Polícia



Operação House of Pain

170 policiais, 24 mandados, uso de helicóptero, prisões e revolta de moradores: a ofensiva em condomínio de Porto Alegre

Líder de quadrilha participou de mais de 30 assaltos a ônibus, segundo a Polícia Civil

26/06/2019 - 21h43min


Tiago Boff
Tiago Boff
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Ronaldo Bernardi / Agencia RBS
Ação no condomínio Princesa Isabel começou logo após as 6h e teve apoio da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core)

Com 40 viaturas, helicópteros e veículos especiais de apoio, 172 policiais invadiram o condomínio Princesa Isabel, no bairro Azenha, antes do amanhecer desta quarta-feira (26). O objetivo da chamada Operação House of Pain era prender integrantes de uma quadrilha que, segundo a Polícia Civil, realizou dezenas de assaltos a ônibus em Porto Alegre, desde o ano passado. No total, nove adultos foram detidos e responderão pelos crimes de tráfico, desacato à autoridade e posse de drogas. Um adolescente foi apreendido por xingar um policial enquanto ele realizava uma prisão.

O nome utilizado pela Polícia Civil para a ofensiva (casa da dor, na tradução do inglês) é uma alusão à forma como os criminosos interferem na vida dos demais moradores do condomínio.

— A grande maioria ali é morador de bem. E assaltantes se escondiam ali. A operação é para retomar o condomínio. Mostrar que o condomínio tem de estar em boa mãos, que lá não se admitem traficantes e autores de crimes — ressaltou a chefe da Polícia Civil, delegada Nadine Anflor.

Os policiais acessaram o condomínio pelos portões das avenidas Princesa Isabel e Bento Gonçalves, enquanto outros vigiavam a saída pela Avenida João Pessoa.

O trabalho policial chamou a atenção de quem passava pelo bairro Azenha entre 6h15min e 8h. Congestionamento e filas de curiosos nas calçadas eram vistos de longe, nas quadras que circundam os blocos residenciais. Nessas quase 2 horas, o helicóptero sobrevoou o complexo para, segundo o chefe da investigação, delegado Daniel Mendelski, evitar possível fuga de suspeitos sobre os muros. Titular da Delegacia de Repressão a roubos contra o Transporte Pública (DRTC) - criada em março de 2019 - Mendelski segue a linha da chefe da corporação ao explicar o uso de forte aparato durante a ofensiva:

— A comunidade honesta, que é maioria, nos recebe bem e sempre colabora nas operações. Nos recebem e agradecem. Usamos toda essa estrutura porque a fraqueza atrai hostilidade. A força afasta a hostilidade. Se demonstrar que está forte, o marginal não vai se opor a ti. Ele sempre procura uma presa fraca.

Do total de quatro mandados de prisão, um não foi realizado, e o alvo é considerado foragido. Dois mandados foram cumpridos nos apartamentos dos investigados, e o terceiro é contra o líder do grupo, recolhido no Presídio Central desde a última sexta-feira, quando a polícia fez as primeiras ações. Ao apresentar o ofício na cadeia, a custódia dele passará de temporária para preventiva, assim como os demais detidos.

Na ação, foram apreendidos cerca de 500 gramas de maconha, dezenas de celulares e objetos supostamente comprados com o dinheiro do crime. Os nomes dos presos não foram divulgados.


"O cabeça" se mudou para esse condomínio, diz delegado

De acordo com a investigação, o homem apontado como comandante da quadrilha atuava no bairro Medianeira, entre as avenidas Carlos Barbosa e Moab Caldas. Até janeiro, segundo a investigação, o homem teria cometido mais de 20 ataques aos coletivos que passam pela região, com abordagens violentas que resultaram em passageiros agredidos e ameaçados com armas de fogo.

— Prendemos três desse grupo em maio, e aí o "cabeça" se mudou para o Condomínio Princesa Isabel, onde aliciou outros para continuar os assaltos — explica Mendelski.

Nestes crimes, os assaltantes se passavam por passageiros, abordando os demais usuários no final da linha, roubando celulares, carteiras e demais itens pessoais. Após a prisão do trio, o criminoso, conforme o delegado, também passou a atuar na região do Lami e dos bairros Hípica, na Zona Sul. Nos últimos dois meses, em torno de 15 assaltos foram registrados no extremo-sul da Capital, atribuídos à quadrilha alvo da ação desta quarta.

Câmeras de vigilância foram usadas para identificar os criminosos.

— O líder usava uma touca reversível (de um lado de cor amarela, estilo tigrada, e do outro preta) e virava para atacar novamente. Mas nós tínhamos outras características dele para confrontar — explica Mendelski.

Além de uma corrente de ouro, os policiais compararam nas imagens uma tatuagem no pescoço, visível nas gravações.

Adolescente foi apreendido durante ação

De posse dos 24 mandados de busca e apreensão, a polícia fez apreensões e revirou 24 endereços dentro do condomínio. Utilizando uma caminhonete tracionada, da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), a principal porta de entrada e saída dos moradores foi destruída, arrastada para cima da calçada da Avenida Princesa Isabel. Entre gritos, os agentes enfrentaram resistência de quem acompanhava a ofensiva de casa: "Aqui tem trabalhador, não precisa invadir", gritou uma moradora na janela de um imóvel com vista para o pátio.

Tiago Boff / Agencia RBS
Adolescente apreendido por desacato resistiu e foi atingido por um jato de spray de pimenta

A mãe de um adolescente de 16 anos, que era carregado com força por dois policiais, bradava que o filho estava indo para a escola: "Ele não é bandido. Pra que levar pra delegacia?", questionava, em tom desesperado contra os oficiais, enquanto o garoto era arrastado para a calçada. Em meio ao protesto, o rapaz levou um tapa no rosto desferido pelo agente . De blusa estilo "canguru" azul e mochila nas costas, o garoto foi algemado e ficou de joelhos, ao lado de outro jovem.

— Eles desacataram os policiais. Nessas operações têm muita gente que caminha no meio e faz de conta que é trabalhador. Se ele não parou pra mostrar identidade e ainda xingou é desobediência. Não gostaríamos de ter de deter, mas é nosso dever. E é direito dele achar ruim e protestar — avaliou o delegado da DRTC.

Ao negar ficar de cabeça baixa, o adolescente recebeu um jato de spray de pimenta no rosto, disparado por um dos policiais civis. O agente gritou contra ele que "ninguém pode ser chamado de merda", enquanto a mãe limpava o rosto do filho, ajoelhado ao lado do portão arrombado.


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