Polícia



Caso Kunzler

Delegada mantém posicionamento sobre a autoria da morte do publicitário

Jaerson Martins de Oliveira, 41 anos, voltou no começo da tarde deste domingo ao Patronato Lima Drummond, onde cumpre pena no semiaberto

30/03/2014 - 17h48min

Atualizada em: 30/03/2014 - 17h48min


Mesmo com a reviravolta no andamento do caso sobre a morte do publicitário Lairson Kunzler, 68 anos, a delegada titular da 6ª Delegacia da Polícia Civil, responsável por investigar o assassinato, Aurea Regina Hoeppel, mantém a convicção de que o preso do semiaberto Jaerson Martins de Oliveira, 41 anos, estava na cena do crime.

Oliveira foi liberado, por decisão judicial, da Penitenciária Modulada de Charqueadas no começo da tarde deste domingo, onde cumpria prisão preventiva por ser acusado de matar Kunzler. Como possui outras condenações, voltou para o albergue Patronato Lima Drummond, em Porto Alegre.

Em entrevista a Zero Hora, a delegada afirma que a polícia só teve uma testemunha, um comerciante que teria visto Oliveira descer armado de uma moto e entrar em um carro que teria perseguido o publicitário desde o banco onde ele sacou R$ 44 mil. É no comerciante que Aurea se baseia para manter a acusação. Nesta semana, ela tentará convencê-lo a falar com promotor Fabiano Dallazen, que pediu novas diligências no caso. A intenção é provar que esta testemunha, que não quer se identificar, realmente existe.

Sobre o vídeo apresentado pela defesa de Oliveira para comprovar que ele estava no trabalho no momento do crime, a delegada estranha que a fita só apareceu cerca de 15 dias depois da prisão e que não foi entregue à polícia. Confira abaixo entrevista na íntegra:

ZH - Ao conceder liberdade ao Jaerson, o juiz alegou que a polícia o apontou como autor do crime pelo relato e reconhecimento fotográfico feito por uma testemunha que não se identificou. Para você, era uma prova fiel?

Aurea Regina Hoeppel - Deixa eu te explicar. Se não fosse por essa testemunha eu não teria nem descoberto que era saída de banco, não teria descoberto a Scenic... No dia seguinte ao fato, ela me telefonou e contou toda história que passei para vocês. Que estava chegando com a filha na Avenida Cavalhada e se deparou com a Scenic e com o cara armado e o cara apontou a arma para ele, aquela coisa toda, 10 metros, blábláblá. O cara (testemunha) é um comerciante e aí tentei, de todas maneiras, fazer com que ele desse depoimento. E ele, por telefone, negou. Disse que tem medo, que não vai se expor, que não acredita nessa segurança para testemunha. Resultado: fiquei sem saber o que fazer. Daí disse para ele que tinha umas fotos (de suspeitos) para mostrar e meu chefe de investigação conseguiu contato com ele. Os dois se encontraram e o chefe de investigação levou várias fotos. Ele apontou para a do Jaerson e aí disseram "delegada, é o Jaerson, a testemunha indicou". Disse não, nós precisamos fazer isso virar papel, eu preciso depoimento, não tenho nada.

Aí conversei com o juiz, não este que soltou, mas o que estava substituindo, conversei com o promotor, que também era outro e expus a situação para eles: tenho uma testemunha, minha ideia é ir no cartório. Eles disseram é "um álibi comum, se a pessoa tem consistência traz para gente, depois tu trabalha em cima de possível identificação". E foi o que eu fiz.

Consegui conversar ele (testemunha), por telefone, para ir no cartório, na frente de um tabelião, e fazer um ata notarial, que é um documento público, com fé pública, válido na área civil. Dentro do Código de Processo Penal é que este documento só tem valor probatório como indício. Ele (o comerciante) foi, levei várias fotos e ele foi taxativo, indicou sem sombra de dúvida que era o Jaerson. Tudo que ele já havia relatado para mim, relatou na frente do tabelião. Disse novamente que não queria ser identificado, mas que existe. Eu sei que ele existe, o tabelião sabe que ele existe, isso é para resguardar, porque a única coisa que nós temos é essa testemunha.

ZH - E as perícias de impressões digitais?

Aurea - A perícia datiloscópica já bateu na trave, né? A primeira identificação criminal era de um guardador que mexeu no carro e os fragmentos que têm são complicados, difíceis de ver se é de outra pessoa.

ZH - Mas teriam outros laudos para a senhora esperar e entregar o inquérito com eles? O despacho do juiz aponta também a questão de que faltaram laudos periciais...

Aurea - Também achei isso estranho, porque quando peço uma (prisão) preventiva, tenho 10 dias para entregar o inquérito. Então, na verdade, eu era obrigada. Pedi a preventiva para o juiz, terminei meu inquérito e solicitei todas as perícias possíveis e imagináveis. Pedi capacete, digitais de uma série de pessoas para ver se eram do Jaerson, a digital completa não configurou como dele, era do guardador, mas o resultado só vinha em 30 dias. Então, como o réu estava preso, era obrigada a entregar o inquérito na Justiça e foi o que eu fiz!

