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Caso Bernardo

Na volta às aulas, colegas e amigos de Bernardo lamentam "crueldade" em morte do garoto

Direção da escola contratou psicóloga que trabalhou com famílias no caso da boate Kiss

22/04/2014 - 08h39min

Atualizada em: 22/04/2014 - 08h39min


Pai acompanha o filho no retorno às aulas na escola em Três Passos

Em pares, grupos ou sozinhos - como chegava quase sempre Bernardo Uglione Boldrini -, os alunos do Colégio Ipiranga, em Três Passos, voltaram às aulas nesta terça-feira, dia 22. As crianças que conviviam com ele - aluno do sexto ano - falam que a alegria do menino vai superar a tragédia que abalou os 24 mil habitantes de Três Passos e chocou o Brasil.

- Ele gostava muito de dar abraços. Uma coisa que eu sei que ele queria ter feito era tocar o sino da igreja (Bernardo era coroinha na Igreja da Matriz). Apesar de tudo que passava, era um menino muito alegre, essa é a minha lembrança - conta Angélica Rodrigues.

- Todo dia, a gente brincava no recreio. O Bernardo sempre abraçava todo mundo, gostava mesmo. Estou sentindo uma tristeza grande de saber que ele não está mais aqui, vou ficar quieto e estudar. Levarei comigo a alegria dele - diz o menino Lucas Gasparetto Moresco.

- É difícil, ele sentava conosco no recreio. Meu, ele era muito simpático, carismático, abraçava todo mundo. Não parece que é verdade, não parece possível a crueldade que fizeram com uma pessoa tão boa - lamenta Emanuela Cardozo.

Zero Hora pediu para entrar na sala onde Bernardo estudava, mas a direção da escola, pelo momento de grande comoção, achou melhor não liberar o acesso.

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Para dar suporte aos professores e também aos alunos, já que o trágico fim de Bernardo, nos detalhes, é comentado por toda a cidade de Três Passos, a direção do Colégio Ipiranga contratou a psicóloga Fabiane Ângelo, que trabalhou com as famílias das 242 vítimas da Boate Kiss, em Santa Maria. Ontem, ela reuniu os professores da escola para orientá-los a tocar no assunto e falar exaustivamente sobre a morte com os jovens do Ipiranga. A turma de Bernardo receberá uma atenção especial. Agora são 21 crianças. Ela terá a ajuda da psicóloga Denise Esch, funcionária da escola.

- É um momento de fortalecimento dos laços familiares e do equilíbrio. Temos de continuar em frente em busca dos sonhos e retomar a vida dentro do possível, para que o luto vá minimizando. Os alunos vão escrever cartas para si mesmos e colocar as palavras que ilustram os sentimentos deles para trabalharmos isso - explica Denise.

O desamor é trágico

Antes do início da aula, os alunos do Ipiranga foram levados ao pátio, onde foi lida uma mensagem em homenagem à memória do garoto. As crianças e adolescentes receberam fitas pretas como sinal de luto e indignação com o assassinato de Bernardo, cujas suspeitas recaem sobre o pai (Leandro Boldrini), a madrasta (Graciele Ugulini) e a assistente social Edelvania Wirganovicz.

"Bernardo nos deixou exemplos de carinho, amor, inclusão. O amor faz a diferença na vida, o desamor é trágico", disse a mensagem, que se referiu à principal queixa do garoto, que reclamava da falta de amor e atenção do pai.

- Nossa expectativa é fortalecer toda a comunidade escolar e a sociedade de Três Passos. Os professores estão preparados para colocar, esclarecer e dar suporte aos alunos. A vida continua. O Bernardo nos deixou uma grande lição ao enfrentar as dificuldades que hoje estamos sabendo com maior clareza com um rosto sorridente. Ele transpareceu isso, nós levamos também como exemplo para seguir, ter um olhar positivo - afirma o diretor do colégio, Nelson Weber.

Poucos minutos antes do recomeço das aulas, às 7h30min, a diarista Elaine Rauber cruzou pela frente da escola e emocionou-se. Muitas vezes ela encontrava Bernardo exatamente nesse horário, quando ia para o trabalho e via o menino subir a Rua Gaspar Silveira Martins com a mochila nas costas. Em um desses encontros, Bernardo confidenciou, no ano passado, que a madrasta tentou asfixiá-lo com um travesseiro:

- É muito estranho saber que ele não passa mais por aqui. Era uma alegria ver essa criança chegando para estudar, para ser alguém. Um pedaço da minha vida se foi com ele.

Relembre o caso

Bernardo Uglione Boldrini, 11 anos, desapareceu no dia 4 de abril, uma sexta-feira, em Três Passos, município do Noroeste. De acordo com o pai, o médico cirurgião Leandro Boldrini, 38 anos, ele teria ido à tarde para a cidade de Frederico Westphalen com a madrasta, Graciele Ugolini, 32 anos, para comprar uma TV.

De volta a Três Passos, o menino teria dito que passaria o final de semana na casa de um amigo. Como no domingo ele não retornou, o pai acionou a polícia. Boldrini chegou a contatar uma rádio local para anunciar o desaparecimento. Cartazes com fotos de Bernardo foram espalhados pela cidade, por Santa Maria e Passo Fundo.

Na noite de segunda-feira, dia 14, o corpo do menino foi encontrado no interior de Frederico Westphalen dentro de um saco plástico e enterrado às margens do Rio Mico, na localidade de Linha São Francisco, interior do município.

Segundo a Polícia Civil, Bernardo foi dopado antes de ser morto com uma injeção letal no dia 4. Seu corpo foi velado em Santa Maria e sepultado na mesma cidade. No dia 14, foram presos o médico Leandro Boldrini - que tem uma clínica particular em Três Passos e atua no hospital do município -, a madrasta e uma terceira pessoa, identificada como Edelvania Wirganovicz, 40 anos, que colaborou com a identificação do corpo. O casal aparentava uma vida dupla, segundo relatos de amigos e vizinhos.


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