Pelas Ruas



Vista poluída

Quadra de rua da Cidade Baixa tem mais de 90% dos imóveis pichados

ZH Pelas Ruas contou 65 de 70 casas ou prédios com fachada, portão ou muro vandalizados em trecho da Rua Lopo Gonçalves

15/01/2016 - 14h48min

Atualizada em: 15/01/2016 - 14h48min


Jéssica Rebeca Weber
Jéssica Rebeca Weber
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Pichações sobre pichações são comuns na Lopo Gonçalves. Foto: Jéssica Rebeca Weber/ Agência RBS

Não há lugar livre de vandalismo: qualquer bairro, da zona norte à sul de Porto Alegre, pode ser alvo de pichadores. Mas na Rua Lopo Gonçalves, na Cidade Baixa, é difícil localizar fachada, muro ou portão que não tenha sido danificado.

Entre a esquina com a Rua General Lima e Silva e o cruzamento com a José do Patrocínio, 65 das 70 casas e prédios contados pelo ZH Pelas Ruas têm pichações. O número equivale a 92% das construções da quadra. A vista poluída entristece moradores como a aposentada Laura Teixeira, 71 anos - que também se revolta com a violência no bairro.

- Nós nos sentimos impotentes de lutar sozinhos contra esses vândalos - destaca.

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Helena Titton, 79 anos, mora na rua desde 1949. Conta que conheceu uma Lopo Gonçalves "tranquila, limpa e bonita", mas calcula que já faz duas décadas que apareceu a primeira pichação na fachada da sua casa. Nos últimos 10 anos, segundo ela, o problema se agravou:

- Já tive de pintar mil vezes. Arrumei ano passado e em 20 dias já estava suja de novo.

Helena conta que sua vizinha da frente é ainda mais insistente e cismou em enfrentar os pichadores. Assim que eles grafavam na fachada, ela apagava.

- Acho que foi umas quatro vezes isso. Agora, ela desistiu.

E demonstra resignação:

- Fazer o que, minha filha?

O muro do prédio onde mora o advogado Dilmar Saraiva Belchior, 50 anos, foi pintado há algumas semanas, mas já foi pichado. Ele destaca que a poluição visual no bairro é tão grande que chega a ser inviável identificar a arquitetura dos prédios, muitos deles antigos. Já a estudante Marília Sinnott, 31 anos, fica até com medo de passar pela rua.

- Nunca sabe se ele está ali pichando, se vai te assaltar. Ou os dois.

Luiz Pithan, comandante da Guarda Municipal, destaca que a melhor ferramenta para combater este crime é a denúncia, pelo fone 153.

- A gente não pode estar em todos os lugares para identificar esse tipo de coisa, então contamos com a participação da comunidade.

Nos registros da Guarda Municipal, são poucas as denúncias realizadas na Lopo Gonçalves. Há apenas ocorrências de 2014, com duas denúncias e uma detenção. Na Cidade Baixa, no ano passado, foram 13 denúncias.

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Luiz lembra ainda que, em 2015, a Guarda Municipal realizou 113 atendimentos do tipo em toda a cidade e, em 28 destes, teve êxito, realizando a detenção de 62 suspeitos. Quando apreendidos em flagrante, os infratores são encaminhados à delegacia mais próxima e podem ser presos ou liberados, dependendo da ficha criminal, diz Luiz. Eles podem responder por dano ao patrimônio ou ao ambiente. De acordo com o art. 65 daLei de Crimes Ambeintais, "pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano" pode render detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa.

"Solução é um sonho que ficou pra trás", diz pesquisadora

Alice Prati, restauradora, pesquisadora e autoria da obra SOS Monumento: Causas e Soluções, explica que a Cidade Baixa é bairro cultural e de "efervecência", e por isso é alvo de pichadores, que buscam visibilidade. Para ela, o problema não é isolado, a Rua Lopo Gonçalves "é um retrato da cidade":

- A pichação fugiu do controle em Porto Alegre.

A pesquisadora destaca que, há pelo menos dez anos, a cidade está "completamente pichada", e o problema não diminui. O que reduziu, na opinião dela, é a disposição dos moradores para combater essa infração e denunciar. Para ela, diante de problemas graves na saúde e, principalmente, na segurança pública, "a solução da pichação é um sonho que ficou para trás".

Alice lembra que em 2015 a Câmara de Vereadores aprovou um Projeto de Lei Complementar (PLC) que determina que autor terá de "eliminar as marcas da pichação e pintar integralmente a edificação ou o monumento" avariado. Destaca que se trata de uma conquista, mas que, como toda a ferramenta, "não anda sozinha".

- A Guarda Municipal e a Bigada Militar levam o caso à Polícia Civil, depois vai para Judiciário e Ministério Público. Mas se não estão fazendo isso com ladrão e assassino, imagina com pichação.

Alice diz que sua maior preocupação se dá com o próprio pichador, que muitas vezes arrisca sua vida para deixar sua marca em lugares altos, e destaca a função da educação. Ela conta visitou uma escola da Capital onde os alunos sabiam ler os sinais de pichação.

- É preciso fazer cumprir a lei e ir na escola "vacinar".


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