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Polêmica no Litoral

Torres debate mudança na lei para permitir construção de prédios mais altos à beira-mar

Autorização divide opiniões, e a maior preocupação é que os edifícios maiores causem sombra na areia da praia. Prefeitura fará assembleias a partir da próxima semana com os moradores

02/08/2014 - 04h01min

Atualizada em: 02/08/2014 - 04h01min


Marcelo Monteiro
Marcelo Monteiro
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Omar Freitas / Agencia RBS
Município discute mudanças no plano diretor, que devem ocorrer ainda neste ano

Um assunto domina as rodas de conversa nas ruas de Torres nas últimas semanas: a possível mudança no plano diretor para autorizar a construção de prédios de até 10 andares nas quadras à beira-mar.

Para os defensores, a liberação de edifícios de até 30 metros de altura na orla da Praia Grande traria desenvolvimento à região. Já os críticos afirmam que o novo gabarito - altura máxima de edificações permitida - resultaria em consequências como, por exemplo, perda de ventilação natural, aumento de umidade e, principalmente, sombras na praia.

Embora o plano diretor tenha impactos em todo o município, incluindo as zonas urbana e rural, o foco da polêmica está na ampliação do gabarito da zona oito, que engloba uma faixa de dois a quatro quarteirões da orla da Praia Grande. Atualmente, são autorizados na região prédios que tenham até 12 metros de altura - equivalente a três pavimentos mais a caixa d’água.

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O temor é de que, com a liberação de construções maiores, Torres se transforme em uma cidade semelhante a Balneário Camboriú (SC), onde "espigões" disputam espaço no exíguo espaço litorâneo, escurecendo as areias da praia com suas sombras desde as primeiras horas da tarde.

O empresário e coordenador do projeto Praia Limpa, Alexis Sanson, diz que "a verdadeira vocação da cidade é o turismo que fomenta a qualidade de vida, e não a indústria da construção civil".

- Temos cerca de 50 obras em andamento em regiões onde prédios grandes são permitidos. A gente não vê por que agredir as quatro quadras da beira-mar.
A liberação de construções maiores vai interferir em todo o ecossistema da orla - diz Marcel de Rose, surfista, comunicador e membro  do Grupo Preserve Torres.

Preocupado com o desfecho do caso, o Grupo Preserve Torres fez um abaixo-assinado virtual contrário à aprovação da mudança nas regras e já reuniu pelo menos 10,6 mil assinaturas de apoio.

A proposta de liberação de edifícios de até 10 andares na zona oito - entre a zona nove e o mar - foi feita à prefeitura pela Associação de Hotéis e Restaurantes de Torres. O presidente da entidade, Euclides Rodrigues, diz que prédios desse tamanho não teriam interferência sobre a praia porque a sombra gerada seria igual ou menor à de outros edifícios da zona nove, onde é permitido construir edifícios de até 20 andares.

- Os prédios já estão fazendo sombra lá atrás (na zona nove). Daqui a 10 anos, estando liberado na zona nove, vai ter mais sombra aqui na orla do que se liberassem oito andares na zona oito, por exemplo - observa Euclides Rodrigues, presidente da Associação de Hotéis e Restaurantes de Torres.

Proposta deverá sair até setembro

Na sexta-feira, a prefeitura apresentou um resumo do que foi debatido em 22 audiências consultivas entre março e junho, período em que a população pôde se manifestar sobre o tema. A partir da próxima semana, estão previstas reuniões nas quais os moradores poderão aprovar ou vetar cada tópico.

Em seguida, técnicos da prefeitura, que realizam estudos sobre os efeitos da construção de prédios de 10 andares na zona oito, devem elaborar até setembro uma proposta de plano diretor que contemple todos os pontos definidos nas reuniões feitas com os moradores. Por fim, o projeto consolidado será encaminhado para avaliação dos vereadores.

- Só será enviado para a Câmara o que a comunidade definir - garante o secretário de Planejamento e Participação Cidadã de Torres, Carlos Cechin.

Entenda a polêmica

Zona nove: edifícios com mais de 20 andares podem ser construídos, mas exigem estudo de impacto ambiental. Hoje, é nessa região que fica o maior prédio da cidade, com 27 andares. O tamanho máximo para edificações na área mais distante do mar é, atualmente, 60 metros.

