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Suspensão de vacinação em adolescentes é criticada por especialistas; uso é seguro, afirmam

Dos 3,53 milhões de adolescentes vacinados, 1,5 mil tiveram efeitos adversos, o que representa 0,042% do total

17/09/2021 - 09h13min

Atualizada em: 17/09/2021 - 09h15min


Marcel Hartmann
Marcel Hartmann
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Antonio Valiente / Agencia RBS

Após o Ministério da Saúde divulgar nota técnica na noite de quarta-feira (15) na qual orienta a suspensão da vacinação de adolescentes sem comorbidades contra a covid-19, quatro especialistas da área da infectologia e imunologia entrevistados por GZH criticaram duramente a decisão e destacaram que a aplicação do grupo é segura e eficaz.

Em coletiva de imprensa nesta quinta (16), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, justifica a decisão porque, dentre 3,53 milhões de adolescentes vacinados, 1,5 mil tiveram efeitos adversos, o que representa 0,042% do total. Dentre quem registrou efeito adverso, 95% recebera vacinas não liberadas para a faixa etária, o que é considerado erro de aplicação.

Dos cerca de 3,53 milhões de adolescentes vacinados no Brasil, 3,51 milhões receberam Pfizer, mas 15,6 mil receberam CoronaVac, 10,3 mil receberam AstraZeneca e 806, Janssen. No Rio Grande do Sul, ainda de acordo com a pasta, 57,9 mil adolescentes receberam Pfizer, porém 914 receberam CoronaVac, 838 AstraZeneca e 26, Janssen.

Queiroga ainda citou que uma pessoa morreu após receber uma dose da Pfizer - não está provada relação entre os fatos. Em nota, a farmacêutica destaca que “até o momento, não foi estabelecida relação causal entre o ocorrido e o imunizante da Pfizer”.

O Ministério da Saúde afirmou na nota que a média é de 16 casos de miocardite (inflamação em músculos cardíacos) a cada 1.000.000 de pessoas que recebem duas doses. O risco, considerado baixo, foi levado em conta na liberação de uso da Pfizer em países como Estados Unidos, Israel, Canadá, França, Chile e Itália. 

Os estudos mostram que a Pfizer é segura para adolescentes e os raríssimos efeitos adversos não inviabilizaram a aprovação do imunizante pela Anvisa e pelas agências reguladoras dos Estados Unidos e da Europa, destaca o médico Antonio Carlos Bandeira, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). 

— É um equívoco neste momento propor a suspensão. Essa nota não tem nada técnico, não atende às necessidades que o país encara de continuar expandindo a vacinação até os 12 anos para não ter terceira onda. Ela precisa ser imediatamente revista. É um absurdo. Cada vacina pode ter um efeito colateral, mas muito raro — afirma o médico. 

A decisão é um erro na visão da imunologista Cristina Bonorino, integrante do Comitê de Acompanhamento de Efeitos Adversos do governo do Rio Grande do Sul e professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). 

Ela entende que, se prefeituras aplicaram em adolescentes AstraZeneca, CoronaVac e Janssen, o que não está autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a solução é acompanhá-los e orientar postos de saúde a tomar cuidado a partir de agora, e não suspender a aplicação da Pfizer em todos os jovens sem comorbidades. 

— Os erros vacinais que o Ministério apontou não são razão para suspender a vacinação, e sim para aumentar campanha de esclarecimento. O evento adverso relatado não tem evidência de que esteja ligado à Pfizer. O ministro disse que há eventos adversos de pessoas que receberam a vacina errada, não falou de efeitos confirmados na vacina da Pfizer em adolescentes. Não tem razão para suspender a vacinação — diz a imunologista. 

A situação parece lembrar a suspensão de uso da AstraZeneca em grávidas, porém há uma diferença: naquele caso, a Anvisa recomendou a suspensão de uso nas gestantes, enquanto que, hoje, a agência mantém a recomendação de uso da Pfizer em adolescentes. 

— Eventos de miocardite são algo muito pequeno. Isso dá uma dimensão de que a vacina baseada em RNA mensageiro seja relativamente segura — afirma o médico Eduardo Sprinz, chefe da Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. 

Sprinz acrescenta que, a despeito de o Ministério da Saúde citar que a Organização Mundial da Saúde (OMS) é contra a vacinação de adolescentes, na verdade a entidade diz que eles não devem ser priorizados antes de países pobres aplicarem doses em adultos - o objetivo é incentivar a doação de imunizantes por nações mais ricas.

A médica Raquel Stucchi, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia, destaca que a Pfizer já foi aplicada em milhões de adolescentes ao redor do mundo e que não há relatos de que efeitos adversos graves sejam comuns. 

Se o Brasil vacinou 3,53 milhões de adolescentes, os Estados Unidos já aplicaram a primeira dose em 14 milhões de jovens e a segunda dose em 11,1 milhões, segundo dados do Centro de Controle e Prevenção a Doenças (CDC).

— Não existe risco zero e vacina isenta de toda e qualquer reação, mas a frequência é muito menor do que o risco de adolescentes terem covid grave e serem internados. Se o evento adverso grave infelizmente aconteceu, mas os casos graves e a mortalidade são maiores, manter a vacinação é justificável. Essa nota técnica cria um cenário muito favorável para desinformação e desconfiança, tudo que a gente não precisa neste momento — diz a médica infectologista. 


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