Profissão perigo
Postos de gasolina na mira dos gatunos
Entre um abastecimento e outro, frentistas se tornaram caixas rápidos do crime. A cada dia, pelo menos um posto de combustíveis é roubado na Capital
Toda vez que está escalado para trabalhar à noite, especialmente nos finais de semana, o frentista José Airton Homem, 46 anos, fica com o pé atrás. Na última vez que o posto onde trabalha, no Bairro Menino Deus, foi assaltado, há três meses, por sorte ele estava de folga. Mas sabe que a qualquer momento pode se tornar o próximo alvo do que já se transformou em caixa eletrônico para bandidos.
- É um trabalho arriscado, porque a gente lida com dinheiro na mão todos os dias. O negócio é sempre passar o mais rápido possível tudo para o caixa - ensina o frentista, com seis anos na pista.
Crescimento é assustador
O levantamento da Brigada Militar mostra que, até o final de outubro, foram registrados 236 roubos a postos de combustíveis na Capital. Um número mais de 60% superior a todo o ano passado. Conforme o Sindicato dos Postos de Combustíveis (Sulpetro), o problema agravou-se a partir da metade do ano. Só entre junho e novembro, a entidade relata a média de praticamente um assalto por dia em Porto Alegre.
Uma estatística em plena aceleração. Desde a noite de domingo, foram registrados outros cinco ataques a postos da Capital. A polícia não descarta, inclusive, que tenham sido os mesmos bandidos, já que os cinco assaltos foram cometidos em uma mesma região e por dois homens em uma moto, armados.
Sequência na madrugada
Na esquina entre a Rua Albion e a Avenida Bento Gonçalves, os criminosos levaram o dinheiro do frentista na noite de segunda. Menos de meia hora depois, bandidos com as mesmas características não se contentaram com o dinheiro do frentista em um posto na Avenida Protásio Alves, na Vila Jardim. Invadiram a loja de conveniências, levando valores do caixa e pertences de clientes. O último ataque da madrugada foi a um posto da Avenida Ipiranga, Bairro Santana.
"Tem de ser muito macho"
- Para trabalhar em postos, sobretudo à noite, tem de ser muito macho, mesmo. Quando eles não roubam o frentista, vão na loja de conveniências, porque é muito fácil para eles. É um dinheiro rápido e sem risco - comenta o supervisor de um posto na Avenida Bento Gonçalves, João Maoski.
Até a semana passada, ele contabilizava dois ataques nesse mês. E comemorava:
- Está abaixo da média.
Em sete anos, ele calcula uma média de oito a dez roubos por ano. E tudo piorou em 2012.
Partenon e Sarandi, os bairros campeões
No começo do mês, os postos da Avenida Bento Gonçalves viveram uma situação que parece inusitada, mas que a cada ano se torna mais comum na região. Dois bandidos percorreram praticamente toda a avenida fazendo "saques rápidos" em todos os estabelecimentos.
A Brigada foi chamada e, sem perceber, os PMs faziam a mesma trilha dos criminosos - a cada posto, paravam para registrar os casos.
- Como de costume, não resistimos. Eles assaltaram um frentista e partiram, mas conseguimos ajudar os policiais - conta um dos proprietários.
Graças às imagens das câmeras de vigilância, os bandidos foram identificados e presos pouco tempo depois.
Os bairros Partenon e Sarandi revezam ano a ano, no levantamento da Brigada, a liderança dos locais com maior número de ataques do tipo. Até outubro, o Partenon havia contabilizado 26 crimes, contra 24 de 2011.
Brigada garante que irá reforçar as barreiras
O Comando do Policiamento da Capital (CPC) garante que o contato com os proprietários de postos é constante para frear a onda de assaltos. De acordo com o coronel Alfeu Freitas Moreira, os principais pontos de roubos estão sendo mapeados pela Brigada.
- É um trabalho que já fazemos, por exemplo, com o segmento de transporte de valores, mantendo o contato direto com os proprietários para levantamento de informações - explica o comandante.
Policiamento está sendo ampliado
Segundo ele, as barreiras e abordagens nos horários e regiões onde mais ocorrem os roubos aos postos também estão sendo ampliadas.
- Já temos as características dos crimes e de quem os pratica. Não é uma ação organizada, mas de oportunidade. Os ladrões planejam os ataques pela facilidade. O problema é que invariavelmente prendemos quem já deveria estar preso - aponta.
O presidente do Sulpetro, Adão Oliveira, concorda que não há nada organizado tendo como alvo os postos.
Lotéricas deram o exemplo
Segundo ele, o aumento nas ocorrências pode ser consequência direta do aumento de segurança em lotéricas, mercados ou farmácias. A esperança dele é de que a Brigada Militar consiga garantir uma resposta no mesmo nível.
Geralmente, pouca grana
Ataques a postos seguem sempre um estilo de roubo rápido. Em 90% dos casos, os bandidos, em motos ou carros, usam arma, mas poucas vezes partem para a violência. Em geral, fingem ser clientes e encostam na bomba de combustíveis. Apontam a arma para o funcionário e levam o que conseguem. Geralmente quantias que não ultrapassam R$ 100.
- Nossa única precaução é orientar o pessoal a ficar com menos dinheiro na pista. Mas é só para diminuir o prejuízo - conta o supervisor João Maoski.
Quando os roubos são direcionados às lojas de conveniência, geralmente a quantia também é baixa, mas inclui mercadorias, como cigarros ou chocolates.
Os números
Entre janeiro e outubro, a Brigada registrou 232 roubos a postos na Capital. Número 60% superior a todo o ano passado.
A frequência dos crimes se agravou desde o início do ano. Entre junho e novembro, o Sulpetro aponta 179 casos.
90% dos crimes tiveram o uso de revólver ou pistola.
78% dos crimes foram cometidos na noite ou madrugada.
O medo afasta os funcionários
Já houve noites em que Francisco da Costa não conseguiu deixar aberto seu posto de combustíveis, na Avenida Protásio Alves. Não tinha funcionários dispostos a encarar a função de frentista.
- Está cada vez mais complicado, porque não é só o trabalho. Temos que lidar com o trauma de quem vive essa situação de risco, diariamente, nos postos. E se eu resolvo colocar um segurança, não dá, acabo trabalhando só para pagar pelo serviço - desabafa.
Oito ataques em um único mês
Só em dezembro, segundo ele, o posto foi atacado oito vezes. Conforme o levantamento do Sulpetro, quase 80% dos roubos, desde junho, aconteceram entre a noite e a madrugada.
De acordo com o presidente do sindicato, Adão Oliveira, o medo já afeta todo o setor de combustíveis.
- Cada vez que se contrata alguém para trabalhar em posto, é preciso treinamento. Aí, acontece um assalto e a pessoa desiste, então nunca conseguimos ter equipes prontas. E os novos trabalhadores já nem procuram esse trabalho, pois sabem o risco que ele representa - afirma.