação da educação superior.
Onde é preciso avançar?
Atingir as metas do PNE e fortalecer regulação e avaliação da educação superior, para que a gente possa expandi-la com qualidade. Precisamos ampliar cada vez mais o acesso ao Ensino Superior.