Polícia



Planilha de assassinatos

Na criminalidade, algumas regiões da Capital são como a faixa de Gaza

Dois locais foram, de acordo com os dados contabilizados pelo Diário Gaúcho, as microregiões mais violentas entre as 19 maiores cidades da Região Metropolitana e Vale do Sinos

17/01/2013 - 08h27min

Atualizada em: 17/01/2013 - 08h27min


Santa Teresa: três jovens foram fuzilados no Acesso D

Uma avenida e um arroio na Zona Norte da Capital, no limite com Alvorada, foram palco de pelo menos 21 mortes em 2012. Na Zona Sul, uma rua de 1,2km contabilizou sete homicídios. As duas foram, de acordo com os dados contabilizados pelo Diário Gaúcho, as microregiões mais violentas entre as 19 maiores cidades da Região Metropolitana e Vale do Sinos. No terceiro dia da série que mostra a criminalidade na região, o Diário apresenta os números dos bairros e mostra a situação em cada Território de Paz da Capital. Em tempo: o secretário estadual de Segurança, Airton Michels, mais uma vez esquivou-se de falar sobre o problema.

Proteção, só na nova grade da pizzaria

Tempos atrás, a Rua Dona Otília, no Bairro Santa Teresa, era considerada tranquila. Em 2012, ela ficou entre as mais sangrentas da Capital. Foram sete mortos na via de 1,2km da Zona Sul.

No Acesso D, uma proteção de ferro foi colocada na janela dos fundos da pizzaria - ao lado dela, três pessoas foram assassinadas no dia 12 de agosto. Wesley Souza da Silva, 17 anos, Márcio Bruno do Nascimento Baissvenger, 20 anos, e Éderson Falcão da Rosa, 23 anos, foram mortos por homens em um Siena prata.

Wesley e Éderson trabalhavam na Usinas das Pizzas. Estavam nos fundos do restaurante, conversando com Bruno, morador do acesso, quando o Siena chegou de faróis desligados. Atingidos por tiros, Bruno e Wesley na hora. Éderson morreu no hospital.

Vítimas jovens, mortas a tiros

Em dezembro, a Polícia Civil prendeu cinco dos seis suspeitos do crime. Conforme as investigações, uma das vítimas era antigo desafeto dos assassinos. A outra teria se envolvido com a ex-namorada de um dos suspeitos e, também, tinha dívida com eles. O terceiro morto, aparentemente, morreu apenas por estar junto com os alvos dos matadores. Esses foram os ingredientes para o crime que mais chocou a comunidade da Dona Otília e colocou a rua como uma das de mais crimes na Capital.

- Depois de lá, até que acalmou um pouco. Passam PMs por aqui - conta um comerciante da rua.

As outras quatro vítimas, todas homens, também foram mortas a tiros, e tinham entre 21 e 37 anos.

Empate nos Territórios da Paz: 2 a 2

Rubem Berta

O Rubem Berta ainda tem o maior número de assassinatos: 63 em 2012. São 17 mortes a mais do que em 2011.

Em abril, preocupada em diminuir os índices, a Brigada trouxe do Interior 200 PMs. Cinquenta deles foram destinados para o 20º BPM, responsável pelo patrulhamento do Bairro Rubem Berta, onde está instalado o Território de Paz.

O bairro recebeu também, em agosto, a segunda fase do programa, que previa ações sociais e de economia solidária e a transferência do Posto Móvel para uma base comunitária. No posto, na Rua Wolfram Metzler, são registradas as ocorrências e ficam lotados os PMs do projeto.

População: 87.367
Área: 851 ha
Mortes em 2011: 46
Mortes em 2012: 63 + 36,9%

Santa Teresa

O Santa Teresa também registrou aumento nas mortes. O bairro da Zona Sul teve a transferência, em novembro, do posto móvel para o prédio da Associação de Moradores da Vila Nossa Senhora do Brasil, até então usado para bailes funks dos quais traficantes participavam. O local foi reformado pela Brigada. Um morador fez um plebiscito com a comunidade para que o local fosse destinado à BM. E a ideia teve apoio.

Mas depois de todas as ações, nem todos os moradores têm acesso ao local. O conflito entre bandos rivais das vilas próximas, por vezes, impede a circulação de moradores.

População: 43.391
Área: 454 ha
Mortes em 2011: 22
Mortes em 2012: 28 +27,3%

Lomba do Pinheiro

Maior Território de Paz em extensão, a Lomba do Pinheiro reduziu os homicídios em 2012. O posto móvel colocado entre a Vila Mapa e a Quinta do Portal deu resultado. Principal reclamação dos moradores, os constantes confrontos entre os bandos no cruzamento das estradas São Francisco e Afonso Lourenço Mariante foram resolvidos com a colocação do ônibus.

Em 2012, a Lomba não foi palco de chacinas como em 2011. O 19º BPM recebeu reforço de 25 PMs em maio. Oito deles foram colocados para trabalhar exclusivamente no Território ao longo do período. Os demais foram para outras áreas de atuação do Batalhão.

