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Ar pesado

Pesquisa indica que fumo passivo pode ser prejudicial mesmo em ambientes abertos

Levantamento do Hospital Moinhos de Vento mostrou que fumódromo ao ar livre tinha ar mais poluído do que o normal

13/03/2016 - 04h00min

Atualizada em: 13/03/2016 - 15h50min


Camila Nunes
Camila Nunes
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Embora diversos estudos já tenham comprovado a associação direta entre a exposição involuntária à fumaça do cigarro em ambientes fechados e o aumento do risco de doenças pulmonares e cardiovasculares, pouco se sabe sobre os efeitos do fumo passivo em lugares abertos. Mas uma pesquisa do Hospital Moinhos de Vento, feita em parceria com a Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), trouxe um indício de que ficar exposto às substâncias tóxicas do cigarro em áreas ao ar livre também pode causar prejuízos para a saúde.

A pesquisa teve duas frentes. Na primeira, um aparelho foi usado para medir a qualidade do ar na área onde fumar era permitido, localizada no bosque do hospital. Foi feita uma comparação com o espaço ao lado, onde o cigarro era proibido. O fumódromo apresentou uma média de 66mcg/m3 de partículas respiráveis no ar (poeira que tem capacidade de chegar até o pulmão), com picos de 900. Do outro lado, durante os 10 dias de coleta, as médias foram inferiores a 25, índice preconizado como aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

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Em um segundo momento, os pesquisadores fizeram um biomonitoramento nas plantas que ficavam próximas ao fumódromo e em vegetais 40 metros distante. Nas que se localizavam perto do ambiente onde o cigarro era permitido, houve uma grande concentração de metais pesados como alumínio, ferro, zinco e cobre, – de 10 a 15 vezes mais em relação ao local não exposto ao fumo. O estudo verificou que, nessas plantas, ocorreu uma mutação no desenvolvimento do pólen, ao contrário das que se estavam na área ao lado.

– Entre a maioria dos fumantes existe a crença de que fumar ao ar livre não faz mal. Embora a gente não tenha feito um estudo direto sobre a saúde dos humanos, indiretamente conseguimos determinar que o fumo em ambientes abertos leva a uma grande concentração de materiais particulados, o que consequentemente significa um ar de pior qualidade, além de provocar uma modificação direta na genética das plantas. Queremos reproduzir a pesquisa na metade de 2016, após um ano do fechamento do fumódromo, para verificarmos se houve alterações – diz Sérgio Amantea, coordenador da pesquisa.

A fumaça que sai do cigarro e se difunde no ambiente tem até 50 vezes mais elementos cancerígenos do que a fumaça inalada pelo fumante. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a fumaça do cigarro tem aproximadamente 4.720 substâncias tóxicas diferentes, que se constituem em duas fases fundamentais: a gasosa e a particulada. A primeira contém, entre outros, o monóxido de carbono, que dificulta a oxigenação do sangue.

Já a segunda possui alcatrão (composto com 40 substâncias comprovadamente cancerígenas formado a partir da combustão dos derivados do tabaco) e nicotina, considerada uma droga psicoativa que causa dependência e age no sistema nervoso central como a cocaína, por exemplo. A diferença é que a nicotina age de maneira mais rápida: chega ao cérebro entre 7 e 19 segundos.

Luiz Carlos Corrêa da Silva, presidente da Comissão de Tabagismo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, reconhece o valor, sob o ponto de vista ambiental, da pesquisa feita pelo Hospital Moinhos de Vento, mas prefere adotar cautela ao falar de possíveis danos do fumo passivo em ambientes abertos:

– Nada se pode afirmar objetivamente com relação à saúde humana. Para isso, seriam necessárias observações sequenciais, por longo período de tempo, com grupos de pessoas que frequentassem por tempo prolongado estes locais, com medidas específicas de parâmetros de saúde. Estas condições são difíceis de se conseguir.

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Uma das diretrizes da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT) da Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que não existe nível seguro de exposição ao cigarro. Isto é, por menor que seja o contato, o risco de que as pessoas venham a desenvolver uma doença associada ao tabagismo é real, de acordo com a OMS.

Mas nenhum estudo ainda foi feito no sentido de apresentar números que evidenciem a probabilidade de que isso aconteça em lugares ao ar livre.

– Pode ser que, em algum momento, a gente tenha como comprovar que algumas pessoas, em situações específicas de maior exposição à fumaça em ambientes abertos, podem ter doenças. O que já se sabe é que a fumaça é tóxica e, por algum tempo, ela permanece acumulada no ar, diluindo-se mais rapidamente do que em lugares fechados – declara Tania Cavalcante, coordenadora da Secretaria Executiva da Comissão Nacional para Controle do Tabaco/Inca.

José Roberto Jardim, pneumologista da Universidade Federal de São Paulo (USP), faz um alerta aos pais fumantes:

– Crianças pequenas, filhas de pais fumantes, têm risco maior de desenvolver doenças respiratórias. Então, é claro que se a mãe ou o pai segurarem o filho enquanto fumam, esse bebê vai ser contaminado pelas substâncias tóxicas do cigarro, mesmo que eles estejam em um ambiente aberto.

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