Segurança



Sem violência

Jovens de escola municipal de Joinville dizem não às drogas

"AN" mostra como é o trabalho desenvolvido pela Polícia Militar em toda a rede de ensino

13/02/2016 - 10h09min

Atualizada em: 13/02/2016 - 10h09min


Salmo Duarte / Agencia RBS
Alunos da Escola Emílio Paulo Roberto Hardt receberam orientações dos policiais por meio do Proerd

O que leva um jovem a entrar para o mundo do crime e das drogas? Recentemente, o assassinato brutal de um adolescente de 16 anos em Joinville acendeu a discussão. Para tentar buscar respostas para essa pergunta, "AN" ouviu especialistas, que podem ajudar a esclarecer o tema.


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Há dez anos, o sargento da Polícia Militar Albertino Manoel Grigório repete o mesmo trabalho pedagógico na Escola Municipal Emílio Paulo Roberto Hardt, na Vila Canela, no distrito de Pirabeiraba, em Joinville. Nem o tempo, nem o desafio da missão reduzem o entusiasmo do profissional.

Ele e o sargento José Luiz de Oliveira são os responsáveis pelo Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd), que a Polícia Militar realiza em toda a rede de ensino de Joinville para alunos de 9 a 11 anos do 5º ano.
Durante a visita à escola nesta semana, ex-alunos de 2015 receberam os policiais com alegria e um deles deu um abraço de despedida no policial Albertino.

No ano passado, os jovens completaram as dez lições da cartilha para dizer não às drogas e voltaram em 2016 com os ensinamentos fresquinhos na cabeça, determinados a seguirem o que aprenderam.

De acordo com Oliveira, nesta faixa etária, as crianças não costumam ter contato com drogas e a memorização é maior. Mas o policial alerta que só o trabalho da PM não é suficiente para garantir o futuro dos jovens. A participação da família também é fundamental. A prevenção às drogas e ao crime começa a partir do berço, alerta Oliveira. Segundo ele, não adianta começar a disciplinar o filho aos 13 ou 14 anos.

- Quando os pais colocam regras muito tarde, elas vão gerar conflito. Da mesma forma, se em casa o jovem não tem regra e na escola tem, isto também vai gerar conflito. Tem criança que ouve o primeiro "não" na escola - afirma.

O policial aconselha os pais a dedicarem algum momento do dia para conversarem com os filhos, acompanharem os estudos, colocar regras claras desde pequenos, cobrar as regras e punir com castigo a desobediência. Impor punições simples, como deixar uma semana sem o celular ou o computador, por exemplo.


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Outra orientação repetida por ele e outros especialistas ouvidos pela reportagem é a de supervisionar a rotina dos filhos. Oliveira diz que o assunto das drogas pode ser introduzido no diálogo com os filhos a partir dos nove anos. Os pais devem ser criativos, aproveitarem algum acontecimento, o noticiário para tocar no assunto.

No início, diz o policial, os jovens se esquivam, acham o papo careta. Por esta razão, os pais devem criar um vínculo de amizade com os filhos desde cedo para ganhar a confiança. Oliveira diz que a cobrança não é vista como algo ruim para o jovem, pois quando o pai ou a mãe cobram, estão demonstrando interesse por ele.

- A maioria dos jovens envolvidos com drogas reclama da ausência dos pais - ressalta.

Jovens que já estão usando drogras podem pedir ajuda a qualquer tempo ao Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil (Capsi) "Cuca Legal", que funciona na rua Alexandre Schlemm, no bairro Bucarein. Eles devem estar acompanhados de um responsável. Pais que descobriram que o filho está envolvido com drogas também podem pedir auxílio.

A coordenadora do Capsi, Kátia Pessin, diz que o plano de trabalho com o jovem que faz uso de drogas é personalizado e dura até três meses.

- Nosso foco é o tratamento, reduzir os danos e tabalhar as relações familiares. Muitas famílias são resistentes, só enxergam problema no adolescente - diz.

A maioria dos jovens atendidos não frequenta mais a escola, vive em conflito com a família e está em uma idade de "viver intensamente", fatores que influenciam no caminho para as drogas. Apesar de o índice de abandono do tratamento ser alto, Kátia diz que a volta sempre é possível.


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"Os pais devem estar atentos ao dia a dia do seu filho"

A morte brutal do joinvilense Israel Melo Júnior, de 16 anos, degolado e exibido por criminosos nas redes sociais neste mês, deu visibilidade para um problema que não é recente: a presença de jovens no crime organizado. Nenhum pai ou mãe conseguem conceber a ideia de um filho envolvido em algo tão longe da rotina e dos valores das famílias em geral. No imaginário, é como se existisse uma barreira entre os dois mundos, quando, na verdade, há uma ponte e muitos pais não percebem quando os filhos começam a trilhá-la.

