Polícia



Pesquisa

Em média, há um linchamento ou tentativa de linchamento por dia no Brasil

Conclusão é do sociólogo José de Souza Martins, autor de "Linchamentos - A justiça popular no Brasil"

27/07/2015 - 21h56min

Atualizada em: 27/07/2015 - 21h56min


Para escrever o livro Linchamentos - A justiça popular no Brasil, o sociólogo José de Souza Martins se debruçou sobre 2.028 casos ocorridos ao longo de seis décadas. O pesquisador, professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), afirma que, hoje, a média é de um linchamento ou tentativa de linchamento por dia no país, com tendência de aumento. Confira a entrevista concedida por e-mail.

Linchamento em Viamão só parou com a chegada da Guarda Municipal
Penas para linchamento podem chegar a 30 anos de prisão
Linchamentos põem a nu fragilidades da democracia

Qual a frequência de casos de linchamento no país?
Atualmente, a média é de um linchamento ou tentativa de linchamento por dia, com alguma tendência ao aumento. Antes das manifestações de rua de 2013, havia em média quatro linchamentos ou tentativas por semana. Portanto, a tendência geral é a do crescimento da frequência de casos.

O que move as pessoas a praticarem essas agressões?
O linchamento é violência socialmente autodefensiva, praticada por pessoas comuns, geralmente sem histórico de ação violenta. É violência de motivação súbita, impensada, reativa em face de ato violento contra pessoa inocente e indefesa: estupro, sobretudo de criança, assalto, roubo, violência física, etc.

Um melhor funcionamento das instituições poderia resultar na diminuição dos casos?
Provavelmente, não. Os linchadores não esperam apenas melhor funcionamento das instituições, como seria se a justiça fosse mais rápida. O que eles querem é punir a violência intolerável com base em outro e diferente código de punição. Os linchadores entendem que certos crimes devem ter punição radical, como a morte ou a mutilação do agressor.

Há um padrão de como são praticados os linchamentos?
No tratamento dos dados utilizados em meu livro Linchamentos - A justiça popular no Brasil (Contexto, 2015), foi possível descobrir uma espécie de protocolo subjacente aos atos de linchar, que vão da perseguição, ao apedrejamento, ao espancamento, à mutilação, à morte. Os 2.028 casos que analiso repetem, parcial ou totalmente, esse padrão.

E qual o perfil das vítimas, como idade e cor?
Os linchamentos ocorridos no Brasil até agora contrariam a tese de que os linchados são pretos e pobres. No levantamento que fiz, das vítimas de linchamentos dos últimos 60 anos, a maioria é de brancos. O que explica os linchamentos entre nós é o motivo e não a idade ou a cor. Em princípio, ninguém é linchado por ser negro. E ninguém deixa de ser linchado por ser branco. Isso indica que não somos propriamente racistas, não os racistas do estereótipo de importação dos Estados Unidos, em que negros eram linchados por serem negros. No entanto, aqui no Brasil, para linchamentos de mesma motivação o índice de atrocidade é o mesmo no caso de negros e de brancos nas primeiras agressões. A atrocidade cresce, porém, do meio para o fim da violência, quando o linchado é negro. Isso indica que somos uma sociedade preconceituosa, mas não imediatamente racista. Nosso racismo é sutil e se alimenta de outros preconceitos. Convém ter em conta que muitos linchamentos de negros são praticados por negros. Há negros e brancos tanto entre linchadores quanto entre linchados. Quanto à idade, há uma incidência maior de linchamentos contra jovens.

*Diário Gaúcho


MAIS SOBRE

Últimas Notícias