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Vilã adorada

Discreta na vida pessoal, Nathalia Dill não esconde opiniões políticas

A atriz conquistou público e crítica com a antagonista Fabiana em A Dona do Pedaço

05/08/2019 - 10h50min


Nathália Carapeços
Nathália Carapeços
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Fabio Audi / Divulgação
Para Nathalia, o trabalho em novela é prioridade, mas confessa que é difícil não se deixar afetar por questões políticas

Inspirada em duas personagens de sucesso da teledramaturgia – Carminha, de Avenida Brasil (2012), e Laura, de Celebridade (2003) –, Nathalia Dill está conquistando o público e a crítica como Fabiana em A Dona do Pedaço, novela da faixa das 21h da TV Globo. A imersão na ficção é tanta que ela torceu o pé recentemente e atribuiu o acidente à carga pesada do papel, em entrevista ao site Uol. 

Criada por freiras, Fabiana cresce sonhando com a família que não conheceu até que descobre, pela televisão, a sua irmã, Virgínia, interpretada por Paolla Oliveira

A boa moça é tomada pelo rancor e se transforma na medida em que se aproxima da irmã. Mas a personagem de destaque do horário nobre não é a primeira vilã interpretada por Nathalia.

Em sua estreia na emissora, em 2007, a atriz conquistou o público com a personagem Débora Rios em Malhação. Nesses mais de 10 anos de carreira, vieram outros papéis de antagonistas, mas Fabiana trouxe um novo desafio para a atriz. 

– Quando me convidaram, sabia que ela teria uma curva dramática interessante. Foi um dos grandes motivos para eu aceitar – comentou em entrevista à Revista Donna por telefone.

A aceitação do público tem sido positiva. Em uma cena que foi ao ar em junho, na qual atua sozinha durante um ataque de fúria, houve quem alçasse Fabiana ao topo das vilãs da década nas redes sociais. Os noveleiros estão “amando odiá-la”, bem como Nathalia gostaria que acontecesse.

Fabio Audi / Divulgação
Atriz se posiciona a favor de causas feministas

A atriz conta que, mesmo nos papéis de mocinhas, busca contradições para explorar e fugir de estereótipos. Discreta com sua vida pessoal, Nathalia não se furta de se posicionar sobre temas como representatividade feminina ou sobre política e questões sociais. 

– O artista consegue colocar luz em questões que ficam obscurecidas pela sociedade. Tento ter parcimônia. Quando estou na novela, o trabalho tem que estar à frente. Mas é difícil não se deixar afetar. 

A atriz apoia causas feministas e conta que as novas formas de comunicação contribuíram para que a luta das mulheres se fortalecesse. Ela entende que, por muito tempo, o feminismo sofreu o pior tipo de repressão, a ridicularização, apesar de ainda hoje ser necessário. 

Para Nathalia, movimentos como o uso da tag #MeuPrimeiroAssédio ajudaram a levantar reflexões importantes para as mulheres. 

– Comecei a me questionar e a falar sobre coisas que estavam adormecidas. Quando a gente não fala, não evolui o pensamento. 

A seguir, conheça mais sobre o que pensa essa carioca, neta de gaúcho, que curte um friozinho e adora ler – e ainda compartilha dicas de livros para as nossas leitoras.

O público tem se surpreendido com a Fabiana porque parecia que ela não seria tão má assim. Como você recebe essa reação? E fazer vilã, você curte?

Quando me convidaram, sabia que ela teria uma curva dramática interessante. Foi um dos grandes motivos para eu aceitar. Na verdade, isso de separar vilã, heroína e mocinha… Acho que a curva tem que ser interessante. Quanto mais você pesquisa e se desafia, mais o trabalho fica interessante. Não tenho essa divisão “gosto de fazer vilã, gosto de fazer mocinha” ou mesmo “gosto de fazer cinema ou teatro ou televisão”. Para mim é tudo uma coisa só, que eu tenho muito prazer. Busco o desafio que me representa. Meu medo era as pessoas não acreditarem na virada quando eu começasse no convento, de freira. Pensava: “Será que as pessoas vão comprar isso sabendo como ela vai ser no final?”. Fico feliz de causar a surpresa.

