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El Sexto

Grafiteiro contesta o regime de Fidel Castro com arte urbana

Nas ruas de Havana, Danilo Maldonado desafia a censura do governo com grafites e recados

29/03/2013 - 23h59min

Atualizada em: 29/03/2013 - 23h59min


Léo Gerchmann
Léo Gerchmann
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Grafite lembra greve de fome do opositor Guillermo Fariñas

Em meio a tantos limites para a expressão de ideias impostos pelo governo cubano, um jovem buscou inspiração na estratégia oficial de usar os murais como plataforma de propaganda pró-regime - só que para criticá-lo.

Há pouco mais de cinco anos, lata de spray em punho, o havanês Danilo Maldonado, hoje com 29 anos, teve a ideia ousada: sair Havana afora pichando muros, paredes e bancos com o instigante nome de "El Sexto".

A repetição das pichações, às vezes contendo apenas a assinatura, outras acompanhadas de críticas a um governo refratário ao contraditório, deu-se como quando, anos atrás, Porto Alegre foi invadida pela jocosidade iconoclasta do personagem Toniolo. A diferença é que muros e paredes, em Cuba, são como sites em um país onde vigora a liberdade de expressão, e o que Maldonado inscreve nos espaços públicos como um blog muito lido.

- Não sei avaliar o quanto repercute o que faço. Não temos pesquisas - ironiza, em entrevista a Zero Hora - Sou essencialmente um grafiteiro, e o grafite é uma coisa pública. Adotei o nome de El Sexto e, quando faço algo, ouço comentários. O governo apaga o conteúdo em poucas horas, para evitar os comentários que sempre surgem. Furei o bloqueio usando os murais como antídoto aos murais do governo.

Sim, El Sexto. Mas por quê?

- Por toda a Havana, se você anda pelas ruas, depara com murais sobre "Os Cinco Heróis" (cinco cubanos que foram presos na Flórida por investigar as atividades antirrevolucionárias, em episódio narrado pelo escritor Fernando Morais em Os Últimos Soldados da Guerra Fria). Pois tive a ideia de criar o personagem El Sexto, que não sou eu, mas o povo cubano, que é o sexto herói - explica.

Maldonado, ex-estudante de Biblioteconomia, que vive da atividade de desenhista (no papel, é claro) e espera seu primeiro filho, define o trabalho de grafiteiro como "diálogo conflitivo": trata-se do conflito entre o governo, com os seus murais que alardeiam os personagens da revolução, e ele, lembrando as imperfeições do regime.

- No início, ninguém entendia. Nem meus pais. Diziam que eu havia enlouquecido. Hoje, com a repercussão do trabalho, já entendem. A verdade é que todos os cubanos que vivem aqui são heróis, ganhando salários que para pouco servem - diz ele.

O custo da ousadia foi de quatro detenções curtas e apreensão de materiais utilizados para a grafitagem - a mais recente prisão ocorreu um ano atrás, quando o hoje papa emérito Bento XVI visitava a capital cubana. Certa vez, ele viu a força da sua pichação: a polícia ficou com seu laptop, e ele saiu por Havana utilizando o recurso simples que aprendeu a explorar: pichou muros pedindo a devolução do aparelho. E, por fim, o obteve de volta.

Amigo da blogueira Yoani Sánchez e de seu marido, o jornalista Reinaldo Escobar, Maldonado tatuou nas costas a imagem do ativista de direitos humanos cubano Oswaldo Payá Sardiñas, morto em 22 de julho do ano passado, em um acidente de carro que muitos adversários do regime denunciam ter sido provocado. Tal qual o ídolo que ostenta desenhado entre outras figuras em seu corpo, o grafiteiro é um crítico ao regime, mas um crítico que reconhece conquistas da revolução. Em síntese, trata-se de um opositor moderado, que encontrou nas paredes caiadas de uma Havana que tenta se erguer, a forma de contar ao mundo o que não vai bem no país de Fidel e Raúl Castro.


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