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Cintia Moscovich sobre Suassuna: "Um gentil rapsodo"

Escritor de 87 anos sofreu AVC e passou por cirurgia, mas não resistiu e morreu nessa quarta-feira

23/07/2014 - 18h09min

Atualizada em: 23/07/2014 - 18h09min


Cíntia Moscovich
Cíntia Moscovich
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O escritor Ariano Suassuna, 87 anos, morreu nesta quarta-feira no Recife.
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Um gentil rapsodo

Na década de 70, em pleno regime de exceção, parte de nossos intelectuais e artistas vivendo no exílio, Ariano Suassuna significou um legítimo farol não só em termos de manutenção da cultura popular, como na afirmação de uma - até então - pouco delineada identidade nacional. 

Mentor do Movimento Armorial, uma dessas iniciativas tão geniais quanto graciosas e que pretendia, segundo ele, "uma arte brasileira erudita a partir das raízes populares de nossa cultura", Suassuna incendiou o imaginário de pelo menos duas gerações. Lutando contra a vulgarização das manifestações populares, pregava a integração de todas as artes, da literatura à tapeçaria, valorizando a tradição. Aqueles que, como eu, éramos adolescentes por essa época e vivíamos fora do eixo Rio-São Paulo (lembrando que as viagens eram caras e internet sequer se cogitava), descobrimos que, no nordeste do país, havia mais que berimbaus: do agreste e árido se levantavam, por exemplo, os acordes do Quinteto Armorial (e pouco depois do Quinteto Violado), que ao lado de instrumentos rústicos como a rabeca,  o pífano e a viola sertaneja, reunia violinos, flautas e violas. Era a coisa mais original que se havia escutado até então e, no entanto, era-nos tão familiar e tão brasileiro.

Como autor, Suassuna foi um gentil rapsodo, que reuniu várias histórias da literatura popular oral e as adaptou às formas eruditas. Seja como dramaturgo, a exemplo do que se passava n'O Auto da Compadecida, ou como romancista, notadamente em Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, nosso Ariano estabeleceu uma ponte entre o sertão mítico e o lendário ibérico, impregnando o conjunto de brejeirice e gravidade e fundando temas e arranjos híbridos que reuniam o melhor de dois mundos.

De personalidade boníssima, simpatia solar, lotando auditórios onde quer que se apresentasse, Suassuna deixa um legado de harmonia entre o folclórico, o popular e o erudito, um exemplo de amor à tradição, além de um tremendo apreço ao país e àquilo que há em nós de brasilidade.





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