Notícias



Entrevista a ZH

Setor elétrico é investigado na Operação Lava-Jato, diz procurador

Haveria indicativos de cartel em obras federais de energia, nos mesmos moldes do esquema de propina da Petrobras

27/03/2015 - 04h01min

Atualizada em: 27/03/2015 - 04h01min


Carlos Rollsing
Carlos Rollsing
Enviar E-mail
Folhapress / Agência RBS
Carlos Fernando Lima e Paulo Galvão comentaram sobre o futuro das investigações

Por 43 minutos, os procuradores da República Paulo Galvão e Carlos Fernando Lima receberam Zero Hora, na quarta-feira, em um escritório do sétimo andar do Edifício Patriarca, em Curitiba. Eles estão entre os nove procuradores que lideram a força-tarefa do Ministério Público Federal montada para fazer as denúncias ligadas à Operação Lava-Jato. Demonstrando alto nível de empenho, comentaram o futuro das investigações, que ingressaram no setor elétrico do país, detalharam a situação de José Dirceu, rejeitaram a possibilidade de utilizar dados do Swissleaks e falaram sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Confira abaixo os principais trechos.

Leia todas as notícias sobre a Operação Lava-Jato

Empresas investigadas na Lava-Jato doaram R$ 11,8 milhões a candidatos gaúchos

Quais serão as próximas iniciativas da força-tarefa?
Carlos Fernando Lima
- Nosso foco mais burocrático é terminar a parte toda de cartel. É o objetivo de curto prazo. Mas estamos investigando a Diretoria Internacional, na Diretoria de Serviços ainda estamos arranhando as primeiras denúncias, e estamos devendo denúncias relacionadas à Diretoria de Abastecimento. Estamos caminhando até para fora da Petrobras. Isso que é interessante.

As investigações vão chegar ao setor elétrico e ao BNDES?
Lima - O rumo vai ser dado pela colaboração e pelas provas que formos juntando. Creio que os fatos envolvendo o setor elétrico são bastante razoáveis em indicativos de crimes da mesma espécie do cartel feito na Petrobras. Mas, fora disso, é especulação. Diria que o máximo neste momento é o setor elétrico. Temos o indicativo de cartel em obras de montagem industrial, como é no caso da Petrobras. Mas é cedo, a investigação está no início, mas já está no âmbito da força-tarefa.

ZH - Há relação da Lava-Jato com o Swissleaks?
Paulo Galvão
- O Swissleaks (vazamento de dados de contas secretas do HSBC na Suíça) é uma coisa independente. O que acontece é que algumas pessoas que tinham conta na Suíça também são investigadas na Lava-Jato e, eventualmente, essas informações podem ajudar. Mas o Swissleaks é de 2007, é um pouco antigo.
Lima - E temos certo receio em relação à origem dos dados do Swissleaks. Até o momento, nada foi utilizado nem precisamos disso, porque já temos colaboração da Suíça. Independentemente do Swissleaks, já temos aquilo de que precisamos da Suíça. Pelo o que sei, uma pessoa colocou as informações debaixo do braço e levou embora. No Brasil, qualquer vírgula vira nulidade, e qualquer nulidade derruba um processo. Seria uma temeridade mexermos com esse material do Swissleaks aqui.

Qual é a situação do ex-ministro José Dirceu?
Galvão - Ele está sendo investigado. Um dos interrogados, que é um dos réus, disse que pagou dinheiro à empresa dele por intermédio de outra empresa.
Lima - Estamos analisando as movimentações já reveladas pelo levantamento de sigilo que o Moro (Sérgio, juiz federal) determinou. O que se verifica é que o caminho do dinheiro que chega na empresa dele (Dirceu é dono de uma consultoria) é o mesmo caminho das propinas que são pagas a outros agentes. Neste momento, o que temos é a coincidência da forma de pagamento. Cabe a ele as explicações desses movimentos. O que é mais estranho é o uso desse mecanismo por uma empresa que não necessitava e não tinha vinculação com obras ou interesses no Exterior. As diversas empreiteiras pagam à empresa de Dirceu, pelo menos cinco delas com contratos de consultorias. Agora, a questão que resta é a sexta empresa que paga também para a empresa dele, já que ela tem vinculação com um dos operadores de propina que é o Milton Pascowitch. Essa é o ponto mais delicado e que ele terá de explicar, mas isso está em fase inicial de investigação.

