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Estudantes visitam escolas para passar mensagens de valorização da cultura negra e de diversidade

Grupo, batizado de Empoderadas IG, começou após professora perceber que seus alunos não se reconheciam como negros

20/11/2018 - 08h00min


Elana Mazon
Elana Mazon
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Félix Zucco / Agencia RBS
Jovens ajudam uns aos outros na hora de valorizar os crespos

A Sala de Artes da Escola Municipal de Ensino Fundamental Alberto Pasqualini, na Restinga, na Capital, ficou lotada durante a tarde de segunda-feira (19). Alunos e professores da instituição receberam a visita do projeto Empoderadas IG, da Escola Estadual Ildefonso Gomes, do Santana, também de Porto Alegre, para uma tarde de empoderamento e valorização da cultura negra.

O Empoderadas IG, formado por 20 jovens com idades entre 13 e 17 anos, começou em 2016 e dedica-se a trabalhar questões como diversidade, empoderamento feminino, cultura negra, racismo e homofobia na própria escola e em outras instituições da Capital. Mas tudo começa com a autoestima dos participantes. A ação de ontem ocorreu na véspera do Dia da Consciência Negra, celebrado hoje. 

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Em um primeiro momento do encontro, visitantes e anfitriões se apresentam. Integrantes do Empoderadas contam como falar sobre autoestima mudou suas vidas em depoimentos que reforçam a necessidade de lutar contra qualquer tipo de preconceito. Em seguida, vem uma sessão de beleza e de troca de experiências: guris e gurias se embelezam, ganham maquiagens coloridas e aprendem penteados que valorizam o volume dos fios.

Uma das "professoras" do dia é Manoela Viana da Silva, 14 anos. Ela conta que, aos oito anos, foi a um salão de beleza com a intenção de diminuir o volume dos cachos. Saiu do local com os fios lisos e decidiu, contra a vontade de sua mãe, Patrícia, passar a alisar o cabelo sempre.

– Eu fazia escova progressiva a cada três meses e chapinha todos os dias. Foi assim até os 12 anos. Eu não gostava muito daquilo, mas quando me olhava no espelho com o cabelo liso, me achava bonita– conta ela.

Félix Zucco / Agencia RBS
Manu levou mais de um ano para retomar seus cachos

Aos 12, Manu conheceu, na internet, meninas que passavam pela mesma situação e decidiram abandonar a chapinha – processo chamado de transição capilar. Foi aí que decidiu, também, assumir seus cachos, hoje exibidos com todo o orgulho:

– O apoio da família foi muito importante nesta época. Deu muito trabalho, levou um ano para ficar como está agora! Quando estava começando a minha transição, entrei no IG, e também foi ótimo para o processo.

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Multiplicadores

Para ela, dividir o que estuda e aprende no Empoderadas é a melhor parte do processo.

– Aqui, a gente se preocupa não só com a aparência. Mas com o interior, com a cultura, com o que podemos aprender. Hoje, tu vê as meninas do grupo empoderadas, cacheadas, mas cada uma de nós tem uma história. Aos poucos, viramos borboletas. Por isso, sair da minha escola e levar o projeto para outros lugares é uma coisa maravilhosa.

Um dos primeiros meninos a integrar o grupo foi Neemias Ismael Domingues, 16 anos, aluno do nono ano do Ildefonso Gomes. Hoje, ele e seu cabelo black power exibido com todo o estilo são referência para outros guris. Mas nem sempre foi assim. 

Félix Zucco / Agencia RBS
Encontros com alunos de outras escolas servem para trocar experiências

– Na minha escola era assim: meninos negros de cabelo raspado e meninas negras de cabelo alisado. O que a gente busca é a aceitação. Isso vem com o tempo _ conta ele, que enxerga mudanças além da aparência:

– Falar sobre o nosso cabelo, mostrar que é bonito ser assim, é uma isca para falar de outros assuntos. Muda tudo na nossa vida. Quando tu se aceita, passa a ver as coisas diferentes. Aprendi que não posso julgar o outro, pois não sei o que ele passa.

Entre os estudantes que participaram do projeto, a aceitação não poderia ter sido melhor.

– Todo mundo aqui tem a mesma dor, as mesmas discussões. Quando a gente fala sobre isso, podemos transformar em felicidade. Nossa escola já é bem aberta ao debate, mas precisamos falar bem mais racismo – diz Robson Melo Gomes, 15 anos, do nono ano do Alberto Pasqualini.

Félix Zucco / Agencia RBS
Neemias foi um dos primeiros guris a entrar no projeto

Idealizadora

Quem deu vida ao Empoderadas IG foi a professora de Educação Física Luciane Dornelles Ramos, 33 anos, que atualmente conta com a ajuda de outras duas professoras na empreitada.

– Quando eu entrei na escola, percebi que meus alunos não se reconheciam como negros. Senti a necessidade de trabalhar estas questões com eles, e o Empoderadas IG surgiu, em 2016 – conta ela.

As visitas em outras escolas começaram quando uma instituição pediu que ela fizesse uma palestra sobre o projeto, e Luciane decidiu levar seus alunos. Para que os estudantes virassem referências, foi um "pulo":

– Eles viram multiplicadores. Me sinto realizada quando vejo eles falando para outros jovens. Eu me seguro para não chorar! 


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