Da dor à luta
Depois de ver o filho morrer à espera de vaga em UTI, casal se mobiliza em passeata pela vida em Campo Bom
Ato público será no sábado à tarde e busca, além de pedir justiça, evitar que drama se repita
Aos 32 anos, casada e com um filho de 11 anos, Adriana Bender Leste voltou a morar com os pais.
Desde domingo, quando o filho de apenas dois dias de vida morreu em um hospital de Campo Bom, à espera de um leito em UTI neonatal, a vendedora não consegue voltar para a própria casa. A dor da mãe, no entanto, está sendo usada como alavanca para encampar uma mobilização.
Chamada de "Passeata pela vida", a manifestação que ocorre sábado no município do Vale do Sinos tem objetivo de pedir justiça pela morte do filho Bernardo, mas, segundo Adriana, também tem uma causa maior. É um alerta para a falta de leitos em UTIs neonatais no Estado, um problema crônico que atormenta gestantes:
- Queremos abrir os olhos da sociedade e das autoridades. Não podemos esperar para abrir o jornal e ver mais notícias de que bebês morreram por negligência. Nenhuma família merece passar pelo que estamos passando agora.
O filho de Adriana com o marido Jéferson José Leste, 31 anos, que moram em Sapiranga, nasceu às 15h30min da última sexta-feira no Hospital Dr. Lauro Réus, em Campo Bom. A cesariana foi feita pela rede privada.
Medindo 49 centímetros e pesando 3,8 quilos, Bernardo teria nascido saudável mas, por ser "gordinho", como a mãe relata ter ouvido dos médicos, teve de ser levado à incubadora, a fim de normalizar os batimentos cardíacos.
- Nem peguei ele no colo, só deu tempo de fazer carinho nele e já o levaram, com a promessa de que isso era normal e que sábado de manhã ele já estaria comigo - conta a mãe.
No entanto, o prazo não foi cumprido. Angustiado, Jéferson passou a exigir informações. No fim da tarde de sábado, os pais receberam a notícia de que o bebê estaria com problemas pulmonares e precisaria ser internado em uma UTI neonatal, serviço que o hospital de Campo Bom não oferece.
Foto: Charles Dias, Especial
A morte veio antes do leito
A central estadual de regulação de leitos explica que o cadastro com o pedido para internação de Bernardo foi feito à 0h2min de domingo, com diagnóstico de pneumonia e sinais de insuficiência ventilatória.
Por meio de nota, a secretaria de Saúde afirmou que "naquele momento, não havia leitos de UTI neonatal disponíveis pelo SUS e nem leitos privados para compra pelo Estado".
Cerca de três horas depois, a família entrou com uma ordem judicial para compra de leito. A central de leitos garante que foram colocadas vagas à disposição na manhã de domingo, mas que não foram aceitos por serem considerados muito distantes, levando-se em conta a gravidade do caso.
Um leito em Canoas teria sido oferecido por volta das 15h30min, mas não houve tempo para a transferência. Por volta do mesmo horário, o menino sofreu uma parada cardíaca, provocada por uma pneumonia, e morreu.
- Esperei 11 anos para ter meu segundo filho, e meu bebê agora está no cemitério por descaso. A única coisa que me faz seguir em frente é o sentimento de justiça - conta Adriana.
A caminhada que ela prepara terá cartazes e camisetas. O ato está marcado para começar às 14h, em frente ao Largo Irmãos Vetter, no centro de Campo Bom. O destino será o Hospital Dr. Lauro Réus.
O caso foi registrado na Polícia Civil, e o delegado Cléber dos Santos Lima abriu um inquérito para apurar os procedimentos médicos adotados. Ele afirma que não pode dar detalhes da investigação, mas que está ouvindo as partes envolvidas. A família pretende, ainda, entrar com um processo indenizatório na Justiça.
Em nota, o hospital afirmou que a criança recebeu total atenção e que informou periodicamente à família sobre a variação do estado de saúde. A instituição ainda afirma que "foram utilizados todos os seus recursos para salvar a vida do bebê, o que infelizmente não foi possível".
Passeata pela vida
- Quando: sábado, às 14h
- Saída: Largo Irmãos Vetter, na Avenida Adriano Dias, no centro de Campo Bom
- Destino: Hospital de Campo Bom Dr. Lauro Reus, na Rua Osvaldo Cruz, 116