A partir do momento em que o jovem responde "sim" ao convite para experimentá-las, talvez não consiga mais parar. É por isso que a Polícia Militar realiza um trabalho pedagógico com crianças de 9 a 11 anos em toda a rede de ensino para que elas aprendam a dizer "não" sem hesitar. O esforço se justifica. Não é só a curiosidade, a rebeldia ou o acaso que levam os jovens a experimentar drogas. Os criminosos sabem exatamente como envolvê-los, como explica o diretor da Penitenciária de Joinville, Richard Harrison Chagas dos Santos.




Os sinais

- Os pais têm uma função primordial na estrutura social e devem observar o que filho faz, o acesso às redes sociais, com quem ele anda. Se houver uma mudança de rotina na vida do adolescente, uma aspereza no conversar com pai e mãe, são indicativos de que algo está acontecendo de errado na vida do adolescente. Neste momento, é importante parar o que está fazendo porque existem vários momentos para solucionar isso com a autoridade de pai e mãe. Depois que isto passa dos limites, em que o pai acaba não tem autoridade, aí vem o Estado com uma prisão, com ação de Estado, para um sistema de aprisionamento do menor. Por isso, tem que estar atento ao dia a dia do seu filho, aonde vai, quem são os amigos, se vai a uma casa de um amigo, observe, ajude a observar a rotina do seu filho adolescente.


Sedução

- Vejo que a ausência de uma estrutura familiar é um dos momentos em que são captados pela criminalidade, a distância das escolas e dos centros de capacitação. Um dia inteiro sem fazer nada, quando o jovem tem entre seus 14, 15, 16 anos, se não está indo para a escola ou ou centro de qualificação, o ócio é o que atenta o indivíduo que vai captar esse menor. E aí sobram vários argumentos: vai falar que o crime é algo extraordinário, que viver nesse meio de vida é excepcional, não existe cadeia, ninguém é preso, e você é menor, então tem vários argumentos. Além disso, festas regadas a mulheres, drogas, mostrar uma arma, um poder, bom carro, dinheiro, tudo isso atrai o menor, que acaba sendo levado para as atividades criminosas, e aí surgem as necessidades: tenho um assalto para fazer em tal lugar, tem uma frente, a prática dos maiores, que guardados pela lei que acaba não levando ele a nada, deixa o menor levar toda a culpa, e essa coisa está acontecendo muito rápido.


Medidas alternativas

- Não é particularidade de Joinville ou SC, isso acontece em alguns Estados há muito mais tempo. Demorou para chegar a SC e está chegando e, enquanto sociedade, nós devemos iniciar as políticas públicas nas áreas de educação, formação e qualificação. Dar um dia de atividade para o adolescente, com responsabilidade do Estado dividido com a família, um resultado econômico e financeiro pelo trabalho que ele está desenvolvendo. Recentemente, visitei um amigo que é gestor de uma empresa grande em Joinville e ele disse que havia 50 vagas para menor aprendiz e ele só conseguiu preencher com 22 menores aquelas vagas. Não existe menor aprendiz? Sim, mas precisamos desenvolver as políticas, não só a responsabilidade para as empresas, mas também para aproximar as famílias e colocar os adolescentes em salas de aula, em cursos de qualificação porque o resultado disso estamos tendo aí agora. Menores envolvidos a cada dia que passa, apontando armas, assaltando, furtando por causa dessa ausência de políticas públicas.


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O que dizem os jovens:

"Este assunto não é brincadeira, tenho que confiar em mim mesma e dizer não. Se me oferecem droga, eu também vou aconselhar a pessoa."

Mayara Schatzmann, 11 anos, aluna do 6º ano.


"Se me oferecem droga, vou dizer não, muito obrigado, isto não me agrada. Eu nunca vou dizer sim. Droga só faz mal."

Sandro Cossa Júnior, 11 anos, aluno do 6º ano.


"Fazer bullying com quem resiste às drogas pode magoar a pessoa. Se alguém me oferecer, vou dizer não. E vou mudar de assunto, convidar para fazer outra coisa melhor, como jogar bola."

Vinícius Barbosa Viana, 11 anos, aluno do 6º ano.


"Nunca vou dizer sim, nunca vou aceitar drogas, não vou aceitar bala. Isto pode levar para um caminho ruim."

Patrick de Bastos, 11 anos, aluno do 6º ano.


CONFIRA
- Nesta segunda-feira, "AN" publica a segunda parte da reportagem. Nela, iremos revelar o estágio seguinte, no qual o usuário de drogas entra em uma bola de neve de práticas ilícitas como tráfico, furto e assaltos. Com isso, ele vai parar inevitavelmente no crime organizado. Um sistema complexo do qual muitos não conseguem mais sair.


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