Meio ambiente
A crise chegou ao lixo: reciclagem cai 25% em Porto Alegre
Redução na coleta seletiva de lixo causa demissões e faz despencar até os salários dos recicladores nas 17 unidades de triagem da Capital.
Os números comprovam que nem o lixo de Porto Alegre escapou da crise econômica. Nos primeiros oito meses do ano, Porto Alegre recolheu 9.160 toneladas de recicláveis. A quantidade é 25% menor do que no mesmo período de 2015. Como consequência, 134 dos 734 postos de trabalho foram fechados nas 17 unidades de triagem da Capital entre janeiro e agosto deste ano. E em 11 delas os salários despencaram no mesmo período.
A queda no consumo, o aumento do desemprego e a consequente diminuição de material reciclável para coleta são apontados como os fatores que afetam diretamente a cadeia da reciclagem na Capital.
No início deste ano, a Unidade de Triagem (UT) Nova Chocolatão, na Zona Leste, era exemplo de confiança num futuro longe dos carrinhos e das carroças de coleta de resíduos, como mostrou reportagem publicada pelo Diário Gaúcho em janeiro.
Oito meses depois, a realidade está distante do previsto pelos jovens filhos de catadores que comandam a UT. A lista de espera por uma vaga na unidade tem mais de 60 inscritos. Porém, segundo o presidente da cooperativa, Flávio Januário, 21 anos, não há previsão de novas contratações a longo prazo. O turno da noite, previsto para iniciar neste ano e que contaria com mais 20 associados, foi cancelado.
– A situação está horrível. Recebíamos até 12 cargas por dia. Agora, a gente precisa agradecer quando chegam duas cargas. Estamos trabalhando apenas meio turno por falta de material. O nosso salário reduziu R$ 400 e a previsão é diminuir ainda mais, se os resíduos não entrarem – admite a recicladora e tesoureira da unidade Jéssica da Silva Borges, 24 anos.
A crise não poupou nem a unidades mais tradicionais de Porto Alegre, como a Rubem Berta, na Zona Norte, existente há 23 anos. Desde janeiro, a UT perdeu cinco dos 35 funcionários e teve o salário reduzido pela metade. Para enfrentar a maré baixa, a coordenadora do grupo, Rosana do Amaral, 32 anos, optou pelo trabalho em meio turno.
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– Para piorar a situação, a população não respeita o nosso trabalho. Perdemos muito material que vem misturado com fraldas descartáveis e absorventes, o que impede a reciclagem. Dependemos deste trabalho para sobrevivermos. Nem assim as pessoas tomam consciência do mal que fazem a nós e ao meio ambiente.
Infração e multa
Segundo o diretor-geral do DMLU, Gustavo Fontana, a crise financeira no país desencadeou os problemas mais sérios na reciclagem.
– O desemprego levou muitos trabalhadores para o mercado informal. Hoje, há mais catadores nas ruas do que em anos anteriores. Alguns estão motorizados, usando carros e caminhões, e competindo diretamente e injustamente com quem atua nas unidades de triagem e faz um trabalho organizado – explica.
Gustavo diz que nas unidades o material é devidamente reciclado e o que sobra é descartado no aterro sanitário de Minas do Leão. Já os recicladores informais selecionam o que interessa a eles e descartam o rejeito em qualquer lugar. Desde julho, a prefeitura intensificou a fiscalização da coleta clandestina de recicláveis. O código municipal de limpeza urbana considera infração gravíssima a coleta irregular de material reciclável destinado à coleta seletiva nas ruas de Porto Alegre. Quem for flagrado cometendo a infração recebe uma multa de R$ 5,2 mil e pode ter o veículo removido, se ele estiver com a documentação irregular.
– Os irregulares precisam entender que há famílias dependendo deste material da coleta seletiva. Eles podem fazer parte das unidades de triagem, mas preferem seguir na clandestinidade para não seguirem regras – afirma o diretor-geral.
R$ 1,2 milhão no lixo
Outro problema constatado pelo DMLU e que influencia diretamente na produção é a falta de conscientização ambiental da população. Por dia, 300 toneladas de recicláveis são despejadas erroneamente na coleta domiciliar e nos 144 contêineres espalhados pela cidade, o equivalente a R$ 1,2 milhão mensal que não são embolsados por quem trabalha na função.
– Se todos fizessem sua parte não misturando os resíduos, não haveria falta de material nas UTs, pois quase que triplicaríamos a quantidade de recicláveis nos galpões conveniados – argumenta Gustavo.
Campanha para conscientizar população
Para sensibilizar a população sobre a importância de descartar corretamente os resíduos sólidos, o DMLU lançou no ano passado a campanha ReciclaPOA. Agentes ambientais treinados por técnicos do DMLU e pela ong Mãos Verdes visitam moradores, comércio e escolas buscando estimulá-los a separar os resíduos recicláveis e entregá-los à coleta seletiva. Em final de setembro de 2015, 100% das ruas da cidade passaram a ter coleta seletiva.
O novo serviço também passou a atender três vezes por semana a totalidade dos bairros Independência, Bom Fim, Farroupilha, Cidade Baixa, Auxiliadora, Mont'Serrat, Bela Vista, Moinhos de Vento, Rio Branco e Praia de Belas. Parte dos bairros Floresta, Santa Cecília, Santana, Azenha, São João, Higienópolis, Petrópolis e Menino Deus também tiveram o serviço ampliado para três vezes por semana. As melhorias incluíram ainda alteração de rotas e renovação de toda a frota.Outra ação é o curso Chega de Lixo oferecido para síndicos, zeladores, porteiros, professores e educadores, com orientações sobre como separar os resíduos e descartá-los. A Assessoria Comunitária do DMLU trabalha nas periferias orientando as pessoas com a questão da limpeza urbana.