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Papo reto

Manoel Soares e o homem que afirma ser ladrão por profissão 

Ao tirar o que era dos outros, ele dividia a única coisa que tinha de fato: a dor da perda

27/05/2017 - 07h01min

Atualizada em: 27/05/2017 - 07h01min


Usar a desgraça para advogar em causa própria é uma atitude que me embrulha o estômago quando falamos do crime. Mas observar a vida das pessoas me faz aprender muito sobre a matemática dos fatos da vida. Conversei com um cara que disse ter a profissão de ladrão. Sim, com a maior cara de pau, ele me disse, sentado em uma praça, que roubar era seu ofício. Não tentei dar lição de moral porque, se ele vê nisso um trabalho, já deve ter ouvido todo tipo de sermão.

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Preferi entender de onde vinha aquele senso equivocado de direito a tirar o que é dos outros. Como boa parte das verdades que defendemos vem do momento em que conhecemos o mundo, comecei a falar da minha infância com esperança de que ele falasse sobre a da dele. Aos poucos, foi abrindo que seus primos eram todos certinhos, que até faculdade tinham, mas que era tudo fachada. Eu me fiz de louco e defendi os primos, até que ele segurou em meu braço e me questionou o porquê da defesa.

Olhei nos olhos dele e perguntei por que achava que podia tirar o que era dos outros. Ele disse que a sua mãe pagou os estudos do sobrinho, que tirava boas notas, que o pai foi assassinado e que quase tudo que ele amava não ficava com ele. Antes que eu continuasse o papo, levantou, me mandou tomar naquele lugar e saiu.

Entendi que ele me xingou porque fiz ele ver o porquê de seus roubos. Queria que todo mundo sentisse a mesma dor que ele sentiu ao perder oportunidades, pessoas que amava e chances de ir além. Ao tirar o que era dos outros, ele dividia a única coisa que tinha de fato: a dor da perda.



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