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"Chegou a hora”

Com mais de 30 anos de história em Porto Alegre, videolocadora fechará as suas portas em 2022

Acervo com mais de 30 mil títulos foi colocado à venda pelo proprietário do espaço, que apostará em outro empreendimento

23/09/2021 - 10h58min

Atualizada em: 23/09/2021 - 10h58min


Carlos Redel
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Mateus Bruxel / Agencia RBS
E o Vídeo Levou fica atualmente no bairro Jardim Botânico, em Porto Alegre, e marcou gerações de apreciadores de cinema

Em 1989, quem perdesse um filme no cinema e quisesse o vê-lo, deveria esperar alguns anos para ver na televisão ou, então, alugá-lo. E, naquela época, o formato que possibilitava isso era a fita VHS, que reinava absoluta no mercado. Assim, com a popularização dos videocassetes, os irmãos Álvaro e Edla Bertani decidiram abrir, em Porto Alegre, um promissor negócio: uma videolocadora. Surgiu, naquele ano, no bairro Jardim Botânico, o pequeno palácio cinéfilo chamado E o Vídeo Levou — uma referência ao clássico ...E o Vento Levou (1939). Agora, 32 anos depois, essa história está se aproximando dos créditos finais.  

O local, ao longo dos anos, desfrutou do auge do VHS e também o viu ser descontinuado para dar espaço ao DVD, no começo dos anos 2000. E o que parecia que iria revolucionar o mercado do home video, e chegou até a oferecer um grande impulso para o mercado, veio acompanhado da popularização da internet e da pirataria, que foram prejudicando aos poucos o negócio. Houve ainda uma tentativa de aumentar a definição dos filmes e, com isso, manter a mídia física viva com o Blu-ray, mas era tarde. 

Da última década para cá, o digital dominou, levando as antes populares videolocadoras a fecharem as suas portas. Mas, mesmo contra todas as possibilidades, a E o Vídeo Levou resistiu bravamente, como um herói dos filmes de ação dos anos 1990, em meio à era do streaming, com vendas de títulos para colecionadores e ainda conseguindo manter locações para clientes fiéis. Porém, a saída de produtoras do mercado de mídia física consideradas principais, como a Disney, que passou a priorizar o próprio streaming, inviabilizaram o negócio. 

— Foi uma tecnologia que durou 40 anos, do início com o VHS, ao fim. Se pararmos para pensar, foi bastante tempo. Então, já era esperado. Há 10 anos, a gente diz que vai fechar, mas as vendas começaram a crescer, substituíram as locações e foi indo. Temos clientes fiéis que nos acompanham há mais de 30 anos, mas, com o fim das produtoras e sem produto físico para oferecer para eles, aí não teve jeito — relata Bertani. 

Assim, o tradicional espaço cultural de Porto Alegre começou um processo para encerrar as suas atividades colocando os seus mais de 30 mil títulos, distribuídos em dois andares do edifício, à venda. E a previsão é que o lugar, que antes chegou a contar com 16 funcionários e hoje tem apenas quatro, finalize a sua história no primeiro semestre de 2022.

Mateus Bruxel / Agencia RBS
Em 2019, Álvaro Bertani organizava o acervo de filmes na locadora E o Vídeo Levou

A despedida 

O edifício que abriga os milhares de DVDs e Blu-rays de filmes, séries e shows fica localizado na Rua Itaboraí, número 550, e, ao entrar no local, é como se a pessoa embarcasse em uma viagem no tempo: as caixinhas com os títulos ficam caprichosamente repousando nas prateleiras do lugar, que é decorado com cartazes das mais variadas produções.  

Ao escolher quais longas vão para casa, o cliente precisa pegar o estojo e levar ao balcão, ser atendido e, se a ficha estiver em dia, então, é liberado. Se não devolver na data destacada na notinha, tem multa, é claro. Essa experiência, agora com a saída de cena da E o Vídeo Levou, vai se tornando cada vez mais apenas uma história que será passada de uma geração para outra. Quem viveu, viveu. 

E, apesar deste clima de despedida, Bertani não quer que as visitas dos clientes sejam melancólicas. Segundo ele, que ficou sozinho no comando da loja após sua irmã Edla se aposentar, haverá uma transição gradual, em que a videolocadora vai, aos poucos, cedendo espaço para um novo empreendimento que assumirá o prédio, que é seu: uma agência de intercâmbio cultural.

— Atendemos, praticamente, três gerações aqui. E é uma pena que um acervo gigantesco como esse vai se espalhar por aí, mas o período de aceitação da decisão já passou. E, agora, só quero agradecer aos clientes. Trabalhei, praticamente, a minha vida inteira aqui, com eles. Mas, infelizmente, chegou a hora — lamenta Bertani. 

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