ZH - Agora, a defesa do Jaerson está usando imagens de vídeo para comprovar que ele estava trabalhando.

Aurea - Evidentemente que agora o juiz passou para mim este vídeo que veio da defesa. Só que, quero deixar bem claro, que as investigações nunca terminaram. Mesmo com inquérito na Justiça, eu estou atrás de prender os outros, principalmente o dono da Scenic. O dono da empresa onde Jaerson trabalha, que é uma diligência que estão pedindo, eu já ouvi!

ZH - O que o chefe de Jaerson disse para a senhora?

Aurea - Me causa estranheza o fato que o dia que o Jaerson foi preso, quando determinei que dois policiais fossem na empresa e pegassem as fitas, eles não nos deram. Inclusive delegando que o dono não estava. Os policiais pediram que mandassem os vídeos, já que é o álibi do funcionário da empresa. Estranhamente, o gerente não quis entregar as fitas aos policiais, mas entregou aos advogados de defesa.

ZH - Mas o que o chefe de Jaerson disse?

Aurea - Ele negou. Disse que era um bom funcionário e que, conforme a fita, ele (Jaerson) estava trabalhando, mas não entregou as fitas. Aí eu pergunto: tiveram 15 dias para entregar essas fitas para nós e não entregaram? O dia que ele (chefe do Jaerson) foi lá, já foi acompanhado do advogado do Jaerson. Me causa estranheza tudo isso, mas evidentemente que irá para perícia e ela que vai determinar se é possível fazer montagem.

ZH - Para a senhora, continua sendo o Jaerson quem atirou no publicitário?

Aurea - Com certeza! Vou trabalhar para que a testemunha converse com o promotor. Eu quero isso, até para parar com essa coisa de existe ou não existe. Sim, esta testemunha existe, está com medo, já disse que não vai enfrentar a quadrilha para fazer reconhecimento, mas quero que ela converse com o promotor. Vou tentar convencê-la nesta semana, esse é o meu trabalho. As evidências que foi ele que atirou são muito parecidas. Essa testemunha para nós é a chave de tudo, consegui uma prisão preventiva através disso. Infelizmente não deu, mas é como eu digo, a decisão do juiz é soberana e só tenho de acatar.

ENTENDA O CASO:

 
Lairson José Kunzler, 68 anos
Foto: Dulce Helfer, Agência RBS

O crime:

- Por volta das 12h de 24 de fevereiro, o publicitário Lairson José Kunzler, 68 anos, saca R$ 44,2 mil em uma agência do banco Itaú, no bairro Moinhos de Vento. O dinheiro é referente a uma parcela da venda de uma fazenda da família, no limite de Porto Alegre com Viamão.

- Um homem dentro do banco, observa Kunzler e avisa a um comparsa que está do lado de fora o banco. Kunzler sai com o Civic em direção ao bairro Cavalhada, onde mora, e é seguido por bandidos em um Scenic e um motocicleta.

- Na entrada do condomínio Jardim do Sol, o caroneiro da moto, armado e usando capacete, aborda o publicitário. A vítima acelera o carro, e o homem dispara. O bandido pega o malote com o dinheiro e foge. A perseguição e o crime são gravados por câmeras de segurança.

- Impressões digitais deixadas no Civic da vítima e outros indícios levam agentes da 6ª Delegacia da Polícia Civil a prender um suspeito, em 27 de fevereiro. Mas era o manobrista do estacionamento onde Kunzler deixou o carro. No mesmo dia, a polícia reconhece o erro, e o homem é solto.

O suspeito

- Em 13 de março, é preso Jaerson Martins de Oliveira, o Baro, 41 anos e levado para o Presídio Central de Porto Alegre. Condenado até 2.039, ele cumpre pena em regime semiaberto por dois roubos e uma assalto com morte, ocorrido em 2004. Uma pessoa disse a polícia ter reconhecido Jaerson, logo após o crime.  O envolvimento de Jaerson reascende discussão sobre a fragilidade dos albergues.

- Jaerson, que trabalha de dia e dorme na Fundação Patronato Lima Drummond, na Capital, nega autoria do crime e garante que estava no serviço na hora e no dia do crime. Em 25 de fevereiro, advogados do suspeito entram com pedido de revogação da prisão. Eles apresentam um CD com imagens nas quais Jaerson aparecia no trabalho entre 10h e 13h30min na data do crime, o que impossibilitaria sua participação no assalto.

A liberdade

- O CD é enviado para perícia. Na sexta-feira, a Justiça atende ao pedido dos advogados de Jaerson e a prisão preventiva é revogada. O Ministério Público solicita que o inquérito volte à polícia para novas investigações. Além da possibilidade de Jaerson não ser o matador, a polícia não apresentou provas contra ele.

Imagens mostram publicitário sendo assassinado


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