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Ônibus municipais

Estudantes e cobradores preparam ações contra mudanças no transporte público

Projeto que visa limitar benefício a estudantes com renda de até três salários mínimos está na Câmara desde 2017. Contrários à aprovação, movimentos estudantis solicitaram audiência pública sobre o tema

24/05/2019 - 05h00min

Atualizada em: 26/09/2019 - 17h15min


Alberi Neto
Alberi Neto
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Mateus Bruxel / Agencia RBS
Benefício para estudantes pode ser limitado por renda familiar

O pacote de medidas do governo municipal enviado para Câmara de Vereadores em 2017 voltou à pauta nesta semana. A razão foi o mais polêmico dos seis textos, aquele que trata do fim da meia passagem para estudantes com renda acima dos três salários mínimos.

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Na semana passada, a representação do governo na Câmara informou que o projeto deveria entrar na lista daqueles privilegiados para votação nos próximos meses. Outro texto polêmico que deve receber a mesma prioridade por parte da administração do prefeito Nelson Marchezan é o que retira a obrigatoriedade da presença dos cobradores nos ônibus municipais.

Diante da novidade, movimentos estudantis se reuniram com a Frente Parlamentar em Defesa do Meio Passe, liderada pelo vereador André Carús (MDB), e também com a presidente da Casa, vereadora Mônica Leal (PP). No encontro, foi requisitada uma audiência pública para discutir especificamente o projeto que atinge os estudantes. Presidente da União Metropolitana dos Estudantes Secundários de Porto Alegre (Umespa), Vitória Cabreira saiu feliz com o resultado da reunião.

— A audiência pública será marcada, conforme a presidência nos garantiu. Queremos mostrar aos vereadores como este projeto é prejudicial para os estudantes — explica Vitória.

A presidente da Câmara diz que deferiu a realização da audiência na quarta-feira. A vereadora acredita que o edital do pedido deve sair na próxima semana. Depois, disso, há um prazo de 20 dias para realização do encontro.

— É uma situação preocupante, tudo que a gente não quer é uma evasão escolar que pode ser gerada pela retirada deste benefício. A audiência é importante para isso, para os vereadores conversarem com os estudantes — explica Mônica.

Tribuna

Além da audiência pública, os estudantes solicitaram também uma Tribuna Popular para abrir o debate com a sociedade sobre o projeto. 

— A presidente encaminhou os pedidos. Também solicitamos e deve ocorrer, na próxima semana, uma reunião entre a base do governo e as entidades estudantis. É importante demonstrar à prefeitura os problemas que essa mudança traria — adianta Carús, líder da frente parlamentar. 

No sistema em vigor, os estudantes não precisam comprovar renda quando solicitam o cartão TRI escolar. Por isso, não há número certo de quantos jovens podem ser afetados com a medida. Atualmente, 40 mil estudantes utilizam o benefício, conforme dados da Umespa, entidade responsável pela emissão do cartão aos secundaristas da Capital. Segundo a presidente da entidade, dados da própria Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) apontam que haverá perda de usuários com o corte do benefício:

— Essa queda pode chegar a 50%. Então se, hipoteticamente, temos cem estudantes que usam o meio passe, caso aprovado o projeto, restarão apenas 50 que irão pagar a passagem inteira. Ou seja, o mesmo valor será arrecadado, não vai mudar nada para as empresas. 

A Associação dos Transportadores de Passageiros da Capital (ATP), por meio de nota, afirmou que o critério da renda de até três salários, no caso da meia tarifa para estudantes, "busca tornar o benefício mais justo, considerando que ele será usufruído por quem mais necessita, que são os estudantes carentes".

Cobradores também estão em risco

Félix Zucco / Agencia RBS
Cobradores estão com profissão em risco

Outro texto também está incomodando quem faz parte do sistema de transporte público. Neste caso, os afetados diretamente não são os passageiros. O segundo projeto relacionado aos ônibus é o fim da obrigatoriedade dos cobradores nos ônibus da Capital. Como o texto deve entrar para votação em período próximo ao que trata da meia passagem para estudantes, a classe rodoviária também está se movimentando contra o tema. Segundo o presidente do presidente do Sindicato dos Rodoviários de Porto Alegre (STETPOA), Adair da Silva, a medida irá gerar desemprego e afetará somente os trabalhadores das empresas privadas.

