Encare a crise
Como evitar gastos com combos de telefone, internet e TV a cabo
Para evitar dores de cabeça, saiba quais são os deveres das operadoras e os direitos dos consumidores
Celso Cabral procurou o Procon depois que o combo contratado dobrou de preço de um mês para o outro. Foto: Diego Vara, Agência RBS
Celso Cabral não teve dúvidas quando ouviu de um vendedor a oferta de um gordo pacote com telefone fixo, internet e TV a cabo. Por um preço quase igual ao que pagava por seu antigo serviço de TV por assinatura, receberia o combo completo. Topou na hora.
O primeiro mês foi uma maravilha. No segundo, o preço já subiu 53% - passou de R$ 169 para R$ 259. No terceiro, alguns canais sumiram da programação. A busca por esclarecimento conduzia a um jogo de empurra: quando ligava para o atendimento da operadora, ouvia que precisava ligar para o setor de telefonia. No setor de telefonia, mandam procurar o departamento de TV a cabo. E estava criado um ciclo capaz de tirar qualquer um de sintonia.
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- Resolvi cancelar, mas diziam que eu iria quebrar o contrato. Fiquei em uma situação complicada, porque, se quisesse cancelar apenas um serviço, teria de cancelar todo pacote, e perderia ao mesmo tempo telefone, internet e TV - diz Cabral, funcionário público, que não queria abrir mão do serviço porque seu filho pequeno gosta de assistir aos desenhos animados da TV fechada.
A operadora passou então a argumentar que aquele pacote não existia mais e teria sido vendido por um representante já descadastrado. A solução seria pagar um combo mais caro. Sem conseguir acordo desde maio passado, Cabral procurou o Procon no final de janeiro deste ano, e o caso ainda aguarda definição.
A exemplo dele, muitos consumidores se acostumaram: na tentativa de contratar um plano de internet, são convencidos pelas prestadoras a levar o pacote todo de serviços, com TV a cabo e telefone fixo. Afinal, os adicionais custam só um pouco a mais - e parecem realmente valer a pena. Só que os combos ainda são alvo de contradições, e muitos contratos terminam em briga de clientes e operadoras em órgãos de defesa do consumidor. Os problemas são a burocracia para alterar ou cancelar os pacotes, a eventual indução para serviços desnecessários e reclamação de venda casada - quando clientes são obrigados a comprar o combo para ter internet mais rápida ou canais em HD, por exemplo.
- Não há nada de errado em oferecer o combo, pelo contrário, ele foi criado para baratear os serviços ao cidadão - explica o diretor-executivo do Procon de Porto Alegre, Cauê Vieira. - O problema é a conduta de algumas operadoras, que não deixam claro quais são as condições de contratação e podem levar alguns consumidores a crer que precisam pagar por todo o pacote.
Uma contradição dos combos é quando o cliente procura um serviço específico e descobre que, pagando pelo conjunto todo, gastará menos. É um estranho desequilíbrio de preços, que leva à contratação de serviços desnecessários.
- Na prática, o cliente acaba pagando por algo que não vai utilizar, pois, mesmo que isso não seja explicitado, os valores de cada serviço irão pesar na fatura - diz a coordenadora institucional da associação de consumidores Proteste, Maria Inês Dolci.
Essa prática comercial flui às margens da legislação: nem o código de defesa do consumidor nem a lei do setor de telecomunicações obriga as empresas a manter um equilíbrio rigoroso nos preços dos serviços. Os órgãos de defesa do consumidor alertam que o cliente tem total liberdade de contratar os serviços em separado e saber quanto custaria cada um. O que for diferente disso pode ser interpretado como venda casada.
Procurado pela reportagem, o Sinditelebrasil, sindicato que representa as operadoras, informou que "as prestadoras, nossas associadas, todas reguladas, têm como premissa respeitar as regras vigentes".
Pouca concorrência leva a problemas de atendimento
A concentração de mercado em poucas mãos contribui para que os combos nem sempre atendam às necessidades dos clientes - e ainda tragam uma fatura salgada -, avaliam especialistas no setor de telecomunicações. No Rio Grande do Sul, apenas cinco operadoras oferecem serviço de telefonia móvel, e, nos quase 500 municípios gaúchos, há somente 23 empresas de internet nativas. Quanto aos combos, são quatro grandes companhias atuando no Estado: Claro, Net, Oi e GVT.
- A maior parte das empresas de TV a cabo e internet é pequena, sem capacidade de investimento em redes e transmissão. Não conseguem concorrer com as líderes - explica o professor de redes de computadores e telefonia Almir Meira, da Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap).
Com menos concorrência, algumas práticas nem sempre bem recebidas pelos clientes acabam virando regra. Uma delas é a grade pré-programada de canais na TV por assinatura. Mesmo que um consumidor assista a quatro ou cinco canais, terá de arcar com o custo de dezenas de outros que jamais assistirá.
- Existe uma questão técnica que dificulta a entrega de canais avulsos, porque nossa rede de fibras e cabos leva à transmissão conjunta de todos canais. Daria para mudar essa tecnologia, mas isso custaria caro - afirma Meira. - Como todos concorrentes fazem a mesma coisa, as prestadoras ficam em uma zona de conforto.
Sindicato prevê mais canais avulsos
A prática daqui é diferente à de Estados Unidos e Ásia, em que as redes são estruturadas em uma tecnologia que possibilita a contratação individual de canais, o TCP-IP (Transmission Control Protocol/Internet Protocol) - isso ocorre em menor escala no Brasil com o pay-per-view. Por aqui, a lei não obriga as companhias a oferecer canais individualmente.
O Sinditelebrasil traz uma notícia boa aos usuários. Conforme posicionamento enviado pelo sindicato à reportagem, a concorrência no Brasil levará as operadoras a ofertar canais exclusivos para atender a nichos de mercado. "Os fornecedores de infraestrutura, seja de rede fixa ou de satélite, estão ampliando suas ofertas para suportar esta evolução da demanda", informa a entidade, sem falar em datas ou prazos.
A ampliação de serviços de streaming têm pressionado as empresas a se readequarem, avaliam especialista em tecnologia e também direitos do consumidor. Ante a concorrência da Netflix, algumas das maiores operadoras de TV por assinatura investem mais em serviços por encomenda e ampliam as redes de TCP-IP, em que o usuário pode escolher o horário dos programas preferidos.
- Hoje o mercado se movimenta por outros meios, com serviços de streaming e aplicativos, e isso é extremamente salutar para sair da polarização nos serviços de telecomunicação - argumenta o diretor do Procon de Porto Alegre, Cauê Vieira.