Polícia



Violência contra a mulher

Maria da Penha: "Tem que fazer a lei sair do papel"

Farmacêutica que lutou durante 20 anos pela punição do ex-marido, que tentou matá-la, concedeu entrevista ao Diário Gaúcho

26/11/2015 - 07h02min

Atualizada em: 26/11/2015 - 07h02min


Divulgação / Arquivo Pessoal
Maria da Penha mora em Fortaleza

Aos 38 anos, ela foi baleada nas costas e levou choque elétrico do companheiro. Sobreviveu e, mesmo presa a uma cadeira de rodas, não deixou de lutar para que a justiça fosse feita.

Ela é Maria da Penha Maia Fernandes e sua luta resultou na condenação do Brasil por omissão, negligência e tolerância em casos de violência doméstica.

Também levou à condenação de seu agressor a oito anos de prisão e à criação da lei que leva seu nome e hoje busca punir com maior rigor as agressões contra a mulher, quando ocorridas no ambiente doméstico.

Em 2015, a farmacêutica cearense completou 70 anos de idade. Em 2016, sua lei completará dez. Ontem, no Dia Internacional de Combate à Violência Contra Mulheres, o Diário Gaúcho entrevistou Maria da Penha que, entre outros fatos, analisou os 103 assassinatos de mulheres na Região Metropolitana, neste ano, dois quais 23 (22,33%) foram passionais, como foi o caso dela.

Diário Gaúcho - Nove anos após o início da vigência da Lei Maria da Penha, estamos tendo um ano com recorde no número de assassinatos na Região Metropolitana de Porto Alegre. Até agora, foram 103, sendo que em mais de um quinto o motivo foi passional. Como a senhora avalia essa situação?

Maria da Penha Maia Fernandes - Vejo com preocupação. O ideal é que esses números estivessem caindo. É natural que aumente o número de denúncias, pois há uma maior conscientização das mulheres no sentido de buscarem seus direitos, proteção e punição aos culpados. Mas, se a violência está aumentando é porque as exigências da lei não estão sendo cumpridas.

Diário - O que precisa ser feito?

Maria da Penha - Os gestores públicos e as instituições têm que aumentar a estrutura para atender à demanda. Exemplos disso são as Delegacias das Mulheres. Antes, a violência de gênero era registrada em delegacias comuns. Hoje, existem as delegacias para atendimento às mulheres. É preciso instalar onde ainda não tem e aumentar o número onde ainda são insuficientes. Muitas cidades pequenas ainda não têm essas delegacias e isso dificulta o atendimento  para as mulheres vítimas.

Diário - Já estamos indo para o décimo ano de vigência da Lei Maria da Penha. Como a senhora analisa a aplicação da lei e sua influência nos casos de violência contra a mulher?

Maria da Penha - Houve uma maior conscientização de parte das vítimas. Mas, insisto, os gestores e as instituições públicas têm que fazer com que a lei saia do papel. A lei tem que sair do papel. O Judiciário, o Ministério Público, as polícias, os núcleos de gênero precisam atuar e não apenas nas capitais das maiores cidades. Precisam chegar ao Interior e às cidades pequenas. Precisamos que as mulheres de todos os municípios saibam onde buscar ajuda. Precisamos também que a lei seja implementada na educação.

Diário - Depois de mais de 30 anos de uma luta iniciada logo após ter sofrido as agressões, a senhora acha que valeu a pena?

Maria da Penha - O Brasil foi obrigado a mudar. Foi uma luta muito árdua, muito dolorosa, às vezes, decepcionante, por decisões do Judiciário que mantinham o agressor em liberdade. Mas muitas mulheres foram salvas por conta da lei. Isso já demonstra que valeu a pena sim.

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