Crescendo raízes
Família planta árvores para os filhos em ponto de encontro no Parque Marinha há 10 anos: "Celebração da vida"
Lembranças da infância inspiraram quatro irmãos a criar tradição para aproximar as crianças da memória do avô
Das centenas de árvores de diferentes tamanhos e tons no Parque Marinha do Brasil, entre o Lago da Saudade e a orla do Guaíba, duas têm um significado especial para uma família em Porto Alegre. Desde 2012, os Pinzkoski plantam uma mudinha naquele local para cada novo bebê que nasce. Matheus e Beatriz, 10 e sete anos de idade, respectivamente, crescem no mesmo ritmo dos galhos cujas árvores foram regadas por quatro irmãos que preservam suas raízes.
— Crescemos aqui no Menino Deus. Por volta dos 10 anos de idade, nosso colégio, a Escola Estadual Euclides da Cunha, nos levava para plantar algumas árvores ali. Sempre tive essa lembrança, e reproduzimos essa experiência para as novas gerações — explica o adestrador de cães Maurício Pinzkoski, 45 anos, pai de Beatriz e Felipe, e tio de Matheus.
O menino mora com os pais nos Estados Unidos. Em dezembro de 2012, ele veio a Porto Alegre para ser batizado em uma igreja da Zona Sul. Maurício e os irmãos já tinham conseguido autorização da administração do parque, com indicação de qual semente plantar, mas não faziam ideia de como fazer isso. Ele lembra que aquela tarde de sol escaldante e a pouca experiência dos irmãos não abalaram a homenagem da família ao novo membro. A localização também tem um significado na história:
— O Matheus e a Beatriz não conheceram o avô Aldoir, meu pai, que morreu pouco antes de o Matheus nascer, em março de 2012. Em vez de lamentarmos a morte, plantamos esse ingá-feijão para celebrar a vida, a memória, e reunir a família. Frequentamos o parque a vida inteira, meu pai e eu caminhávamos por aqui até poucos dias antes de ele nos deixar. Então, escolhi esse lugar para plantar porque fica ao lado do Lago da Saudade — conta Maurício, emocionado.
Com o passar dos anos, a árvore virou, de maneira muito natural, segundo ele, um ponto de encontro da família na Capital. Tanto que o local está até marcado no Google Maps. Quando os irmãos que moram em outros países vêm a Porto Alegre, a árvore é destino confirmado no roteiro de passeios.
— Vamos pelo menos uma vez por mês. Quando quem mora longe vem visitar, é ali que nos encontramos para um dia de parque com chimarrão e as crianças. Quando estão longe, fazemos chamadas de vídeo para mostrar como está a árvore e como estamos todos nós — relata.
Em uma visita na manhã ensolarada de domingo (23), Beatriz, o irmão mais novo, o pai Maurício, a mãe Aline Hart e a avó foram até o ipê-roxo plantado em 2015 para ela. Aos sete anos, correu pela grama alta, admirou as pequenas flores que nasciam perto da sua árvore e chegou até a brincar com os galhos. Ela espera, em um futuro próximo, alcançar os galhos mais altos sem a ajuda do pai.
— Quero que tenha um balanço e um ninho com passarinhos — disse a menina.
Bosque genealógico
Em 2021, a família aumentou ainda mais. Maurício e a esposa ganharam um segundo filho, e um dos irmãos lhes rendeu um segundo sobrinho. Novamente, seguiram a tradição e plantaram árvores para os primos Felipe e Pedro.
No entanto, cerca de dois meses depois, as mudas foram retiradas e levadas do local, de acordo com Maurício.
— Queremos fazer um bosque da família, que todos possam cuidar e usar. Porque depois que nós morrermos, essas plantas vão seguir lá para que outras famílias aproveitem a sombra e momentos de carinho entre si, é uma celebração da vida — reforça Maurício.
Mesmo ainda sem uma substituta para chamar de sua, o caçula da família se diverte na árvore da irmã. Mais audaz que Beatriz, Felipe foi de perto observar as formigas carregando pedaços de folhas recém-cortadas do ipê. Destemido, ameaçou abocanhar algumas ainda no tronco, para susto dos pais, que o observavam de perto.
Responsabilidade ecológica
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) explica que não são todas as espécies de vegetais que podem ser plantadas em qualquer lugar sem supervisão das autoridades. É necessário que seja feito um pedido de autorização à pasta, assim como descrito por Maurício e seus irmãos, em 2012, para que haja a correta orientação sobre qual espécie e local são indicados para uma nova árvore crescer.
Plantas que dão frutos grandes, como abacates ou jacas, por exemplo, não são indicadas para áreas públicas, devido ao risco de acidentes causados por quedas das frutas. Maurício acredita que tenha sido este o caso da árvore plantada para o filho mais novo, Felipe, hoje com um ano e sete meses.
Segundo a Secretaria Municipal de Parcerias (SMP), atualmente existem 72 praças e outras 126 áreas verdes complementares adotadas pela iniciativa privada em Porto Alegre. Pessoas físicas e empresas podem adotar e cuidar de jardins, canteiros ou pequenos parques e de sua vegetação, o que pode ser feito por meio do site da pasta.
O próprio Parque Marinha do Brasil, ponto de encontro dos Pinzkoski, passa por estudos que devem transformar a área em objeto de parceria público-privada (PPP) a partir de um edital a ser elaborado pela prefeitura. Neste link é possível verificar a situação de outras 688 praças que estão disponíveis para adoção na Capital.