Zona oito: tem entre duas e quatro quadras de extensão, a partir da orla marítima da Praia Grande. A proposta de mudar o plano diretor prevê prédios de até 30 metros (10 andares).

Argumentos para aceitar a proposta

A construção de prédios de até 10 andares na zona oito não provocaria efeitos na areia da praia, pois os edifícios ficariam dentro da sombra gerada pelas edificações maiores, já existentes ou que ainda estão sendo construídos na zona nove.

Argumentos para barrar a proposta

Os novos edifícios mudarão a paisagem natural e aumentarão a sombra na areia. Haverá perda de ventilação natural, prejuízos ao turismo, mais umidade, maior proliferação de mosquitos, fungos e cupins, aumento na carga de esgoto e problemas ambientais.

Construtores não são favoráveis à mudança

Seria natural imaginar que o setor de construção civil fosse favorável a erguer prédios mais altos na orla, dada a natureza de sua atividade. Mas a Associação de Construtores de Torres decidiu, em votação de seus representantes, manifestar-se contrária à liberação de grandes edificações.

Entre os vereadores, há divisão. Enquanto uns dizem não haver razão para aprovar prédios grandes na orla, outros querem que técnicos apresentem à Câmara os possíveis efeitos de uma eventual mudança. A prefeita Nilvia Pinto Pereira (PT) garante que o governo não tomará decisão que contrarie a vontade da maioria:

- O que nos interessa é ouvir o maior número de pessoas possível. O texto que irá para a Câmara será um projeto que a comunidade vai nos ajudar a construir.

Assim como Torres, Capão da Canoa também revisa o plano diretor neste ano. Na orla, estão liberados prédios de nove andares (27 metros). No resto da cidade, há zonas em que são autorizados edifícios de até 12 pavimentos.

O secretário de Planejamento e Meio Ambiente, Bento Rocha, diz que não deve haver mudança nos critérios porque os atuais garantem equilíbrio entre incentivo à construção e qualidade de vida:

- Não podemos ter sombra na beira da praia. Mataríamos nossa galinha dos ovos de ouro.

Xangri-lá revisou o plano diretor em 2008 e definiu que, na orla, somente são liberadas construções que tenham no máximo seis metros de altura (dois andares).

- Foi consenso da comunidade, dos vereadores e da administração manter uma praia mais linear, horizontal - conta a secretária de Planejamento, Patrícia Rodrigues.

A situação em outras praias do país

Balneário Camboriú (SC): não há limite para a altura dos edifícios. Hoje, no horário de verão, a sombra dos prédios começa a atingir a praia por volta de 14h. Sem terrenos disponíveis para novas construções, a valorização do metro quadrado - entre R$ 10 mil e R$ 12 mil na orla - deve fazer com que, nos próximos anos ,a cidade tenha oito dos 10 edifícios mais altos do Brasil.

Itajaí (SC): as construções à beira do mar na Praia Brava são restritas a térreo mais dois andares. Mas, em 2007, passou a ser permitido construir prédios de até 12 andares em regiões próximas. No fim da tarde, há faixas de areia tomadas pela sombra dos edifícios.

Itapema (SC): na semana passada, o município suspendeu via decreto, por tempo indeterminado, a concessão de autorizações para construir prédios. Às vésperas da entrada em vigor do novo plano diretor, a meta é frear a disputa das construtoras por terrenos para  construção na orla da cidade.

João Pessoa (PB): na orla, por lei estadual, são proibidos edifícios acima de três andares.

Macaé (RJ): no ano passado, a Câmara limitou a 12 metros de altura os novos empreendimentos na orla das praias Campista, Cavaleiros e Pecado. Antes, o máximo era 20 metros.

Natal (RN): na área litorânea, são permitidos prédios com altura máxima de apenas 7,5 metros. O padrão vale para toda a costa do Rio Grande do Norte.

Peruíbe (SP): o plano diretor permite construir grandes prédios só em partes da cidade. Na beira-mar, são liberados edifícios de até 15 metros.

Vila Velha (ES): conforme o plano diretor, os prédios da orla das praias não podem ter mais do que 15 andares. Até o ano passado, o máximo permitido em locais como as praias da Costa, Itapuã e Itaparica era de 18 andares.


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