Sessão polêmica
Vereadores aprovam projeto que proíbe o Uber em Porto Alegre
Pela lei, aplicativo de "caronas pagas" fica impedido de operar até que seja regularizado no município
No mesmo caminho trilhado por legislativos de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre aprovou, no fim da tarde desta quarta-feira, a proibição do Uber no município. Porém, a proposta contém uma ressalva em relação ao projeto original: o aplicativo de "caronas pagas" ficaria impedido de operar até que seja regulamentado.
O projeto só passa a valer se receber a sanção do prefeito José Fortunati, que também pode vetar ou optar por silenciar em relação à iniciativa. Ele tem prazo de 15 dias para se manifestar depois que a proposta for entregue ao Executivo (um texto final ainda precisa ser redigido pelo Legislativo, o que pode demorar dias).
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De autoria do vereador Clàudio Janta (SDD), o projeto de lei previa a proibição do transporte remunerado de passageiros em veículos particulares cadastrados por aplicativos - modelo adotado pelo Uber, em operação na Capital há uma semana e alvo de críticas encabeçadas por taxistas. A aprovação por 22 votos favoráveis a nove contrários se deu graças à inclusão de emendas que limitaram a restrição do serviço somente até a sua regulamentação. O trabalho de legalização do aplicativo deve ficar a cargo de uma comissão especial na Câmara.
Quatro horas de debates antecederam a votação da proposta em uma sessão marcada por discursos inflamados, gritaria e princípio de tumulto. Taxistas lotaram metade das cadeiras da plateia e, a cada discurso favorável ao Uber, lançavam vaias e gritos.
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- O Uber é uma alternativa inovadora de transporte individual. Não podemos prejudicar a população proibindo que ela use uma alternativa que é válida. As pessoas têm o direito de dispor de opções de mobilidade urbana - defendeu o vereador Nereu D'Ávila (PDT).
D'Ávila liderou a defesa do aplicativo em plenário e, com o posicionamento, se tornou alvo de quem é contra. Por duas vezes, ao se aproximar da galeria onde estavam taxistas, viu dedos em riste e ouviu expressões como "vendido" e "sem-vergonha" (assista abaixo). Coube à Guarda Municipal apaziguar.
Entretanto, a maioria dos parlamentares usou o microfone para defender que o serviço não pode se instalar na cidade desrespeitando leis. Norma municipal de Porto Alegre só permite o transporte individual de passageiros mediante permissão pública. Já o Uber se ampara no Plano Nacional de Mobilidade Urbana, que nada diz sobre transporte de poucas pessoas feito por motoristas particulares (onde entra o aplicativo).
- Esse projeto vem para cumprir a lei, porque Porto Alegre não é uma terra sem leis. Que não venha o Uber chantagear a cidade - discursou Janta.
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Ainda que sendo defendido por parte da população (que vê no aplicativo uma alternativa ao serviço de táxis), o Uber recebeu pouco apoio da plateia durante a votação: precisamente, de um grupo de cerca de 10 jovens que abandonou cedo a sessão. "Povo é maior do que sindicato", dizia um dos cartazes que empunhava.
Na prática, a anuência do projeto nada muda o atual cenário em Porto Alegre, uma vez que a prefeitura já enquadra o aplicativo como transporte clandestino e tem endurecido a fiscalização. Horas antes da votação na Câmara, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) multou em mais de R$ 6 mil dois carros utilizados por motoristas parceiros do Uber. O C4 azul e o Astra vermelho foram recolhidos em blitz na Avenida Loureiro da Silva.
Em nota, o Uber reforçou que o serviço está previsto em lei federal e que "uma lei que vete esse tipo de tecnologia é inconstitucional". O serviço segue com operação normal na cidade, acrescentou a empresa.
Os dois lados da plateia na Câmara:
Acho que, para a população, é bom. Entendendo que a população quer um novo sistema, um novo serviço e, se o Uber tiver que entrar, ele vai entrar. Mas tem de regularizar, até para a segurança da população. Tem de saber quem está dirigindo e tem de ter uma carteira funcional, como nós temos.
Claudio Santos, 53 anos, taxista
Acreditamos que proibir o Uber está se inibindo a concorrência entre agentes do mercado e prejudicando o passageiro, que não poderá escolher entre um táxi ou um Uber.
João Pedro Bastos, 18 anos, estudante de Economia
Detalhe ZH
O advogado Fernando Smith Fabris, professor de direito da PUCRS, explica que a criação de uma lei para barrar o Uber muda a abordagem da prefeitura ao assunto - até então, o Executivo afirmava que o aplicativo não estava enquadrado em nenhuma regra, portanto seria clandestino. Uma lei neste sentido, portanto, acaba sendo redundante.
- Há uma certa incoerência: se o Uber já era proibido, por que criar uma norma? Isso pode trazer argumento a favor do Uber de que, quando chegou a Porto Alegre, operava na legalidade - explica Fabris.
O teor da lei também causa estranhamento:
- É anormal criar uma lei para proibir. Especialmente em uma área que é competência do governo Federal legislar, o transporte público. É possível que esta lei seja considerada inconstitucional.
* Zero Hora