Conflito em Gravataí
Rotina começa a ser retomada na Morada do Vale após boatos de guerra do tráfico
Rumores de um suposto confronto entre traficantes paralisou o bairro na terça-feira. Nesta quarta, o clima era mais tranquilo, mas o medo ainda assombrava moradores
Na manhã seguinte a um dia de terror provocado por boatos de uma possível guerra entre traficantes na Morada do Vale 1, em Gravataí, a rotina dos moradores do bairro começou a ser retomada ontem. Pelo menos até a manhã desta quinta. Boa parte das escolas fechadas no dia anterior retomaram as aulas, embora algumas ainda tenham ficado sem alunos. O comércio operou em horário integral. Em algumas ruas, porém, ainda se via pouca gente. A polícia não registrou incidente grave nos últimos dois dias, porém, o temor de que um confronto ainda ocorra na região é evidente.
Um medo, contudo, bem inferior ao que assolou a população na terça-feira, quando o dia foi marcado por ruas vazias, crianças indo para casa em pleno horário de aula e escolas fechadas. Professoras - algumas chorando - entregaram alunos aos pais. Comerciantes baixaram as portas à tarde.
Na terça, uma postagem no facebook dava conta de que rivais do tráfico se enfrentariam nas ruas, com tiroteio e mortes. O falso alarme se espalhou rapidamente nas redes sociais, com compartilhamentos e comentários e até fotos de uma chacina atribuída ao suposto conflito, alimentando o clima de pavor. Em apenas uma página no facebook, foram cerca de 3 mil interações. A origem da boataria já tem suspeitos.
- A postagem partiu de um rapaz de 18 anos, sem antecedentes. Ele está sendo monitorado. Logo em seguida, uma mulher espalhou fotos falsas. Não passa de meia dúzia de irresponsáveis. O resto é repercussão - diz o comandante do 17ª BPM, tenente-coronel Vanderlei Mayer Padilha.
As fotos dos corpos, segundo a polícia, não são recentes nem de casos em Gravataí.
Patrulhamento foi intensificado
Conforme o secretário de Segurança Pública, Flávio Lopes, a Guarda Municipal de Gravataí recebeu cerca de 200 telefonemas pedindo ajuda e informações sobre o ocorrido. Um efetivo de 20 homens foi deslocado para a região das Moradas do Vale 1, 2 e 3. Como os boatos não precisavam o local d o possível confronto, a polícia intensificou o patrulhamento em toda a região.
- Foram orientados a acalmar a população, repassando que era boato. Dissemos que não era para fechar comércio e que nada estava acontecendo, mas o pânico já estava instaurado. Hoje (ontem), mantivemos duas guarnições para que as pessoas retomassem a rotina - explica o secretário.
A Brigada recebeu cerca de 300 ligações pediu reforço a pelo menos três municípios. O comandante Vanderlei, porém, não confirma. Ele também não divulga o número de PMs envolvidos na operação e minimiza:
- As 300 ligações não representam o universo de 50 mil pessoas das Moradas.
A rotina escolar foi afetada. Segundo as secretarias Municipal e Estadual de Educação, são sete escolas na região. Em uma, mais de 1,3 mil alunos ficaram sem aulas.
- Mesmo que sejam boatos, não podemos arriscar. Estamos lidando com as vidas dos jovens - disse uma funcionária.
A previsão é de que, nesta quinta, nenhuma escola permaneça fechada.
Origem foi assassinato
O estopim para a série de boatos foi a morte de Maurício Panzenhagen Dorr,
24 anos, no domingo. Com passagens por tráfico de drogas e investigado por tráfico de armas, levou pelo menos 20 tiros, às 18h, na Avenida Anita Garibaldi, a principal da Morada do Vale 1. Em seguida, amigos dele espalharam que a morte não ficaria em vão.
- Sabemos que há tráfico na região, e a vítima vendia drogas. Estamos investigando - disse o chefe de investigação da 2ª DP, Carlos Augusto Silva.
Maurício foi morto quase em frente a uma escola que teve as portas fechadas e os alunos dispensados nos últimos dois dias. Entre moradores, a certeza é de que o tráfico impera.
- Dizem que o rapaz era ex-aluno da escola, morto por rivais, e que a gangue dele invadiria para pegar estudantes envolvidos. Aqui está tomado pelo tráfico. É terra sem lei - afirmou uma moradora.
A Brigada nega a existência de facções no local.
- Não há gangues em Gravataí nem confronto de grupos rivais - diz o tenente-coronel Vanderlei.
Entenda o caso
*14/9 - Tiago Roberto da Silva Barbosa, 28 anos, foi assassinado a tiros na frente do filho, de seis anos, no Bairro Rubem Berta, em Porto Alegre. Um parente dele, segundo a polícia, é aliado de Vini da Ladeira, traficante que domina a venda de drogas em Gravataí.
*21/9 - Maurício Panzenhagen Dorr, 24 anos, investigado por envolvimento no crime, foi assassinado com 20 tiros na Morada do Vale I. Maurício tinha antecedentes por tráfico de drogas e, segundo a polícia, era investigado também por tráfico de armas. Os suspeitos pelo seu assassinato, conforme a polícia, são matadores aliados de Vini da Ladeira.
*22/9 - Após o assassinato de Maurício, boatos davam como certa uma guerra entre amigos dele e comparsas de Vini da Ladeira. De moto, traficantes em pelo menos três motos passaram por comércios e avisaram que, na Morada do Vale I, no dia seguinte, ninguém deveria sair às ruas depois das 17h naquele dia, pois "a bala iria pegar".
*23/9 - Espalhada em redes sociais, a boataria tomou fortes proporções. Escolas dispensaram alunos e boa parte do comércio fechou as portas mais cedo. A Brigada Militar local pediu apoio aos colegas de Cachoeirinha e do Batalhão de Operações Especiais, que ficaram de prontidão. Com a presença maciça de PMs, nenhum tumulto foi verificado.
*24/9 - A rotina começou a voltar ao normal na região. Pais de alunos de uma escola em Águas Claras, nas redondezas, pediram à direção para que tome medidas em prol da segurança dos alunos.