Violência
Especialistas contestam dados de queda de violência contra mulher
Para eles, em vez de queda na violência, pode ter havido redução das notificações
Especialistas avaliaram números da Secretaria da Segurança Pública (SSP) publicados este mês no Diário Oficial do Estado sobre agressão contra mulheres. Os indicadores, divulgados em reportagem de ZH na terça-feira, Dia Internacional da Mulher, apontam redução de 43,21% nos estupros, de 8,91% nas lesões corporais e de 7,97% nos assassinatos ocorridos entre 2014 e 2015. Aqueles que contestam os números, dizem que, em vez de queda na violência, pode ter havido redução das notificações.
A socióloga Margarete Panerai comenta que no mundo apenas 35% das vítimas prestam queixa na polícia. No Brasil, segundo ela, o percentual cai para 10%:
– Não é possível afirmar se houve redução da violência. Pode ter acontecido subnotificação. Os dados estatísticos podem, também, ter sido mal coletados.
Leia mais:
Mais de 40% das agressões contra a mulher envolvem alguém do convívio social
Violência doméstica mata 5 mulheres por hora diariamente em todo o mundo
Para não morrer, mulheres agredidas se exilam em "casa invisível" na Capital
Secretaria defende metodologia atual
A presidente do conselho da ONG Themis, Fabiane Simioni, também desconfia dos números da SSP, sob alegação de que são de interesse da secretaria indicadores reduzidos:
– Sempre temos certa desconfiança quanto ao modo como são registrados esses casos. São números não confiáveis, pois eles (SSP) produzem dados quanto ao próprio trabalho.
Em nota, a SSP disse que “trabalha em linha de transparência e total profissionalismo na elaboração das estatísticas relacionadas aos indicadores de criminalidade e produtividade das forças policiais” e que “os dados publicados no Diário Oficial seguem os mesmos padrões de aferição, tabulação e revisão dos indicadores publicados de acordo com as normas do Sinesp (Secretaria Nacional de Segurança Pública)”.
O mestre em Ciências Criminais e vereador de Porto Alegre, Alberto Kopittke (PT), diz que o Estado precisa criar novos instrumentos de avaliação da violência e não se basear apenas nos registros da polícia. Kopittke, que entre 2006 e 2007 foi assessor especial do então ministro da Justiça, Tarso Genro, e diretor da Secretaria Nacional de Segurança Pública em 2011, cita a pesquisa de vitimização como exemplo:
– O método utiliza entrevistas cientificamente adequadas que apontam o número de pessoas que sofreu violência, e não que foi na polícia registrar.
Falta de estrutura leva mulheres a omitirem denúncias oficiais
A redução do efetivo policial, estrutura inadequada das delegacias e dos centros de referência e o despreparo de servidores são citados como fatores que provocam inibição nas mulheres.
O titular da Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos, César Faccioli, admite que uma parcela das vítimas procura atendimento na rede pública de saúde, mas não faz o registro policial. Segundo Faccioli, para corrigir esse problema está se investindo em capacitação dos profissionais da saúde para que orientem as vitimas a notificar os órgãos de segurança pública.
No entendimento de Fabiane Simioni, da ONG Themis, combater o despreparo dos servidores, principalmente da área de segurança, deve ser prioridade para reduzir a subnotificação.
– Desestimula querer denunciar, mas chegar na delegacia e ver um agente assoberbado de trabalho, sem instrução e que pergunta: “Mas com que roupa você estava quando foi estuprada? Isso é hora estar na rua?”.
A delegada Claudia Cristina Santos da Rocha Crusius, coordenadora das Delegacias de Polícia Especializadas no Atendimento a Mulher (Deams) do Estado, garante que os agentes da rede de proteção à mulher são capacitados:
– Orientamos os plantonistas a serem o mais isentos possíveis.
Em relação à estrutura das 22 Deams, ela argumenta que há esforço do Estado para oferecer um espaço privativo às vítimas:
– Mas nem sempre se consegue isso. Os prédios não são adequados para ouvir depoimentos.