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Maioridade penal

Juristas veem inconstitucionalidade em manobra de Cunha

Votação de proposta semelhante à rejeitada na madrugada de quarta-feira só poderia ser feita em 2016

02/07/2015 - 13h02min

Atualizada em: 02/07/2015 - 13h02min


Bruna Scirea
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Gustavo Lima / Câmara dos Deputados

A aprovação da redução da maioridade penal pela Câmara dos Deputados, na madrugada desta quinta-feira - menos de 24 horas após um texto semelhante ter sido rejeitado pelos parlamentares -, abriu a discussão sobre validade constitucional da votação.

Para o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, um dos primeiros a se manifestar a respeito, a manobra do deputado Eduardo Cunha é uma "pedalada regimental". Em seu perfil no Twitter, Barbosa usa a Constituição para justificar sua posição:


Dessa forma, os parlamentares não poderiam ter votado emendas relativas ao mesmo assunto (a redução da maioridade penal) na mesma sessão legislativa - que não dura um dia, ao contrário do que o termo sugere, mas o ano todo. Em 2015, começou em 2 de fevereiro e termina em 22 de dezembro.

O ministro do STF Marco Aurélio Mello também criticou a manobra. Ele disse à Folha de S.Paulo que esse tipo de procedimento traz preocupação, uma vez que "não pode prevalecer critério de plantão" e que, diante deste cenário, a "tendência é vingar o jeitinho brasileiro". Ainda segundo o ministro, a Constituição é clara ao sustentar que uma proposta de modificação em seu texto que for rejeitada não pode ser votada no mesmo ano pela Casa legislativa.

Uma nova apreciação sobre o tema poderia se realizada somente a partir de fevereiro de 2016. É o que sustenta Eduardo Carrion, professor titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Fundação do Ministério Público (FMP). Ele vê inconstitucionalidade no processo legislativo.

- Como se trata de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o indicativo constitucional é com relação à matéria (tema). Ou seja: se uma PEC dissesse que "X é" e fosse rejeitada, não poderia ser apresentada uma nova proposta dizendo que "X não é". Isso porque a matéria é a mesma. E a proibição, na Constituição, é com relação à matéria - entende Carrion.

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A visão é compartilhada por Leonardo Grison, professor de Direito Constitucional na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos), que se questiona: mudar algumas palavras faz que uma emenda vire outra?

- Basta que se altere o número da PEC e se mude uma ou outra palavra, mantendo o mesmo conteúdo, para ser considerada uma nova emenda? Cunha entende que não é a mesma proposta que está em questão, por isso a submeteu à nova votação. Mas isso não me parece constitucional, porque, se fosse assim, seria muito fácil driblar a lei, que então acabaria não servindo para nada - afirma Grison.

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) também considerou inconstitucional e "grave" o procedimento adotado pelo presidente da Câmara. Por meio de nota, a associação apontou que a medida adotada pela Câmara "fere o regimento legislativo e representa inconstitucionalidade formal à proposta". A AMB ainda alegou que a redução da maioridade penal fere cláusula pétrea da Constituição, que proíbe deliberação sobre matéria que tente reduzir direitos ou garantias individuais.

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A emenda anterior, rejeitada, estabelecia a redução para casos de crimes cometidos com violência ou grave ameaça, crimes hediondos (como estupro), homicídio doloso, lesão corporal grave ou lesão corporal seguida de morte, tráfico de drogas e roubo qualificado. A que foi aprovada deixa de fora da redução crimes como roubo qualificado, tortura, tráfico de drogas e lesão corporal grave. De acordo com Grison, no entanto, a proposta continua sendo a mesma: a redução da maioridade penal.

Nesta manhã, o comentarista da Rádio Gaúcha Cláudio Brito também opinou que a votação da Câmara dos Deputados é inconstitucional:




Instrumentos que podem derrubar a emenda no STF:

NO CONGRESSO
Um ou mais parlamentares podem julgar que a tramitação da PEC viola as regras da atuação legislativa. E impetrar um mandado de segurança preventivo junto ao STF com o objetivo de corrigir o "vício da inconstitucionalidade" (votar duas vezes o mesmo assunto).

APÓS APROVADA
Se for aprovada no segundo turno na Câmara dos Deputados e nos dois turnos no Senado, a última possibilidade de derrubar a emenda seria por meio de uma arguição de inconstitucionalidade. O STF teria, então, de analisar os aspectos formais (se o processo legislativo foi respeitado) e também o mérito da emenda, uma vez que há o entendimento de que ela altera uma cláusula pétrea da Constituição.

Detalhe ZH
Como se trata de uma PEC, ou seja, uma proposta de alteração na Constituição, o tema não passa por sanção presidencial. Assim, não existe a possibilidade de veto por parte do Executivo.

* Colaborou Jéssica Rebeca Weber 


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