Papo Reto
Manoel Soares: "Meus professores não escreveram livros, muitos nem ler sabiam"
Colunista escreve no Diário Gaúcho aos sábados
Essa semana fui chamado por uma faculdade francesa para dar um dia de aula aos alunos deles. Perguntaram quem eram minhas referências, para que os alunos estudassem antes de me ouvir. Disse a eles que meus professores não escreveram livros. Muitos nem ler sabiam direito.
Enquanto falava, lembrei de um dia, há uns 15 anos. Descendo a rua Nossa Senhora do Brasil, às 23h, encontrei o Véio Barriga, um senhor magrelo conhecido no Morro Santa Teresa. Quando jovem, ele era o jogador mais temido dos campeonatos de bairros, dono de uma sabedoria silenciosa que se confundia com timidez, mas só não jogava conversa fora.
Sonhos
Ao me ver, chegando aquela hora depois de entrar cedo na RBS TV, ele me disse: “Relaxa que a bola busca quem treina, você dorme pouco hoje para amanhã poder sonhar.”
Meus olhos marejaram, ele me deu um tapa nas costas e seguiu sua caminhada. Hoje, não está mais entre nós, mas as palavras dele continuam vivas em mim. Levarei ela para todos os cantos.
Ele e todos meus professores de quebradas me prepararam para sonhar alto e levar a dignidade de nossos becos para o mundo. Eles têm sabedoria de reis em corações humildes e merecem nosso respeito. Se não podemos fazer os reis de hoje serem humildes, vamos fazer desses mestres humildes da favela nossos reis.