O Povo da Copa
Metalúrgico de Canoas faz brotar até campinho de futebol em meio ao asfalto
Ex-dependente químico ajudou a construir dois centros terapêuticos na Região Metropolitana
Se neste sábado a Seleção precisar de um exemplo para ultrapassar a aguerrida equipe chilena, pode se espelhar no metalúrgico Adilson Benitz Ferrão, 37 anos, do Bairro Rio Branco, em Canoas. Ele fez brotar até campinho de futebol em meio ao asfalto da Rua Avaí, onde mora há 17 anos.
Adilson coleciona momentos de superação. O maior deles é contabilizado todos os dias: há 11 anos, o metalúrgico se considera um dependente químico em recuperação. Dos 13 aos 26 anos usou maconha, cocaína e álcool em abundância. Só parou quando viu a mulher Daniela, hoje com 33 anos, deixar a casa com o filho do casal nos braços.
- Naquele momento, percebi que era hora de mudar ou acabaria morrendo sozinho. Busquei a internação numa comunidade terapêutica. Fiquei nove meses - recorda.
A reaproximação com a família ocorreu ainda no período da internação, e nunca mais se rompeu.
- É uma batalha diária. Sem o apoio da minha mulher, do meu filho e dos meus amigos isso seria impossível. Família é o alicerce - reconhece.
Seleção virou vício
Como agradecimento pela recuperação, Adilson ajudou a construir dois centros terapêuticos na Região Metropolitana - em Gravataí e em Sapucaia do Sul - e atuou na liderança da comunidade onde se recuperou, em Sapiranga. Até hoje, encaminha dependentes de Canoas para os três locais.
- Sinto que tenho o dever de ajudar, já que fui ajudado quando mais precisei. Mas meus únicos vícios são o Grêmio e o Brasil - garante o metalúrgico, enquanto beija o escudo da camiseta da Seleção.
Bandeira do Brasil no lugar de pichação
Apaixonado por futebol, Adilson sempre quis ver a vizinhança mais unida em torno do esporte. Por isso, pintou um campinho no meio do asfalto da Rua Avaí. Nos finais de semana, quando o movimento de veículos diminui, os vizinhos se reúnem e trocam passes.
Nesta Copa, disposto a apoiar o time de Felipão, o metalúrgico espalhou bandeiras do Brasil pelo quintal e pintou o meio-fio de verde e amarelo. Logo, motivou o vizinho mais próximo.
Aos poucos, cada morador foi colaborando para ampliar a pintura da via. Mas o maior desafio seria superado no dia do primeiro jogo do time de Felipão: mudar as cores do muro pichado em frente à casa dos Ferrão.
Ajudado pelo filho Marlen, 17 anos, e outros dois vizinhos, Adilson desenhou e pintou uma bandeira do Brasil no espaço. Ela ficará exposta independente do Brasil ser campeão nesta Copa.
- Espero que contra o Chile os jogadores da nossa Seleção demonstrem garra até o fim, pois estarão em campo representando a nossa pátria. Que eles possam imaginar quantas pessoas ficarão felizes com esta vitória.
Bolo para comemorar
Por conhecer Adilson desde guri, a vizinha Rose Moraes Goulart, 45 anos, faz parte do grupo de amigos que o apoiou no período mais difícil da vida dele. Também torcedora fanática do Brasil, combinou com o metalúrgico que a cada novo jogo da Seleção nesta Copa o presenteará com um tipo de bolo. Na partida contra Camarões, por exemplo, preparou bolinho de chuva com direito a uma bandeirinha com a foto de todo o time. O ritual ocorrerá também neste sábado.
O combinado é que se o time chegar à final, os dois prepararão um banquete no meio da rua para todos os vizinhos.