Como estão sendo as gravações da novela? E sua relação com nomes como Paolla Oliveira? 

É a minha quarta novela com a Amora (Mautner). A última que fiz já tem seis anos. É como se estivesse voltando para casa, reencontrando a proposta dela, o jeito como ela lida, a condução Amora de ser. Sou muito fã do trabalho dela. Nunca tinha trabalhado com o Walcyr (Carrasco) e sempre quis porque ele é um autor popular, interessante. E estou tendo outros reencontros legais, a Agatha Moreira (de Orgulho & Paixão…), a Monica Iozzi (de Alto Astral), a Paolla Oliveira, que eu não conhecia mas tinha muitos amigos em comum. É uma alegria enorme conhecer o trabalho dela, que é superdedicada, a gente se conecta muito. Tem ainda as Natálias: eu, a Natália do Valle e Nathalia Timberg. Uma galera de Orgulho & Paixão.

Você já interpretou mais de uma mulher forte na TV, que foge ao estereótipo mesmo sendo a mocinha – a Elizabeta de Orgulho & Paixão era um pouco assim. Qual a importância de ter esses perfis mesmo na ficção, que ajudam a desconstruir a imagem da mulher frágil? Você percebe esse perfil em evidência?

Victor Pollak,TV Globo / Divulgação
Nathalia e Paolla trabalham pela primeira vez juntas

Fico muito feliz de saber que o leque se expande também nos personagens de boa índole. Porque o vilão tem um leque colorido de emoções e facetas, é engraçado. Isso é algo que gostaria que acontecesse com a Fabiana: que as pessoas amassem odiá-la. É mais plural. Os heróis ficam mais contidos, têm uma ética moral a preservar, não podem tudo. Agora todo mundo está tendo um pouco de cuidado para tentar deixar o herói o mais plural possível, ele é múltiplo. Esse é um trabalho que tento fazer desde o início. Desde a Santinha (de Paraíso, 2009), que era doce, mas ao mesmo tempo tinha uma força muito brutal, de se desvincular daquilo (que vivia), de querer o homem pelo qual era apaixonada. Sempre busquei puxar essa parte um pouco escondida para deixar o personagem mais plural. Sempre achei que as mocinhas têm um colorido, e é só cavar que se acha.

Você também é uma mulher que se posiciona. É engajada no movimento feminista, fala de política em suas redes sociais. Você acha importante usar sua visibilidade para levantar bandeiras, provocar discussões?

Acho que o artista consegue colocar luz em questões que, às vezes, ficam obscurecidas pela sociedade. Consegue fazer com que as pessoas tenham um novo olhar sobre aquilo que está propondo. O trabalho do artista é subverter a ordem. Artisticamente, politicamente, de qualquer forma que seja, o artista está sempre subvertendo. No momento em que estamos, é difícil deixar isso de lado, separar as coisas. Uma hora vai bater na gente, não tem jeito. 

Eles estão ditando as nossas vidas. Claro que tem que ter uma parcimônia, não pode ser muito radical, mas é impossível não falar nada. Somos todos cidadãos brasileiros e do mundo. Tento ter parcimônia: quando estou na novela, o trabalho tem que estar à frente. Mas é difícil não se deixar afetar. O feminismo foi o movimento mais ridicularizado na História. O movimento negro continuou persistente e ávido, mas o feminismo foi mais ridicularizado, e é a pior forma de você oprimir. Lembro, nos anos 1990, de mulheres dizendo: “Quero que o homem abra a porta para mim, quero ser machista”, como se as mulheres não precisassem lutar mais, como se fosse uma luta boba. E hoje vemos cada vez mais que não. O feminismo é para todos, homens e mulheres. Não é só para mulheres, é muito mais amplo.