— Dizem que vai ser gradual, mas podem demitir os cobradores quando for aprovado. São 3,6 mil cobradores hoje na cidade. Além disso, quem trabalha na Carris não seria afetado, pois são pessoas concursadas. Por isso, somos 100% contra essa ideia do gestor da Capital, que afeta milhares de pais e mães de família — critica Adair. 

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Para o vereador Cláudio Janta (SDD), essa tentativa de retirada dos cobradores retrata "o atraso de Porto Alegre". 

— Isso foi tentado no Rio de Janeiro e em Curitiba, cidades exemplos do transporte público, e deu errado. Se o motorista de um carro precisa redobrar a atenção ao volante, imagine uma pessoa levando outras cem num ônibus e tendo que prestar atenção nas paradas, embarcar e desembarcar cadeirantes sozinho e ainda ter de cobrar a passagem. Enfim, estamos indo na contramão, não só nesse projeto, mas no das isenções e benefícios também. Não adianta ficar retirando direitos adquiridos. O transporte público é uma concessão, ele tem obrigação de atender a todos —  aponta o vereador.

O parlamentar acredita que a solução passa pela busca de custeio para o transporte junto à União, pois com a concorrência de outros modais, o sistema não terá como seguir se sustentando somente com o dinheiro das passagens.

Gradual

A ATP diz que as funções principais do cobrador, como atender quem paga a passagem com dinheiro e fiscalizar os usuários que utilizam cartões com isenção ou benefício, está sendo substituída por tecnologias como a bilhetagem eletrônica e o reconhecimento facial. Sobre a demissão dos colaboradores, a associação diz que seria  "um processo gradual, não com a demissão, mas a transição e qualificação do profissional, que poderá migrar para outra atividade". O que não ocorreria é a contratação de novos cobradores.

Governo diz que não há priorização

A reportagem tentou ouvir o líder do governo na Câmara, vereador Mauro Pinheiro (REDE). O parlamentar se manifestou por meio de nota. Segundo a assessoria do político, "a discussão sobre os projetos do transporte coletivo ainda não começou na Câmara e está sem previsão de priorização", diferentemente do que foi especulado na semana passada. O governo deve aguardar a audiência pública sobre o tema "antes de consider os temas prontos para votação". 

O Diário Gaúcho também tentou contato com a EPTC, onde os projetos foram elaborados, para atualizar as perspectivas do governo sobre o tema. Entretanto, a empresa afirmou, em nota, que a prefeitura não interfere no Legislativo e a priorização é realizada pelos próprios vereadores.

Vale ressaltar que, mesmo que as mudanças planejadas pela prefeitura calculem o impacto na tarifa, tanto a EPTC quanto a ATP já informaram que isso não significa que a passagem irá baixar de preço. A tentativa é para que os aumentos sejam menores ou que ocorram com mais espaçamento e não anualmente, como tem sido.

Os seis projetos ligados ao transporte público

Aprovados

— Idosos entre 60 e 64 anos perdem gratuidade: projeto revogou a Lei 5624/1985, que dava isenção da passagem a quem tem entre 60 e 64 anos.

— Aumento do tempo de uso de ônibus: permitiu que as empresas utilizem ônibus comuns de até 12 anos (13 para articulados ou especiais). Recentemente, a prefeitura ainda publicou novo decreto dando mais dois anos de vida útil para os ônibus comuns.

— Regras e critérios de uso: estabelece regras e critérios para utilização dos benefícios de isenção tarifária, para dar mais transparência e inibir irregularidades. Também fica autorizada a possibilidade de descontos na compra do passe antecipado e também para todos os usuários do cartão TRI.

Aguardando votação

— Cobradores de ônibus: autoriza o fim da obrigatoriedade em todos os ônibus.

— Passagem escolar: só recebem o desconto de 50% na passagem os estudantes com renda familiar de até três salários mínimos. Reduz o máximo para 50 passagens por mês (hoje, é possível adquirir 75). Professores são excluídos do benefício.

— Isenções para brigadianos e guardas municipais: a isenção da tarifa fica condicionada à apresentação do cartão de isenção emitido pela EPTC e à transposição da roleta. 

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