Polícia



Equipado para o crime

Como o tráfico usava o "Caveirão da Morte" para tocar o terror em Gravataí

Veículo tinha base de um Civic, mas foi adaptado com chapas metálicas e espaço para escorrer sangue de vítimas

25/10/2015 - 17h43min

Atualizada em: 25/10/2015 - 17h43min



- Quando o Caveirão sai, é pra missão. Alguém vai "baixar".

A frase soava como mantra entre os integrantes da quadrilha que, a partir da Rua da Ladeira, no Bairro Morada do Vale II, em Gravataí, dominava o tráfico de drogas em boa parte da Região Metropolitana. O Caveirão da Morte, revelado nesta sexta-feira pela 1ª Delegacia Regional Metropolitana, era um Civic todo transformado para se tornar um veículo de guerra do crime.

Já não tinha o encosto traseiro, que deu lugar a uma chapa de aço com um visor ao estilo dos carros-fortes. Atrás dos bancos dianteiros, foram instaladas outras duas chapas. No porta-malas ficava o detalhe macabro: furos no fundo da estrutura metálica davam saída para pequenas canaletas.

- Por ali, escoava o sangue dos corpos - explicou o delegado Eduardo Hartz.

É que além de se configurar como veículo para matadores, o Caveirão tinha no banco traseiro uma espécie de câmara de tortura. A adaptação teria custado R$ 3 mil aos criminosos. Agora, os investigadores procuram o local onde ela foi feita. Não é descartada a existência de outros veículos com as mesmas características nas mãos de quadrilhas.

Arte: Alexandre Oliveira/DG

Trinta assassinatos

Um custo pequeno para uma quadrilha que, segundo estimativas da polícia, chegava a faturar mais de R$ 1 milhão por mês, mas de eficiência imediata para causar o terror aos inimigos de Vinícius Antônio Otto, o Vini da Ladeira, líder da quadrilha.

A partir de exames de DNA feitos pelo IGP a partir de marcas de sangue encontradas dentro do veículo, já foram comprovadas as mortes de Luís Antônio Oliveira Alves, o Godzila (à esquerda na foto abaixo), encontrado morto em abril, em Gravataí, e Paulo Diego da Silva Barbosa, o Boquinha (direita na foto abaixo), executado em maio, na Zona Norte de Porto Alegre.

Foto: Polícia Civil/Divulgação

A estimativa da polícia é de que o veículo, em pelo menos um ano e meio de uso, tenha sido utilizado para pelo menos 30 assassinatos.

O Caveirão havia sido apreendido no dia 14 de setembro, nos fundos de um terreno no Bairro São Jerônimo, em Gravataí. Vini da Ladeira já cumpre oito prisões preventivas no Presídio Central.

Foto: Fernando Gomes/Divulgação

Veículo seria "projeto" de assaltante

O idealizador do Caveirão da Morte seria o assaltante de bancos Carlos Ivan Fischer, o Teco, morto em junho do ano passado em confronto com agentes do Deic quando assaltaria um carro-forte em Candelária, no Vale do Rio Pardo.

Teria sido projetado para ser instrumento de assaltantes de bancos, mas se tornou uma encomenda de Vini da Ladeira. A polícia não confirma essa origem, que ainda é investigada.

Foto: Fernando Gomes/Agência RBS

Ao menos um modelo semelhante a essa transformação já havia sido descoberto na Região Metropolitana. Em maio deste ano, a Brigada Militar apreendeu em Canoas um Zafira com uma placa de aço encobrindo o vidro traseiro. O veículo era clonado.

Uso só com autorização da cúpula

O uso do Caveirão exigia uma certa cerimônia. Ele nunca era usado durante o dia e só tinha permissão para uso com ordem expressa da cúpula da quadrilha.

- Todas as mortes executadas por esse grupo passavam por uma espécie de tribunal da cúpula. Eles determinavam quem seria morto, a arma que seria usada e de que forma isso deveria ser executado - detalhou o delegado Marco Souza.

Segundo ele, quando a missão exigia o Caveirão, os seus ocupantes também eram determinados a dedo. Três deles, identificados como Anderson Silva Lisboa, o Orelha, Elivelton Araújo da Rosa, o Nenê, e Marco Antônio dos Santos Pires Gonçalves, o Gatorade, foram apontados como os principais matadores da quadrilha e já estão presos. Mas pelo menos um dos possíveis matadores também acabou vítima do grupo.


Foto: Fernando Gomes/Agência RBS

Vini da Ladeira está na cúpula dos Manos

Com a morte de Alexandre Goulart Madeira, o Xandi, no começo do ano, Vini da Ladeira ganhou lugar de destaque na cúpula da facção dos Manos. Fora do Vale do Sinos, seria considerado hoje um dos principais nomes da organização criminosa.

Foto: Polícia Civil/Divulgação

Quando foi preso, em abril deste ano depois de um sequestro, juntamente com os irmãos, provocou um rebuliço no Presídio Central. Por ordem do comando da facção, as melhores celas da galeria 2, no Pavilhão B, foram esvaziadas para que os Ladeiras pudessem ocupar.

Desde o começo da Operação Clivium, 110 comparsas já foram presos. Só não vão para as duas galerias do Pavilhão B dominadas pelos Manos aqueles que já não são bem vistos pela quadrilha de Gravataí.

Pistolas viravam carabinas

Segundo a polícia, o apartamento de luxo era alugado, assim como outros dois imóveis, também de alto padrão, na Zona Norte da Capital. Por mês, eles gastavam R$ 12 mil em aluguéis dos locais que eram considerados estratégicos. Ali, conseguiam esconder drogas e armas sem levantar grandes suspeitas.

Foto: Fernando Gomes/Agência RBS

Entre o armamento apreendido, foi encontrado o chamado Kit Roni Glock, que é um tipo de adaptador usado para transformar pistola em carabina. Traficantes de outras regiões do Brasil vem adotando o adaptador como forma de aumentar a precisão das pistolas 9mm e ter menos prejuízo que teriam no caso da apreensão de um fuzil, por exemplo.

Droga em apartamento de luxo

Três dias antes de encontrar o Caveirão, a polícia acredita ter dado o maior golpe na quadrilha que teria seguido recebendo ordens de seu líder, Vini da Ladeira, de dentro da cadeia.

Foto: Fernando Gomes/Agência RBS

Em um apartamento triplex, no Bairro Jardim Itu Sabará, foram apreendidos 25kg de cocaína escama de peixe, configurando a maior apreensão desta droga no ano pela Polícia Civil. No local, foi preso Marcos Vinícius Unikowski, que teria assumido a frente dos negócios com as prisões dos líderes.

A estimativa da polícia é de que a droga renderia mais de R$ 2 milhões aos criminosos. A droga era vendida em cápsulas coloridas, como se fosse remédio.


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