Como você enxerga o momento que vivemos hoje como mulheres? 

A internet tem um papel fundamental. Os movimentos começaram pela internet. Para mim, foi um grande momento de percepção e reflexão. Passei a pensar sobre coisas que não pensava, e atribuo totalmente à internet, às novas formas de mídia, de diálogo, como por hashtags como a #MeuPrimeiroAssédio, (que ajudaram a gente a) começar a falar, conversar e despertar. Isso foi muito forte para mim. Comecei a me questionar e a falar sobre coisas que estavam adormecidas, e quando a gente não fala, não se questiona, vai ficando tudo ali escondidinho. Quando não falamos, não evolui o pensamento. As redes sociais tiveram papel fundamental. Nunca fui muito conectada, mas hoje é impossível. 

Fabio Audi / Divulgação
Para a atriz, o feminismo é uma luta de todos

O que busquei foi a minha forma de me conectar. Descobri vozes que se igualam à minha e consegui ter mais voz e colocar minha opinião. Antes não tinha como, era sempre por meio de um veículo e sempre fica um telefone sem fio, um pouco distorcido. Hoje é legal porque você pode colocar exatamente suas palavras. É um despertar mesmo. São conversas que estão em voga, e algumas pessoas criticam dizendo que “é só porque está na modinha”. Mas que bom que está na moda, que estamos falando sobre isso. Que bom que pela primeira vez estamos assistindo à Copa do Mundo (feminina). O feminismo é plural, não é só para as mulheres, é para todas as minorias, está atrelado ao movimento negro, ao movimento LGBTQI+. E tem bandeiras feministas também para os homens, como a defesa da ampliação da licença-paternidade. É uma luta de todos.

Você é discreta. Considera-se mais reservada mesmo ou foi uma forma que encontrou para lidar com a fama sem misturar trabalho e vida pessoal?

Não curtia muito a internet porque não entendia essa parte da exposição pessoal. Nunca gostei, acho que ninguém gosta de se expor... Sei lá, na verdade (risos). Nunca gostei de expor minha vida, o que estou fazendo, as pessoas que estão à minha volta… Na época em que comecei, não tinha muito rede social, era mais a questão dos paparazzi, sempre muito incômodo. 

E eu pensava: “Por que vou me expor mais ainda mais numa rede social?” (risos). Acho tão estranho! Para mim era muito confuso: se eu não queria que um paparazzi me perseguisse, por que vou me expor? Mas, a partir do momento em que fui percebendo que havia outra forma de dialogar, de trocar com o público, não só expondo o que estou fazendo mas meus pensamentos, fui me interessando mais. Até pelo trabalho mesmo, acompanho a novela pelo Twitter. Com isso, fui ficando mais à vontade para expor um pouquinho a minha vida pessoal. 

Você não parece ser muito adepta a padrões sociais e culturais. Em entrevistas em que comentou sobre o planejamento do seu casamento com o músico Pedro Curvello, você falou sobre não fazer uma cerimônia na igreja, por exemplo. É uma forma de fugir da glamurização dos casamentos? Essa decisão de ter uma comemoração mais íntima é uma forma de manter a essência de vocês como casal?

Na verdade, eu não dei entrevistas falando do casamento. Não é uma coisa que eu saí falando por aí, ao contrário (risos). As pessoas têm essa necessidade de saber e eu acabo respondendo. Não acho que tenha a ver com o público, mas eu acabo cedendo um pouco. Mas não é uma coisa da qual gosto de falar. 

Nunca fui tradicional mesmo. Se posso fugir um pouco, fazer algo da minha essência, eu faço. Quando comecei a ver cerimônias que celebravam o amor, o encontro, as famílias, os amigos, pensei que seria legal. Não preciso ir à igreja com um padre para dar um ok. Posso juntar as pessoas de que gosto, minha família, amigos e celebrar o amor. 

