Fora do ar
Apagão do WhatsApp desnorteou usuários e afetou negócios, mas pode servir de reflexão sobre papel do aplicativo na rotina
Especialista afirma que usuários devem ficar atentos aos sentimentos gerados pelo tempo sem utilizar a forma de conexão
Foram seis horas em que muitos se sentiram fora do ar. Sem poder acessar o WhatsApp ao longo da segunda-feira (4), a sensação de quem passa o dia trocando áudios, mensagens e figurinhas pelo aplicativo era de desconexão com o mundo.
O apagão do WhatsApp, junto com o Instagram e o Facebook, provocado, segundo a empresa de Mark Zuckerberg, por uma falha interna no sistema, afetou a rotina de quem vive com os olhos grudados no celular, seja por passatempo, seja para trabalho.
O caso de Enzo Roosevelt Dendena, 20 anos, envolve os dois. Ele ficou mais apegado às redes sociais quando a pandemia o afastou do convívio com as pessoas. Atendente em um escritório de advocacia de Porto Alegre, precisa acessar o WhatsApp da empresa para ler as diversas mensagens e direcioná-las ao advogado da área mais adequada.
Com a queda do aplicativo, Enzo não conseguiu trabalhar, mas também não tinha como se divertir nos 10 grupos de amigos do qual faz parte. Ficou aborrecido.
— Não diria que foi um desespero, mas fiquei entediado, porque não tinha nada para fazer. Então fomos para outra rede social, que é o Twitter — conta.
Enzo até se imagina voltando a ter uma rotina em que não precisa acessar o WhatsApp o tempo inteiro, como era antes da pandemia, mas diz que possivelmente vai sofrer de abstinência, sintoma que ocorre após a interrupção de algo que gera dependência.
— Às vezes, não tem nada para fazer, então abro uma rede social para ver se tem alguma coisa — diz.
A professora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Unisinos Ilana Andretta alerta que quem sentiu raiva, tédio, revolta ou de alguma forma lesado com a instabilidade dos aplicativos precisa ficar atento à possibilidade de estar viciado nas redes sociais. Segundo a profissional, as seis horas de desconexão precisam servir de reflexão.
— O momento de ontem (segunda-feira) é importante para a gente pensar sobre o significado do WhastApp nas nossas vidas. É só isso que nos dá prazer? — questiona.
Para ela, é possível que o WhatsApp seja comparado a uma substância onde muitos encontraram refúgio no século passado: o cigarro.
— O WhatsApp é o novo cigarro dessa nova geração? Antigamente, a gente acendia um cigarro quando ficava angustiado — diz.
Canal com os clientes
O apagão também afetou os negócios de quem usa o WhatsApp para ganhar dinheiro. Vendedora de roupas infantis, Renata Pandolfo tem um bom movimento na sua loja em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, a Silvia Kids, mas é no aplicativo que conquista a clientela: manda fotos de novas peças e tira dúvidas sobre preços e formas de pagamentos. Também recebe mensagens de quem tem dúvidas se, indo até a unidade, vai encontrar essa ou aquela roupa.
Sem Whats, Renata presenciou algo que há muito não acontecia: o telefone fixo da loja começou a tocar. Foram poucas ligações e, nesta terça-feira (5), suas funcionárias ainda respondiam mensagens atrasadas no aplicativo.
— Foi ruim, mas alguns clientes ligaram, outros vieram até a loja — pondera.
Na clínica estética Virtuosa, também em Novo Hamburgo, a comunicação com as clientes acontece principalmente pelo aplicativo, embora o espaço tenha telefone fixo. Para a gerente comercial da unidade, Simone Ribeiro, a terça-feira foi de prejuízos.
— Parou a clínica toda. A gente acabou perdendo um dia inteiro de trabalho. Só recebemos quem já tinha horário marcado.
Especialista em varejo do Sebrae-RS, Fabiano Zortéa afasta a ideia de que o WhatsApp é uma plataforma insegura onde apoiar os negócios, já que quedas de longos períodos como essa são raras. Para ele, os pequenos empreendedores precisam aproveitar essas situações para estreitarem o contato om os clientes.
— É uma grande oportunidade para ligar para o cliente e dizer: como estão as coisas por aí, como posso te ajudar? Convida a pessoa para ir até a loja. É uma demanda social, as pessoas querem se encontrar, precisam interagir, e 90% do que é vendido no varejo ainda é em lojas físicas — diz.