População: 51.415
Área: 2.455 ha
Mortes em 2011: 26
Mortes em 2012: 23 (-11,53%)

Restinga

A Restinga teve redução nos homicídios em 2012. Mas um dos últimos casos do ano passado foi praticamente na porta do posto móvel na Rua Belize, na Restinga Velha. Após o tiroteio, que deixou morto Marcos dos Santos, 30 anos, os moradores tiveram que bater à porta do posto móvel para chamar os brigadianos que estavam lá dentro.

A promessa do secretário adjunto de Segurança, Juarez Pinheiro, era de que o posto móvel viraria unidade fixa, no terreno pertencente a uma escola. Até agora, nada mudou.

Mas, no último trimestre, novas gangues iniciaram a disputa por pontos de tráfico. Confrontos entre grupos da Restinga Nova e da Velha fizeram crescer as mortes nos últimos meses do ano.

População: 51.569
Área: 2.149 ha
Mortes em 2011: 50
Mortes em 2012: 34 (-32%)

Faixa de Gaza: Que lugar é esse?

A Faixa de Gaza é um território na costa do Mar Mediterrâneo, no Oriente Médio, que faz fronteira com o Egito no Sudoeste e com Israel no Leste e no Norte. Tem 41km de comprimento e entre 6km e 12km de largura. Lá vivem 1,7 milhão de pessoas. O local é disputado entre israelenses e palestinos, que já travaram diversas batalhas. Os moradores vivem no chamado fogo cruzado.

Uma vila em conflito

O limite entre Porto Alegre e Alvorada é um dos locais mais violentos da Região Metropolitana. O Arroio Feijó, que separa as duas cidades, foi palco dos assassinatos (ou desovas) de pelo menos oito pessoas em 2012. Na Avenida Bernardino Silveira Amorim, que termina no arroio e vai até a Avenida Assis Brasil, foram mais oito mortes - na Vila Vitória da Conquista, que tem saída para a mesma via, ocorreram outros cinco casos. Ou seja, numa linha de cerca de 7,5km, ocorreram 21 mortes em um ano.

Próximo ao Arroio Feijó há uma vila em conflito, o Recanto do Sabiá, em meio a lixo e mata fechada. No local, foram encontrados quatro corpos de uma só vez em novembro. A suspeita da Polícia Civil é de que o crime tenha relação direta com a disputa pelo controle das bocas de fumo na invasão. Até ontem, apenas um dos corpos havia sido identificado: Roni de Oliveira da Silva.

Na semana passada, o Diário Gaúcho voltou ao Recanto. Encontrou casas fechadas, com placas de "vende-se" e uma população acuada. Ninguém quer falar sobre os casos nem sobre a disputa. Muitos, com medo, já se mudaram.

Os números

Porto Alegre
476 mortes
413 em 2011
Aumento: 15%

1º) Rubem Berta: 63
46 em 2011

2º) Restinga: 34
50 em 2011

3º) Mario Quintana: 33
24 em 2011

4º) Santa Teresa: 28
22 em 2011

5º) Sarandi: 27
20 em 2011

6º) Lomba do Pinheiro: 23
26 em 2011

7º) Bom Jesus: 20
9 em 2011

8º) Partenon: 18
6 em 2011

9º) Cascata: 12
5 em 2011

10º) Aberta dos Morros: 12
4 em 2011

O que eles dizem

"O Rio Grande caiu de vez na rota do tráfico internacional. O lucro das drogas é usado para vários crimes".
Comandante do 1º BPM, major Luis Porto

"Temos vários casos de 'clientes' em prisão domiciliar que estão praticando crimes. E há ainda conflito entre gangues".
Comandante do 20º BPM (R. Berta), tenente-coronel Jeferson Jacques

"Há um trabalho feito nas escolas para evitar que menores entrem em gangues e proliferem os crimes".
Comandante do 21º BPM (Restinga), tenente-coronel Flávio Bueno

"Aumentamos a fiscalização de carros e motos, pois hoje o crime anda sobre rodas".
Comandante do 19º BPM (Lomba), tenente-coronel Nádia Silveira Gerhardt

Gestão de espaços

Por Felipe Bortolanza - editor de Polícia
felipe.bortolanza@diariogaucho.com.br

"Este espaço estava reservado para explicações do secretário Airton Michels. Como de costume, veio a desculpa da agenda lotada. Aqui, o silêncio de quem comanda gera uma crítica. Nas ruas, a ausência da gestão pública abre lacunas para o crime. A planilha do Diário prova: temos detalhes das 1.198 mortes, 10% acima de 2011.

Quando fala, Michels culpa o tráfico. Não se pode, numa política séria, justificar uma mazela social em função de outra. Vejo replicações de ausências. As boas iniciativas são raras, como os Territórios da Paz. Mas ainda estão longe do ideal. O bandido já é malandro por natureza. E mais fácil fica sua vida se governantes não ocuparem seus espaços enquanto gestores da ordem."


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