Dia desses, você fez um #tbt com o Caio Castro sobre a participação de vocês em Malhação, sua estreia na Globo. Já faz mais de 10 anos. A Nathalia de hoje é muito diferente daquela que começou? Olhando para trás, há coisas que faria diferente?

Foi muito legal reencontrar o Caio, porque a gente nunca mais trabalhou juntos. Tento manter a vivacidade, a alegria de estar trabalhando. É uma coisa que sempre quis, um sonho que realizei. Fico muito feliz. A diferença é que, claro, passei por muitas experiências. Sinto que não fui eu que mudei, mas a partir do momento em que fui conhecendo pessoas, ganhei mais experiência mesmo. Sei lidar e reconhecer situações que antes não conhecia, são menos surpresas hoje.

Fabio Audi / Divulgação
"O feminismo está aí para a gente se aceitar"

Desde que você entrou no mundo artístico, já foi capa de revistas várias vezes, fez ensaios, e hoje temos as redes sociais com força. Como lida com as pressões estéticas? Acha que discutimos mais abertamente a importância de desconstruir padrões de beleza? 

Comecei a fazer esses ensaios depois que entrei na televisão, não como modelo antes. Sempre foi muito atrelado ao meu trabalho na TV. É claro que é legal a gente se sentir bem, e se incomodar quando depara com nossos defeitos. Esses dias saíram fotos minhas das quais não gostei, mas pensei: “O feminismo está aí para isso, para a gente se aceitar”. No discurso é mais fácil, mas na prática, você tem que se lembrar desse discurso.

Falando sobre moda, há vários vídeos seus tricotando nas suas redes sociais. Sua relação com a moda passa por colocar a mão na massa? 

Tudo que a gente consegue fazer é muito interessante, e reutilizar também. Tento viver de uma forma sustentável, fugir daquela moda de sair comprando um monte de coisas e jogando fora tantas outras. Não consigo fazer todas as minhas roupas (risos). Comprar de algum amigo, de uma marca menor, colocar meu dinheiro em uma economia mais periférica é minha forma de ser mais sustentável. 

Você já disse que curte frio e sua peça Fulaninha e Dona Coisa passou por aqui no final do ano passado. Como é sua relação com o Sul? 

Meu avô era gaúcho. Fui umas duas vezes (para o Estado). Mas eu adoro, queria tomar mais chimarrão na vida (risos). Queria ir mais. Meu sobrenome é daí, tenho família aí ainda. Sou friorenta, mas gosto do frio, a gente fica mais arrumadinha.

*Colaborou Marcela Donini

Direto da estante de Nathalia: conheça os livros preferidos da atriz

Leitora voraz, Nathalia Dill costuma dividir com seus seguidores indicações de livros. 

A pedido de Donna, a atriz compartilhou três dicas de obras que a fizeram refletir recentemente:

Divulgação / Divulgação

Nix, Nathan Hill
(Editora Intrínseca, 672 páginas, 2018) 

“Nix é maravilhoso! É um romance, mas trata um pouco da política americana, que é exatamente o que estamos vivendo no Brasil”.

O Que É Lugar de Fala?, Djamila Ribeiro
(Editora Letramento, 96 páginas, 2017)

“O Que É Lugar de Fala? é bem incrível, fiquei apaixonada!”.


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Mulheres De Cinzas, Mia Couto
(Editora Companhia Das Letras, 344 páginas, 2015)

“Mulheres de Cinzas é o primeiro livro de uma trilogia que Mia Couto está escrevendo. É muito legal porque nós, que fomos colonizados, nunca nos relacionamos com outros países colonizados. Ele escreve sobre um português que vai para Moçambique no século 19, e a visão dele é muito parecida com a de alguém que estivesse vindo para o Brasil. Me identifiquei, fiquei muito tocada.”


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