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Faltou clareza

Texto que aponta regras para o uso de espaços públicos gera dúvidas e polêmica em Porto Alegre

Versão do documento foi parar na internet, mas prefeitura garante que as normas ainda estão sendo discutidas e que visam apenas a organização

25/05/2016 - 04h03min

Atualizada em: 25/05/2016 - 18h49min


Um documento ainda em gestação já é motivo de polêmica em Porto Alegre. Em discussão com membros de pelo menos 16 secretarias municipais, uma minuta de decreto, elaborada no gabinete do vice-prefeito, que tem como objetivo regular o uso dos espaços públicos na Capital tem lacunas interpretativas questionadas por movimentos sociais.

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No começo do mês, a página Arteiros de Rua divulgou no Facebook uma versão do texto que não especificava se as regras para a utilização de espaços como praças, parques e vias públicas – que, em alguns casos, incluem o pagamento de taxas – seriam estendidas a artistas de rua e manifestações políticas e sociais. O conteúdo do documento incomodou a classe artística, que já discutiu a minuta em reuniões e redigiu um manifesto contrário a ela.

A minuta já teve pelo menos três versões. Na mais recente, a que Zero Hora teve acesso ontem, foi incluída uma cláusula informando que as regras não se aplicam aos artistas de rua, cuja atividade é regida pela Lei 11.586, de 2014, e nem às manifestações políticas "oriundas de movimentos sociais". Segue inalterado o artigo 3º, que diz que as normas destinam-se a eventos e atividades recreativas, culturais, esportivas, institucionais ou promocionais, comunitárias ou não, previamente planejadas, e que "objetive a reunião de pessoas em logradouro público, interferindo a normalidade da circulação". Essa cláusula, no entendimento dos artistas, deixaria margem para questionamentos sobre eventos sociais espontâneos que ocorrem na cidade, como reuniões informais e apresentações artísticas em praças e parques.

– Somos contrários ao decreto, mesmo que esteja ali a questão do artista de rua, porque não pega só o artista, mas uma gama grande de setores. A gente espera que venham dialogar antes de bater o martelo – disse o presidente do Sindicato dos Artistas do Rio Grande do Sul, Fábio Cunha.

Segundo a prefeitura, um dos principais objetivos do documento é resolver um problema interno: a organização de procedimentos já existentes para a realização de eventos em locais públicos, que envolvem diferentes departamentos e secretarias. Enquanto hoje os promotores têm de ir até os órgãos competentes – vários para um mesmo evento –, o documento criaria regras para que o pedido fosse feito por meio de formulário online, já em elaboração.

– Esse documento ainda está em estudo, teve problemas de redação e foi divulgado precocemente. No fundo, só buscamos melhor organizar o espaço público – disse o vice-prefeito da Capital, Sebastião Melo.

Versão traz conceitos e definições pouco claros

Coordenadora do grupo de trabalho que redige o documento, Rosimeri da Silva Chaves admite que os termos que definem os eventos a serem afetados precisam ser melhor discutidos, assim como o próprio conceito de evento e a definição do que é comunitário e do que tem fins comerciais, já que esses terão de pagar taxas.

– Achei a polêmica importante, porque tinham coisas que não estavam claras, e ainda tem. A ideia não é impedir as pessoas de usar os espaços públicos para se manifestar nem barrar o café da manhã dos vizinhos na rua. Estamos discutindo cada ponto para deixar essas coisas claras – disse.

Na primeira quinzena de junho, uma nova reunião com representantes da prefeitura deve voltar a analisar o documento. Depois de concluída – o que pode não ocorrer no primeiro semestre –, a minuta será entregue ao prefeito José Fortunati, que poderá transformá-la em decreto. É possível, no entanto, que o prefeito peça revisão do documento ou convoque uma audiência pública.

Restrições no Zumbi dos Palmares

Presente em todas as versões da minuta, um dos pontos que mais causa estranhamento refere-se a regras específicas para o uso do Largo Zumbi dos Palmares, na Avenida Loureiro da Silva, na Cidade Baixa.

Palco de diferentes tipos de eventos ao longo do ano, o local não permitira o "uso de qualquer instrumento ou equipamento que produza, reproduza ou amplifique som", com exceção de eventos organizados pela "comunidade local" ou relacionados à luta contra a discriminação racial e a Semana da Consciência Negra.

O trecho que soa polêmico aos milhares de porto-alegrenses que frequentam eventos no largo não é de hoje. Ele foi retirado integralmente de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público e a prefeitura em 2004. O documento visava, à época, a evitar a "poluição sonora causada por realização de eventos".

– Incluímos isso na minuta porque muitos funcionários não têm conhecimento desse TAC e autorizam atividades ali. Mas, depois, somos cobrados – comentou Rosimeri.


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