Abuso sexual e estupro
Crianças são as vítimas preferenciais dos criminosos sexuais
Dos 53 casos registrados em Santa Maria neste ano, 48 foram contra crianças ou adolescentes
Por sua vulnerabilidade, as crianças são recorrentes de criminosos sexuais. E a psicóloga Liége Suptitz alerta que os pais reforcem o cuidado não apenas com estranhos, já que a estimativa é que 90% dos abusos sejam cometidos por familiares ou pessoas muito próximas da vítima.
_ A vulnerabilidade da criança lhe torna um alvo. Os familiares ou conhecidos têm um acesso fácil a vítima. No imaginário social, pessoas da família ou conhecidos não seriam capazes de cometer a violência sexual contra crianças e os agressores se utilizam dessas crenças como facilitadoras _ explica Jean Von Hohendorft, doutorando em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pela University of Alabama, autor do livro Violência Sexual Contra Menino.
Por não saber como agir _ e, por muitas vezes, ser ameaçada ou convencida pelo agressor de que aquela é uma situação aceitável _ o abuso sexual pode gerar uma cadeia de ocorrências traumáticas e clandestinas, que alimentam as chamadas síndromes de Segredo e de Adição.
Na síndrome de adição, o perpetrador tenta convencer a vítima de que seu ato, mesmo que social e eticamente condenável, é uma doença ou vício. Já a do segredo é alimentada pelo violador por meio de ameaças _ das físicas até perturbação psicológica, como afirmar que as revelações da vítima seriam responsáveis pela destruição da família.
Leia também:
Abuso sexual e estupro: crimes mais perto do que você imagina
Em entrevista, vítima que foi estuprada conta como superou o trauma e virou ativista
Já que elas não falam "com todas as letras" o que está acontecendo, é importante que familiares, vizinhos e professores prestem atenção aos sinais que as vítimas podem demonstrar.
_ A ansiedade de estar sempre vigilante consome toda a energia da criança e ela não consegue foca sua atenção em sala de aula, por exemplo. Caso se confirme a ocorrência, é preciso notificar os órgãos responsáveis e é preciso manter a calma, dizer para a criança que acredita nela e que a culpa pelo ocorrido não é dela _ acrescenta Von Hohendorff.
Dar crédito ao que conta a criança também é essencial.
_ No momento da revelação do abuso sexual, algumas crianças são desacreditadas, rotuladas de mentirosas. Crianças não mentem sobre abuso sexual. É imprescindível dar credibilidade ao discurso da vítima e tomar providências para protegê-la e apoiá-la _ acrescenta Liége
Segundo os especialistas, a família, em parceria com os serviços de uma rede de assistência em saúde mental, a criança pode resgatar e edificar possibilidades de elaboração da vivência traumática.
Conheça o perfil de agressores, como identificar se uma criança ou adolescente sofre em silêncio e quais as melhores formas de tratar sobre o assunto.
A fragilidade que o crime sexual imputa à vítimas - sejam elas adultas ou menores de idade - exige um atendimento especializado. Isso porque a frieza de procedimentos técnicos, como depoimentos e exames físicos, podem significar uma nova violência. Por isso, em unidades especializadas, como a Delegacia da Mulher e a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), a primeira atitude é confortar a vítima. Depois vem a busca por indícios, pistas, testemunhas e provas que incriminem o abusador ou estuprador.
- A vítima não pode sofrer uma vitimização secundária. Por isso, a primeira providência que tomamos é encaminhá-la para acompanhamento psicológico. Depois, um parecer do profissional é remetido e anexado ao inquérito - explica a titular da DPCA, Carla Dolores Castro de Almeida.
- A polícia tem de ter essa capacidade e tentar minimizar o problema para não revitimizar essa pessoa, tendo que relembrar os fatos - afirma o delegado regional de Polícia Civil, Sandro Meinerz.
Por sugestão da Promotoria da Infância e da Juventude, desde 23 de julho, o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm) organiza uma equipe especializada para o atendimento de vítimas de violência sexual. O plano é que os profissionais sejam capacitados para detectar até os casos não são declarados pelas vítimas.
- Temos que ser capazes de perceber não só por sintomas físicos, mas também por mudanças comportamentais - diz a Enfermeira Verginia Rossato, do Núcleo de Vigilância Epidemiológica do Husm.
A cada ano, em média, 30 pessoas buscam o Husm relatando casos de violência sexual. Com a implantação do serviço, elas serão acolhidas no pronto-socorro, atendidas e encaminhadas para fazer boletim de ocorrência policial e coleta de material biológico no Posto Médico Legal. A equipe será composta por ginecologista, pediatra, psicólogo, enfermeiro e assistente social.