Muito se fala do requinte das operações para fazer o dinheiro circular. Como era?
Galvão
- Realmente é um estratagema bem complexo e não era um só meio de passar o dinheiro, eram vários. O meio mais usual, que encontramos mais provas, é aquele em que a empreiteira contratada pela Petrobras passava o dinheiro através de um contrato falso para uma empresa que pode ou não prestar serviços. Ela pega uma empresa de consultoria que não tem atividade nenhuma e faz um contrato de prestação de serviços, depois paga e o serviço não é prestado. Ou ela pega uma empresa que realmente presta o serviço, mas embute na nota um valor maior. Se contrata um serviço de R$ 5 milhões, ela paga R$ 7 milhões. Isso é só o começo do fluxo do dinheiro. A partir dali, aquela empresa pode transferir o dinheiro para outra empresa por intermédio de outro contrato ou repassar para um dos operadores financeiros. No caso do Alberto Youssef, além de ter essas empresas (de fachada), ele era doleiro, lidava com dinheiro em espécie. Então, para ele era fácil tirar dinheiro de uma conta e colocar em outra. Ou pegar o dinheiro que ele recebeu em espécie e entregar diretamente aos diretores da Petrobras e políticos. Ou ele usava ramificações e passava o dinheiro para o Exterior por meio de contratos falsos de importação e exportação. Acaba saindo do país. Lá no Exterior acabava caindo, por exemplo, na Suíça, como ocorreu nos casos do Paulo Roberto Costa e do Pedro Barusco (ex-diretores da Petrobras). É um estratagema muito sofisticado e há várias formas de fazer isso. Estou relatando apenas uma. É impressionante como nos últimos meses foi possível ampliar a informação para outras pessoas e empresas além do Alberto Youssef (preso no início da Operação Lava-Jato). São várias e várias ramificações. É por isso que não temos como dizer hoje qual o tamanho do rombo.

Vocês estão convencidos de que parte do dinheiro servia para financiar partidos e comprar apoio no Congresso?
Galvão
- Existe uma investigação em Brasília e a gente evita falar sobre o que está a cargo deles, são duas equipes separadas pela questão da competência (políticos com foro privilegiado só podem ser investigados pelas instâncias superiores). Mas, sim, inclusive colocamos nas denúncias, está bem claro, e os próprios colaboradores reconhecem isso, que uma parte do dinheiro ficava com pessoal da Petrobras, com os seus diretores e gerentes, uma parte pagava despesas de intermediação, os operadores e as empresas que eram utilizadas, e uma parte realmente era destinada para partidos políticos e parlamentares ligados a esses partidos. Isso está bem claro, tanto que na última denúncia imputamos ao João Vaccari Neto (tesoureiro do PT) ter recebido por meio de doação legal um percentual que foi descontado da propina que era devida ao Renato Duque.

Como fazer para demonstrar que a doação legal era propina?
Galvão
- Em todos os casos, temos um grande leque de evidências. Se você pegar uma evidência solta, você vai dizer que não demonstra, mas se você pegar o conjunto de evidências, fica claro que não existe alternativa, que era realmente propina. Quando a gente fala em lavagem de dinheiro, se trata justamente de meios de dissimular a real natureza daquelas transferências bancárias, fazendo parecer algo lícito. Um contrato de prestação de serviços também é lícito. O que importa é o que está por trás. Nesse caso específico, temos os colaboradores dizendo que aquilo foi acertado como pagamento de propina, que foi descontado do percentual que cabia à Diretoria de Serviços. A gente tem a forma dos pagamentos, que eram parcelados, assim como a propina também era parcelada. A gente vai juntando todas as evidências e chega nessa conclusão.

Haverá investigação no setor de Comunicação Institucional da Petrobras?
Galvão
- Dentro da Petrobras, a gente tem uma gama grande de potenciais irregularidades. Já temos informações de irregularidades nesse setor. Não temos nada pronto, até porque não temos capacidade de finalizar tudo ao mesmo tempo, mas existem potenciais irregularidades nessa e em outras áreas da Petrobras. Esse setor está sendo investigado, sim.

Alguma vez, no decorrer da força-tarefa, surgiu qualquer menção ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva?
Galvão
- O que temos é o esquema envolvendo o partido (PT). Onde e quem eram as pessoas responsáveis, não temos condições de dizer.
Lima - Não está perfeitamente claro. Obviamente, não existe limite às investigações, salvo nas questões de prerrogativa, de foro privilegiado, que vão ao Supremo Tribunal Federal. Qualquer outra pessoa que esteja envolvida nos fatos e que não tenha prerrogativa, somos nós que vamos investigar. Independentemente dos nomes, seja quem for, se estiver envolvido nos fatos, vai ser investigado.


MAIS SOBRE

Últimas Notícias