11 bairros da área central
Por que pessoas em situação de rua evitam abrigos em Porto Alegre mesmo em dias de frio e chuva
Entre a madrugada e o amanhecer do dia 17 de junho, a reportagem de Zero Hora contabilizou um pouco mais de 370 indivíduos debaixo de marquises, em barracas improvisadas e enroladas em cobertores





Debaixo de marquises, em barracas improvisadas e abrigadas apenas por cobertores, centenas de pessoas passam a noite nas ruas de Porto Alegre. Entre a madrugada e o amanhecer do dia 17 de junho, a reportagem de Zero Hora percorreu as principais vias de 11 bairros da área central e contabilizou um pouco mais de 370 pessoas em situação de rua em meio a alertas de temporais (veja detalhamento abaixo).
Mesmo em meio ao temporal, com vento e frio, sobraram vagas nas estruturas municipais que atendem pessoas em vulnerabilidade social. Naquele dia, eram 250 vagas disponibilizadas em três albergues e outras 120 no Ginásio do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), aberto para a Operação Inverno no bairro Santana.
— O perfil da nossa população de rua são homens, em idade economicamente ativa, que têm a questão de uso de álcool, drogas ou problema de saúde mental, que acabam dificultando esse processo de organização delas em saírem da rua. Por isso, nossa dificuldade também — disse o secretário de assistência social de Porto Alegre Mateus Xavier.
Outra dificuldade apontadas para o convencimento das pessoas é o horário de funcionamento dos locais, que até então era das 19h às 7h. Para esta semana, com previsão de temperaturas mais baixas, a prefeitura de Porto Alegre anunciou ampliação de vagas e horários de funcionamento.
— São questões relacionadas à saúde mental, questões à drogadição, que não conseguem se organizar ou ter uma adaptação às rotinas ou regras de determinados espaços, ou sofrem com abstinência e acabam não aderindo ao serviço. Temos também problemas relacionados ao horário, por exemplo, os albergues funcionam das 19h às 7h — avaliou o promotor Leonardo Guarise Barrios, da promotoria de direitos humanos.
Como vai funcionar
A partir desta segunda (23), o ginásio do Demhab vai funcionar das 19h às 9h, com 120 vagas. Na quarta (25), um novo abrigo emergencial será aberto na Rua Comendador Azevedo, no 4º Distrito, também das 19h às 9h. Serão 150 vagas, com possibilidade de ampliação de até 250 conforme necessidade.
Ônibus gratuitos também irão fazer o transporte dos acolhidos entre o ginásio do Demhab e o Centro Pop da Avenida João Pessoa pela manhã, com retorno às 17h.
Como estão os bairros centrais
A maior concentração de pessoas dormindo na rua durante a última noite foi registrada no Centro Histórico, onde estavam 196. Gente sozinha ou em grupos, como na Avenida Alberto Bins, onde 30 pessoas se abrigavam embaixo de um viaduto. Na Borges de Medeiros, entre a Riachuelo e a Jerônimo Coelho, eram nove dormindo em barracas nas paradas de ônibus. Até mesmo agências bancárias abertas 24 horas são usadas como dormitório. Em pelo menos duas unidades, havia pessoas dentro abrigadas com cachorros.
Nos bairros Bom Fim, Cidade Baixa, Farroupilha e Santana, a reportagem contabilizou 60 pontos onde a rua virou moradia. Em frente a uma loja de pneus da Avenida Ipiranga, próximo à Rua Santana, chama a atenção um grupo de cerca de 15 pessoas que ocupa a calçada, lado a lado, todas as noites.
Entre elas está Fábio Porto da Rosa, 34 anos, que vive na rua desde a enchente, após perder o que tinha no Humaitá. À reportagem, ele contou que diariamente precisa encontrar onde possa se abrigar para dormir. Mesmo assim, acaba não indo para os albergues municipais em razão das regras.
— A gente chega umas 19h já para dormir. Às 6h, tem que sair para rua, com chuva ou não. Existem muitas regras no albergue que não aceitamos. Acaba que não vale a pena porque ficar um dia e voltar não me permite olhar para frente para que eu possa sair da rua — contou.
Nos bairros Azenha, Menino Deus e Praia de Belas, as pessoas estavam mais dispersas. Algumas barracas reunidas foram encontradas na Avenida Getúlio Vargas com a Erico Verissimo, junto à entrada do Abrigo Municipal Marlene, e no terminal de ônibus da Azenha. Por ali, eram seis pessoas em uma barraca. Ao todo, foram encontrados 55 locais onde alguém dormia nas ruas nessas áreas, incluindo ainda parte da Medianeira, nas imediações do Olímpico.
Acolhimento
Também existem outras modalidades de acolhimento, como o Auxílio Moradia. Até o mês passado, 86 pessoas recebiam o valor de R$ 700 por mês para pagar moradia e alimentação. Agora, o número de beneficiados será ampliado para 536. Nas casas de passagem, são cem vagas abertas para pessoas encaminhadas pelas equipes da assistência social. A expectativa é que mais 150 lugares sejam ofertados em três novas cassa com prazo de 120 dias.
— Essas pessoas que estão no auxílio moradia recebem um recurso, escolhem o local onde querem morar, seja na casa de um vizinho, seja aluguel que consiga. E tem um acompanhamento técnico mensal pensando num plano de superação da rua. As casas de passagem, da mesma forma, com atendimento 24 horas para que as pessoas pensem num plano de superação — explicou Xavier.
Conforme o promotor Leonardo Guarise Barrios, foi observado também um evento pós-enchente, que envolve pessoas que começaram a passar mais tempo nas ruas por conta dos danos em suas moradias.
— São pessoas que perderam as residências e passaram a conviver em situação de rua, e outras que mesmo tendo as residências, ela não se tornou espaço muito habitável e a pessoa perdeu seu emprego. Então ela usa a residência mais para dormir e acaba ficando como andarilho durante o dia.
Veja a lista de locais e como acionar serviços:
Segundo a Secretaria de Assistência Social, são 10 equipes de abordagem social circulando pelas ruas para oferecer acolhimento nos abrigos. A população também pode solicitar o atendimento pelo telefone 156.
Abrigos noturnos emergenciais (das 19h às 9h)
- Santana - Ginásio do Demhab (rua Conde D'Eu, 66);
- 4º Distrito - rua Comendador Azevedo, 264, a partir de quarta-feira (25)
Serviços: dormitório; alimentação; e cuidados de higiene. Aceitam animais.
Albergues noturnos (das 19h às 7h)
- Albergue Dias da Cruz – Avenida da Azenha, 366 – Bairro Azenha
- Albergue Acolher I – Rua Dr. João Simplício, 38 – Bairro Vila Jardim
- Albergue Acolher II – Rua Morretes, 345 – Bairro Santa Maria Goretti