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Troca de farpas

"O Judiciário depende de um trabalho eficiente da polícia", diz presidente da Ajuris

Gilberto Schäfer divulgou nota oficial rebatendo críticas de integrantes da Secretaria da Segurança Pública à atuação de juízes na soltura de presos

12/02/2016 - 15h01min

Atualizada em: 12/02/2016 - 15h03min


Juliana Bublitz
Juliana Bublitz
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Presidente da Associação dos Juízes do RS, Gilberto Schäfer.

Um dia depois de divulgar nota oficial rebatendo críticas de integrantes da Secretaria da Segurança Pública ao Poder Judiciário, o presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Gilberto Schäfer, disse, nesta sexta-feira, que os magistrados dependem "de um trabalho eficiente da polícia" para cumprir a sua função – em referência à insinuação, feita pelo ex-chefe da Polícia Civil Guilherme Wondracek, de que eles seriam responsáveis pelo "prende-e-solta" de criminosos.

Schäfer evitou fazer críticas diretas ao órgão, mas afirmou que a Polícia Civil "está desestruturada de pessoal e de apoio técnico" e que os juízes precisam de "boas investigações" para definir se um suspeito deve ou não ser mantido preso. Além disso, apontou a falta de vagas em presídios como uma das causas do problema e disse que pretende procurar o secretário estadual da Segurança Pública, Wantuir Jacini, para tratar da questão.

Na nota oficial, Schäfer chegou a afirmar que "alguns agentes públicos", inclusive integrantes "do alto escalão da Polícia Civil", estariam tentando "desviar o foco das suas responsabilidades e atribuir ao Judiciário a causa pela crise da segurança pública".

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Conhecido pelo perfil ponderado, o novo chefe de polícia, delegado Emerson Wendt, não quer entrar na polêmica. Nesta sexta-feira, por telefone, ele limitou-se a afirmar que "respeita o trabalho do Judiciário". A seguir, leia os principais trechos da entrevista concedida pelo presidente da Ajuris:

Na nota oficial, o senhor afirmou que integrantes do alto escalão da Polícia Civil "estão tentando desviar o foco das suas responsabilidades e atribuir ao Judiciário a causa pela crise da segurança pública". Por quê?

Vieram à tona algumas declarações na imprensa. O antigo chefe de Polícia, ao final de algumas operações, dizia que os criminosos seriam soltos logo depois, porque a lei era branda e porque alguns juízes eram complacentes. A cada manifestação, isso passou a ser reproduzido. A nossa posição é justamente explicar para a opinião pública qual é a função do Judiciário e dar o recado de que o governo não pode permitir que se utilize esse expediente. O policial tem o dever de prender. Agora, quem vai dizer se a pessoa vai continuar presa ou não é o juiz.

A Justiça está soltando mais hoje do que há 10 anos?

Não. A Justiça está prendendo, tanto que o Presídio Central está cheio. Nas audiências de custódia, 85% das pessoas vão para a prisão. O índice é alto. O problema é que não há vagas. Só nos regimes aberto e semiaberto da Capital e Região Metropolitana temos déficit de 2,5 mil vagas. Essas pessoas estão em casa, sem o devido acompanhamento e com falta de tornozeleira eletrônica. Estamos justamente apontado isso para que o Poder Executivo tome providências.

Delegados dizem que os juízes estão sendo mais flexíveis em casos envolvendo crimes graves e mandando para casa quem deveria ficar preso. O senhor discorda?

Chega um momento em que inclusive quem teve crime hediondo vai progredir (passar do regime fechado para o semiaberto ou aberto). E onde está a vaga para a progressão?

Mas, em 2014, por exemplo, a Justiça mandou soltar o suspeito de estuprar uma adolescente no anfiteatro Pôr do Sol, em Porto Alegre, que havia sido preso em flagrante. Não se tratava de progressão. Isso não corrobora a crítica do "prende-e-solta"?

O juiz faz a sua avaliação da prova, da circunstância do inquérito. Cada caso é um caso. E quem não erra? Nesse caso, foram anexados alguns documentos depois, e o próprio juiz se retratou. O fato é que o Judiciário depende de um trabalho eficiente da polícia. Saúdo as declarações do novo chefe de Polícia Civil. Precisamos ter boa investigação e boa documentação da investigação. É nisso que o juiz se baseia.

Os inquéritos enviados ao Judiciário têm apresentado problemas?

O que eu sinto é que a polícia está desestruturada de pessoal e de apoio técnico. Os próprios delegados sentem isso. E isso acaba prejudicando o trabalho policial.

O prende-e-solta tem relação com inquéritos mal feitos?

O juiz sempre vai avaliar o que a polícia traz para ele. Temos de fazer um levantamento para saber se efetivamente está pior ou não, mas o que se nota é que a polícia está carente de estrutura. Além disso, faltam vagas nos presídios, e a lei evita que se envie mais presos para o sistema. Esses dias, não tínhamos vagas no Presídio Central, e o pessoal ficou nas delegacias. É isso que estamos tentando mostrar. Não estamos nos debatendo contra o papel dos delegados. Estamos dizendo que o governo tem de estruturar melhor a polícia, para que ela cumpra melhor o seu papel.

Sem isso, o Judiciário não tem o que fazer?

Não tem o que fazer. Não é uma questão de opção do Judiciário. É uma questão de falta de estrutura. Quanto à questão do prende-e-solta, é função do juiz avaliar se as pessoas devem ficar presas. E o índice de prisão é alto.

O senhor fala em índice alto de prisão, mas PMs dizem estar frustrados porque prendem criminosos e eles são soltos no dia seguinte. Então não é bem assim?

Não é bem assim. Vários ficam presos. Basta olhar os presídios. E um bom policial tem de prender. É a função dele. Mas o judiciário não vai descumprir a lei. O fato de um brigadiano ter se esforçado muito para fazer uma captura não tem alinhamento automático com a prisão.


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