Notícias



Coluna da Maga

Magali Moraes e o choro da cebola

Colunista escreve às segundas, quartas e sextas-feiras no Diário Gaúcho

04/05/2020 - 09h00min

Atualizada em: 04/05/2020 - 09h00min


Fernando Gomes / Agencia RBS
Magali Moraes

Quando ele vem, deixa rolar. Uma cebola bem cortada provoca um choro sincero e ardido. Não tem como impedir. Me dei conta que essa atividade tão comum no dia a dia é um ótimo exercício de mindfulness (atenção plena). Sabe focar no momento? O choro da cebola nos traz de volta rapidinho: tava com a cabeça no mundo da lua? As lágrimas de uma cebola nos conectam com o presente. Você está aqui e agora. Com uma faca na mão, a cebola na outra e algum dedo coçando o olho.

De todos os tipos de choro, o da cebola é o mais inconfundível. Não tem emoção envolvida, nem tristeza, raiva, mágoa, decepção. Chorar de alegria ou alívio? Também não. Chorar de tanto rir, cortando cebola? Nunca vi. Nenhum coração foi partido. Só a cebola mesmo. O lado bom é que ninguém precisa dar explicação. A cebola aberta é um álibi. Todo mundo entende que é ação e reação. O olho humano e essa hortaliça devem ter alguma questão mal resolvida em vidas passadas, sei lá.

Leia mais colunas da Maga

Infância

Coisa bonita de se ver é homem cortando cebola e chorando. Especialmente se na infância ele ouvia a frase (ou ordem) "Engole esse choro, menino!!". Choro não é comida pra gente engolir. Choro é pra botar pra fora, e não pra dentro. Choro é válvula de escape. É pra não acumular sentimentos ruins. Depois que os olhos desincham, vem o alívio. Chorar faz bem. E é uma habilidade que nos diferencia das máquinas. Se algum robô chorar num filme ou feira de tecnologia, desconfie. Tem truque aí. 

Complicado é cortar cebola usando óculos. O choro embaça a visão, vai que corta o dedo. Seca os olhos ou as lentes? Já vi gente colocando até óculos escuros pra evitar o choro. Deixa a cebola nos fazer chorar. Depois do choro, vem o cheiro. Uma cebola fritando na panela perfuma a casa inteira. Pras mãos, já inventaram solução. Eu implicava com cebola. Fizemos as pazes nessa quarentena. Não tem mais drama na cozinha. Quando tudo isso passar, seguiremos amigas. Eu sempre gostei de chorar.



MAIS SOBRE

Últimas Notícias