Polícia



Durante treinamento

Major e capitão da Brigada Militar são réus por mortes de tartarugas a tiros em quartel de Canoas

Oficiais negam versão da promotoria e um deles disse que era alvo de perseguição de colega que os investigou

10/12/2019 - 16h13min


Vitor Rosa
Vitor Rosa
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Folha do Mate / Câmara Municipal de Canoas / Divulgação
Capitão Fábio Bilhar (esquerda) e major Rogério Araújo (direita) tornaram-se réus na Justiça Militar por morte de animais

Dois oficiais da Brigada Militar são réus por matarem animais a tiros no terreno do quartel da corporação, em Canoas, na Região Metropolitana. Segundo a denúncia do Ministério Público, o major Rogério Araújo de Souza e o capitão Fabio Cezar Bilhar mataram "diversas" tartarugas e um pássaro biguá usando uma espingarda calibre doze e uma pistola. Os dois negaram as acusações ao longo das investigações. 

Os fatos teriam ocorrido em 21 de setembro de 2017, em um trecho em que há um lago dentro do terreno do 15 º Batalhão de Polícia Militar. A área é usada para treinamento de tiros, e ocorria uma etapa do curso para formação de policiais naquele dia. À época, Araújo era o subcomandante da unidade. 

Inicialmente, os dois oficiais foram submetidos a Inquérito Policial Militar (IPM). O testemunho de aproximadamente 15 policiais era de que não tinham visto nada ou não se lembravam. No entanto, um sargento diz ter visto os disparos nos animais, e outros dois também deram depoimentos os incriminando. A apuração interna da BM também detalha que câmeras de segurança do quartel mostram os dois oficiais na região de treinamento, e o major disparando contra a água.

Ao receber a investigação, o então comandante regional, coronel Oto Eduardo Rosa Amorim, concordou parcialmente com os crimes atribuídos aos oficiais. Para ele, houve transgressão às técnicas militares por um tiro disparado por Araújo em direção ao lago, mas nenhum crime ambiental ou comum. Já sobre a postura do capitão Bilhar, Amorim declarou que não houve comprovação de quaisquer crimes.

O entendimento do Ministério Público foi diferente. Com base no mesmo inquérito, em abril de 2019, a promotoria denunciou os dois como autores das mortes dos animais agindo em "conjunção de esforços”. Quase dois anos depois, em maio de 2019, a Justiça Militar aceitou os termos da denúncia e os tornou réus. Eles respondem por caça de animais sem a devida permissão, com agravantes de serem militares e por motivo fútil.

Reprodução
Arquivo da investigação mostra biguá pendurado

À época da investigação da BM, o major negou os crimes e disse que atirou "para afastar as tartarugas de um cardume de peixes que estava no lago". Ele também afirmou que era perseguido pelo major responsável pela investigação militar. Já o capitão contou que viu o colega atirar em direção ao lago, mas não sabia o motivo. Negou ter presenciado a morte do biguá. 

Os dois PMs seguiram trabalhando normalmente. Araújo deixou o batalhão de Canoas e passou a cumprir expediente como ajudante de ordens do secretário da Segurança Pública e vice-governador Ranolfo Vieira Júnior. O cargo é de assessor pessoal. Ele participou de viagens ao lado de Ranolfo, inclusive para Chicago, nos Estados Unidos.

O vice-governador assegurou que ficou sabendo “há poucos dias” do ocorrido. Informou que está “apurando as informações”, sabendo do processo que existe na Justiça Militar e administrativo. Questionado se a existência do processo é condizente com a postura de um ajudante pessoal do responsável pela segurança do Estado, rebateu que não sabia dos fatos e que a seleção dos policiais que podem trabalhar no governo é feita pela Casa Militar:

— O oficial (Araújo), que está no quadro da Brigada Militar desde 1998, foi comandante de várias frações de Operações Especiais no Estado, além de ter sido instrutor na Academia de Polícia Militar, e ter cumprido missões de paz a serviço da Organização das Nações Unidas (ONU) em duas ocasiões.

O capitão Fábio Cezar Bilhar assumiu o comando de policiamento na companhia da BM no município de Taquari no último mês. Ele foi convidado pelo Comando Geral da Brigada Militar para ser o responsável pela tropa da cidade.

Promotoria diz que postura é inaceitável

Para a promotora responsável pela denúncia, Isabel Guarise Barros, não é aceitável a conduta dos policiais.

— São fatos graves. Principalmente naquela situação onde se tem um animal como um biguá, espécie importante, e também pelo fato de se tratar de oficiais, em local onde se fazia instrução de alunos. Uma conduta dessas é bem irregular — comentou a promotora.

Ainda assim, o MP não pediu o afastamento dos agentes das atividades, como ocorre quando os policiais são réus por crimes como tráfico de drogas ou agressão em abordagens.

O comandante-geral da Brigada Militar, coronel Rodrigo Mohr Piccon, defendeu a sequência das atividades dos policias enquanto não há uma resposta da Justiça para o caso. De acordo com ele, os dois oficiais possuem conduta ilibada.  

— O afastamento depende muito do fato que ele cometeu e tem a questão da decisão do comandante que analisa o fato e decide por afastar ou não. Não há essa obrigatoriedade de afastar todo policial que responde a algum tipo de inquérito — disse o coronel.  

Apesar disso, Mohr defende impunidade zero em todas as apurações na Brigada Militar. Questionado sobre a alegação de suposta perseguição por parte dos outros policiais que investigaram os oficiais, o comandante explicou:  

— Quando a gente trata do humano, sempre há várias possibilidades. Mas, nesse caso, foi aberta sindicância e, depois, inquérito, no caso por oficiais diferentes.

Pedido para anulação do processo 

Na segunda-feira (2), a defesa de Araújo entrou com pedido para anular o processo alegando que o caso não é de responsabilidade de julgamento da Justiça Militar. A avaliação da defesa é de que é um caso para a Justiça comum. O Ministério Público se manifestou de forma contrária. O Judiciário ainda não se manifestou.

O que dizem os citados

O capitão Fábio Bilhar defende que “não teve envolvimento algum com o fato”, que originalmente era apurado somente o caso envolvendo o major. Também alega que seu nome deve ser retirado do processo e que jamais teve qualquer erro em sua conduta enquanto policial.

— Houve um erro da denúncia do Ministério Público, uma vez que todas as sindicâncias e todos os inquéritos que deram ensejo a essa denúncia, em nenhum deles, há qualquer apontamento contra mim, nem de crime ou mesmo de transgressão disciplinar — defendeu.

Procurado por GaúchaZH, o major Rogério Araújo preferiu não comentar sobre o processo: 

— O caso se encontra na esfera da Justiça Militar Estadual e é intempestivo entrar em detalhes sobre o caso agora.


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