Dupla Gre-Nal



Dança dos desempregados

Os desempregados do Gauchão

O fim dos contratos significa no mercado da bola uma legião de desempregados. Um drama que se repete nos campeonatos estaduais pelo Brasil

13/04/2013 - 08h08min

Atualizada em: 13/04/2013 - 08h08min


Quando se fala em jogador de futebol, o torcedor relaciona com negócios milionários, contratos longos, salários de seis dígitos e carros importados. Mas esse lado cintilante pertence a uma minoria. Para a grande maioria, a realidade é diferente. E tende a ficar ainda mais cinza a partir deste domingo, com o fim da fase de grupos da Taça Farroupilha. É quando uma rotina quase trimestral bate à porta desses jogadores.

O Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado calcula que, com oito clubes terminando sua participação no Gauchão neste domingo, quase 300 jogadores, sem contar outros profissionais, entram para o time do Desemprego Futebol Clube - tirando a dupla Gre-Nal, mais de 400 jogadores participaram do Gauchão deste ano. No próximo fim de semana, mais quatro times chegam ao fim da linha, e mais outras dezenas de atletas estarão em busca de um clube. O Diário Gaúcho foi ouvir esses profissionais que, agora, começam a batalhar o ganha pão dos próximos meses para conhecer um pouco dessa dura realidade.

"Futebol é assim mesmo"

- Quando o clube não dá certo, fica numa situação como essa do Santa Cruz (brigando para não cair), o contrato termina e a gente fica desempregado. Futebol é assim mesmo.

O discurso resignado é do atacante Anderson Gomes, 27 anos. Casado e sem filhos, ele diz que a mulher se acostumou com a situação. Depois de cinco anos no Atlético-PR e outros três no Coritiba, de onde saiu em 2007, Anderson rodou por oito clubes. Sem empresário, usa sua rede de contatos, que define como "as minhas amizades". Assim, busca trabalho a cada fim de contrato.

Antes do Santa Cruz, defendeu o Volta Redonda no Carioca de 2012. Parou em maio e só voltou a jogar em novembro, já em Santa Cruz do Sul.

- Consegui juntar algum dinheiro pelos clubes em que passei. Também tenho uma estrutura em Curitiba, onde os amigos me ajudam a treinar e a ficar em forma - conta, para, em seguida, planejar:

- Mas estou pensando em abrir um negócio para ter uma renda paralela e poder me manter financeiramente nesses períodos em que fico sem contrato.

Mercado em números

Cerca de 500 jogadores disputaram a Série A do Gauchão neste ano. O cálculo leva em conta que cada clube formou grupos com 30 jogadores, mais os times B da Dupla. Cerca de 400 jogadores, sem contar a Dupla, tiveram emprego de novembro até agora. Quase 300 desses jogadores ficam sem trabalho a partir de segunda-feira. Outros 100 estarão em busca de um time para jogar na próxima segunda.

Uma situação difícil

Com passagem pelo Inter, onde jogou em 2002 e 2003, vindo do Alagoas com Rubiano e Cleiton Xavier, o alagoano Geninho, 33 anos, vai para mais um período atrás de trabalho. Ele chegou ao Cerâmica no final de 2012 e saírá porque o clube para até agosto, quando reabre o departamento de futebol para a Copa FGF. Enquanto pensa no futuro, busca força para livrar o time do rebaixamento:

- É uma situação difícil essa de, a partir de segunda-feira, estar sem emprego. Mas, antes, temos que tirar o Cerâmica dessa situação.

A semana de Geninho começará com procura de novo emprego.

- O contrato termina em 30 de abril, mas com o fim dos jogos, começo a acionar os contatos.

Sem empresário, Geninho conta com a ajuda da mulher, Greicy Kelli, para buscar um novo clube - ela faz contatos com clubes e envia DVDs. Apesar da situação, o volante mostra certa tranquilidade. Mesmo com três filhos, com idades entre dois e quatro anos, para sustentar. Da sua passagem pelo Jiangsu Sainty, da China, trouxe economias que dão lastro para ficar parado por alguns meses:

- Tenho bom físico, com 15, 20 dias de treino entro em forma.

Para manter-se atlético, Geninho entra em contato com preparadores físicos para pedir exercícios e mantém o ritmo de jogo em peladas perto de casa, em Gravataí.

O volante não tem planos de aposentadoria. Pretende mais uma aventura no Exterior para garantir o futuro:

- Quero tentar voltar para a China e ficar mais uns cinco anos jogando por lá.

"Vou começar a telefonar"

Como o Santa Cruz luta, ao mesmo tempo, contra o rebaixamento e para se classificar para as quartas de final da Taça Farroupilha, o baiano Diego Teles não sabe até quando ficará empregado. Seu contrato pode terminar segunda-feira ou ganhar, pelo menos, mais uma semana. O certo é que começará a fazer contatos pelo Brasil:

- Se não classificarmos, vou começar a telefonar. Tenho alguns conhecidos que me ajudam a procurar outro time.

Com 23 anos, o volante do Galo já planeja o que vai fazer:

- Vou treinar com uns conhecidos, lá em Salvador. Fazer academia e jogar no time de um amigo para manter o ritmo de jogo.

Sem empresário, Diego depende dos contatos que fez em cada um dos poucos clubes pelos quais passou (Bragantino, Chapecoente e Gil Vicente, de Portugal).

O volante não quer repetir a experiência do ano passado. Após disputar o Catarinense, que terminou em maio, pela Chapecoense, foi para Portugal, para um período de testes no Gil Vicente. Acabou reprovado e, após três meses estava de volta. Ficou até novembro na Bahia, sem jogar e à espera de uma proposta.

- Um empresário ligado ao Santa Cruz entrou em contato comigo e vim jogar aqui. Agora, vou atrás de novo.

Culpa do calendário

O problema é o calendário. Essa é uma das constatações do presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado, Paulo Mocelin. Para ele, o intervalo de três meses entre o Gauchão e a Copa FGF é longo e inviabiliza a manutenção do grupo de jogadores pelos clubes.

Paulo calcula em cerca de 300 jogadores desempregados a partir deste domingo.

- Muitos desses jogadores migram para a Segundona. Mas a Copa FGF e a Terceirona só começam em agosto. Até lá, muita gente fica parada. É muito jogador para pouco calendário e time - conclui.

Além disso, Paulo acredita que os clubes investem mal a verba da tevê. Usam os R$ 800 mil repassados pela FGF para trazer jogadores em quantidade e de qualidade duvidosa e investem pouco nas categorias de base.

- Esses clubes só conseguem jogar os três ou quatro meses do Gauchão. Depois, têm que parar.

O sindicato oferece convênios com fisioterapeutas e academias para os desempregados. A entidade também mantém um time que serve de vitrina. O problema é a falta de campo para treinos diários. Hoje, são feitos nas vésperas de amistosos.

- Os atletas sem clube treinam por conta, mas isso não é o ideal - explica Paulo.


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