Porto Alegre



Últimos suspiros

Bar que reúne centenas na Praça dos Açorianos fechará em setembro

Depois de deixar o Viaduto Otávio Rocha, Tutti Giorni foi sufocado pelas aglomerações em frente ao local

21/08/2014 - 16h20min

Atualizada em: 21/08/2014 - 16h20min


Bruna Vargas - de Tramandaí
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Felix Zucco / agencia rbs
Interdição do bar, em junho, levou centenas a protestarem em frente ao local

Bar que soprou vida no naco de grama que jaz à beira de um laguinho na fronteira entre o Centro e a Cidade Baixa, em Porto Alegre, o Tutti Giorni, em frente à Praça dos Açorianos, está dando seus últimos suspiros. O local vai fechar as portas de vez em setembro.

Uma interdição em junho, por irregularidades no alvará, foi a principal responsável por tirar o fôlego dos donos. O estabelecimento que deu a largada para a reunião semanal de centenas de jovens junto a um monumento historicamente evitado à noite foi impedido de funcionar como bar até que colocasse a documentação em dia.

A essa altura, porém, os encontros em frente ao Tutti já estavam instituídos. As reuniões continuam ocorrendo às terças-feiras, mas muita gente que hoje movimenta os arredores da Ponte de Pedra não tem vínculo algum com o bar.

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- Eu vou nos Açorianos, não no Tutti - diz o técnico administrativo em educação Gabriel Focking, 31 anos.

Apesar de frequentar a praça há quase dois anos, Gabriel nunca entrou no bar de fachada discreta do outro lado da rua à noite - já provou o famoso carreteiro servido no almoço. Seu caso não é exceção.

- Hoje já vejo a galera dizer que vai para a ponte. Acho que, com o fechamento do bar, isso de dizer que "vai pro Tutti" talvez se perca - opina a estudante Emily Fagundes, 22 anos, que conheceu o bar em 2012.

A história do Tutti começou ainda antes de a estudante nascer, há 25 anos. O primeiro ponto, sobre o Viaduto da Borges de Medeiros, se caracterizava por duas atividades: um carreteiro a preço simbólico, servido ao meio-dia, e a reunião semanal de desenhistas, à noite.

Há cerca de sete anos, no entanto, o local virou ponto de encontro de jovens às terças-feiras. Mas, em 2012, Ernani Marchioretto, o Nani, resolveu entregar a loja sobre o Viaduto da Borges. O imóvel foi a leilão por falta de pagamento do condomínio - argumento que Nani questiona judicialmente. A despedida levou milhares às escadarias da Borges de Medeiros.

Multidão se reuniu quando o bar se despediu do Viaduto Otávio Rocha
Foto: Félix Zucco, Agencia RBS

Com público cativo, o Tutti reabriu no térreo de um edifício em frente à Praça dos Açorianos. Em pouco tempo, porém, deixou de ser um bar e se tornou coadjuvante da praça. Os encontros se davam, cada vez mais, da fachada para fora, e seguiam madrugada adentro depois que o local fechava. Com a multiplicação dos ambulantes, frequentemente, os banheiros eram mais atrativos que a cerveja vendida no estabelecimento.

- Criou-se um envolvimento involuntário com o bar depois que uma parcela alternativa da juventude instituiu o point ali. Talvez tenha ver com a falta de espaços públicos para jovens em Porto Alegre - analisa o jornalista Paulo César Teixeira, autor do livro Esquina Maldita, sobre o gueto boêmio da esquina da Osvaldo Aranha e com a Sarmento Leite nas décadas de 1960 e 1970.

Logo vieram os atritos com a vizinhança. Reclamações sobre o barulho, que já fugia à alçada do bar, eram recorrentes. A vigilância crescente resultou na interdição, em junho, dias após o vencimento do alvará.

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- (O Tutti) se tornou um gigante insustentável. Foi uma lição, em todos os âmbitos. Todo mundo deu pitaco como se ele fosse público - desabafa o empresário Guilherme Moojen.

Sufocado pela própria fama, o Tutti foi proibido de abrir à noite. O local seguiu com o tradicional carreteiro + refri a R$ 6 servido ao meio-dia, e com atividades pontuais à noite, a portas fechadas, como o Clube do Desenho, que reúne cartunistas semanalmente em torno de um modelo vivo. Mas os cerca de 30 almoços vendidos diariamente se tornaram insuficentes para pagar o aluguel de R$ 3,5 mil.

A burocracia para colocar em dia o alvará desanimou Moojen, que chegou a infrigir a recomendação da Secretaria Municipal da Produção, Indústria e Comércio (Smic) e abrir as portas em algumas noites. Acabava indo embora por falta de clientes. Até o fim de agosto, o objetivo do empresário é arrecadar dinheiro para quitar as dívidas, que estão em torno de R$ 16 mil.


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